26- valley of the dolls.

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Importante ouvir a música!


POV: MARÍA.

Após todas as revelações de ontem, eu ainda estava completamente confusa, mas aquilo não parecia me perturbar totalmente. Eu conseguia analisar os fatos de forma distante, como se não estivesse no olho do furacão.

Retornei sozinha para minha casa após a longa conversa com Ramos, retornando cedo o suficiente para me trancar no quarto sozinha e ignorar o resto do mundo. Deitada na cama, eu fantasiava sobre jogos de poder e negociações, sobre minha própria inocência parva naquela época. Incapaz de perceber algo maior acontecendo, a engrenagem maior rodando ao meu redor, e eu minúscula num sistema gigante.

Dormi desta forma, saindo de lá apenas para jantar. Eu não lembrava, ou ao menos não sabia, que tínhamos um compromisso no dia seguinte, e um dos piores do mundo: atravessar a rodovia espremidos no carro de Carmen até Sevilha para visitar membros da família de quem não se aproveita nem mesmo o afeto.

Ao chegarmos no pequeno sobrado de titia, a recepção é calorosa em todos os sentidos: no cheiro de comida no fogo que invade nos atinge como um raio ao cruzar a porta da frente, seja no grito estridente de minha tia ao ver Carmen após tanto tempo. Era engraçado como ela ignorava os longos anos que Carmen passara sem lhe dar nem um telefonema, era quase como se ela fosse sua sobrinha de ouro, e eu, um mero adereço.

Ela sempre quis ser mãe, mas nunca teve a chance, nem mesmo o marido conseguiu manter por mais de dois anos. Envelheceria como uma mártir da sensualidade que viveu demais e não criou raízes, vivendo como um oasis na mente dos seus amantes que quase se mataram por ela, mas que hoje em dia, já não se importam tanto assim

— Carmen!! — grita com todo o coração, avançando contra minha irmã com os braços abertos e agarrando-a pelos ombros com toda a força — Oh meu deus, você está linda, linda como sempre! Uma mulher completa e perfeita, já não é mais a minha carmencita! — ela se afasta o suficiente para dar uma olhada de cima à baixo em Carmen, massageando seus ombros com carinho. As longas unhas vermelhas afundadas na jaqueta de couro de Carmen — Tão bonita, belíssima! —

Ela bate o calcanhar com o salto alto no chão e então lança um olhar para nós, os demais. Vejo imediatamente o relance brilhoso em suas retinas quando me percebe ali, encolhida e sem jeito como sempre estive: cabelo preso, roupas largas, e o olhar esbugalhado de quem foi pego matando o gato à pauladas. Fico automaticamente engessada e sem reação.

— Oh, minha pequena Marí — diz titia com a voz aguda de doçura — Venha cá meu raio de luz! —

Estende seus braços roliços na altura dos meus ombros, e eu, agora consideravelmente mais alta que titia, me encolho para um abraço apertado e cheio de uma ternura escandalosa. Ela me aperta contra seu peito e alisa minhas costas freneticamente. Fico parada, esperando que aquilo acabe.

— Você cresceu tanto menina, por dios! — repete pela terceira vez.

Já a tia Lucía, não tinha mudado em nada, perdeu algum peso e criou rugas talvez, mas seu rosto continua o mesmo. Seu vestido preto ainda era decotado como todos os outros, e uma linda rosa vermelha enfeitava seu cabelo escuro. Ela finalmente me liberta do afago, para então apertar minhas bochechas com toda a força dos polegares.

— Que linda mulher você se tornou, mas te falta uma corzinha nessa boca e nessas bochechas, menina!

— É bom ver você titia — digo fazendo força nas bochechas para conter a dor do apertão.

Camas, Sevilla - a Sergio Ramos story.Onde histórias criam vida. Descubra agora