Capítulo 14

99 63 36
                                    

7 de Fevereiro de 2024


Jansen me chamou para conversarmos na varanda. Já eram dez horas e vinte minutos, quase o horário que eu e Tony tínhamos marcado.

     – Estou muito feliz por você – Ele arrumou meu sobretudo e deu uma ajustada na echarpe que Carlos havia me dado, detalhista.

     – É só uma Missa, Jan – Respondi. – Não faço a mínima ideia do que fazer lá.

     O holandês cruzou os braços.

     – Só? Não, não... isso é um chamado.

     – Para onde eles estão me chamando?

     Ele revirou os olhos.

     – Deus tem um plano para você. Isso está muito na cara.

     – Er...

     – Só não vê quem não quer – Jan sorriu. – Vai lá, se comporte, seja aberto, preste atenção.

     Fiz um joínha com a mão direita, assentindo.

     – Bem, eu nunca teria conhecido Deus se não fosse pelo amigo doidinho do Millie. Eu estava surtado depois do acidente que ele sofreu em Nürburgring; achava que tinha culpa naquilo. Eu consegui ganhar a próxima corrida na Áustria, uma façanha que até hoje não consigo entender como fiz, mas... logo antes do primeiro treino-livre em Zandvoort, tive uma crise daquilo que vocês jovens chamam de ansiedade. Não conseguia parar de chorar, sentia falta de ar, taquicardia e ah... no geral, entrei em colapso.

     Meu semblante animado começou a se tornar mais sombrio. Me sentia mal pelas coisas que Hendricksen havia passado. A pressão, o desprezo que o chefe de equipe sentia por ele, as cobranças, seu esforço sendo subestimado, as ameaças de demissão, os desafetos não justificados... não entendia o porquê uma pessoa tão boa poderia merecer aquilo.

     – Micael foi uma das únicas pessoas que me procurou naquele dia. Millie seria uma delas, mas ele estava no hospital quase morto por causa das queimaduras nos pulmões. Já que Mica havia prometido que continuaria acompanhando a Ferrari nas corridas, ele estava lá por mim e por todo mundo que precisasse.

     Umedeci os lábios, taciturno.

     – Enquanto nós conversávamos, teve uma hora em que soltei que gostaria de um lugar para esquecer de tudo isso, que nada me lembrasse da Fórmula 1. Ele ficou uns três minutos pensando e disse que um dos únicos lugares em que ele sentia paz era na igreja... e já que não protestei, ele me arrastou para lá. Logo no começo da Missa, vi uma mulher ajuntando as criancinhas do coral... como ela era maravilhosa.

     – Linda – Sorri.

     – Era a Linda, sim – Ele riu. – Com aquele cabelo curto castanho e olhos tão bonitos quanto a maresia do mar do norte... ou sei lá. Nem nunca fui em uma praia naquela direção do globo.

     Eu dei uma gargalhada de leve.

     – Sou ex-piloto, não o melhor dos poetas – Deu de ombros. – Tenho uns versos largados aqui e ali, mas já faz muito tempo.

𝐆𝐋𝐎𝐑𝐈𝐀 𝐄𝐌 𝐂𝐇𝐀𝐌𝐀𝐒 | Fórmula 1 [EM HIATO]Onde histórias criam vida. Descubra agora