— Eu atrapalhei alguma coisa? O clima ficou pesado.
— O clima já estava pesado. E obrigado por ter aparecido.
— Não por isso. É que vim agradecer a você por ter ensinado onde fica a secretaria. E acho que minha euforia deixou-me cego.
— Não fique assim, qual o seu nome mesmo?
— Oi? Como é? Eu acabo de salvar sua vida e você me tira uma dessas?
— Você salvou minha vida? Tem certeza disso? — Eleonor sente seu coração desacelerando paulatinamente. A presença de Rafael lhe deixa em paz.
O rapaz parece ser sangue bom.
— Aonde você vai? — Pergunta Eleonor vendo Rafael se afastando.
O rapaz pede um momento com sua mão esquerda levantada e com sua mão direita, ele conta de um até cinco, para depois voltar onde Eleonor está sentada dizendo:
— Boa noite. Meu nome é Rafael Torres e desejo te agradecer por ter gentilmente me doado um pouquinho do seu tempo e ensinado onde fica a secretaria.
Eleonor, abre um sorriso.
— Sem sua ajuda, não teria conseguido me matricular. Obrigado, Eleonor Medeiros.
— Como sabe meu nome completo?
Rafael, mostra a resposta olhando para a bata branca dobrada em cima da mesa e que tem o nome "Eleonor Medeiros" bordado na frente do bolso.
— Entendi...
— Ufa não é mesmo? — Rafael gargalha mais alto e escuta novos "shhhh". — Por que essa galera não pediu silêncio para o bonitão que estava aqui antes?
— Medo. Todos temem a Família Nabuco. — Eleonor responde se levantando para ir embora. Ela pega a bata, a bolsa e guarda o livro protegendo seu peito igual um escudo.
— Qual é a do velhinho ai?
— Ainda não sei. Comecei a ler hoje.
Os dois seguem caminhando juntos. Lado a lado. Por um instante seguido, pelos próximos duzentos metros, Eleonor e Rafael seguem em silêncio.
— Eu moro na república, não me recordo se disse isso e também não me interprete mal, mas, se quiser ficar um pouco lá, será um prazer.
Eleonor, de fato não percebe maldade no gesto de Rafael.
— Muito obrigada, mas daqui a pouco meu pai vem me buscar.
— O que ele faz?
— Meu pai é médico.
— Uau! Uma família de médicos!
— E sua família? Seus pais fazem o que?
— Raiva.
Eleonor gargalha alto.
— Ainda bem que você gargalhou longe daquele lugar, senão, agora estaria levando uma saraivada de "Shhhhs".
— Verdade, Rafael. A mais pura verdade. Embora ali seja realmente um lugar de silêncio.
— Eu sei. Mas que são chatos, isso são.
— Pega meu telefone. — Dispara Eleonor.
— Eu tenho um orelhão na frente da república.
Novos sorrisos.
— Vai, passa o número. — Rafael tira do bolso seu celular e salva o telefone de Eleonor. — Te passando agora uma mensagem de boa noite... logicamente com meu nome pra que não esqueça.
— Não vou... irei ficando por aqui.
— Já chegamos na parada? Fico conversando com você até seu pai chegar.
— Não precisa, não é perigoso.
— Se você está dizendo... tem mesmo certeza?
— Lógico!
— Então, até amanhã!
Rafael abraça Eleonor, livro, bolsa de uma só vez.
A jovem estudante de medicina observa o rapaz seguindo na direção da república quando percebe um carro parando ao seu lado.
Victor fica encarando Eleonor até que uma buzina interrompe o rapaz. Era Hermes, pai de Eleonor, buzinando para o carro seguir em frente e ele poder abrir a porta pra que sua filha possa entrar no Corolla preto.
Victor, aciona sem pressa o comando do vidro eletrônico, da porta do passageiro, e sai dirigindo suavemente.
A tensão volta sobre os ombros de Eleonor.
Dentro do carro, seu pai pergunta:
— Conhece quem está naquele carro? — Olhando na direção da BMW azul.
— Eu acho que era o Victor Nabuco.
— Ele falou como você?
— Não! Eu acho que nem me viu ali. — Eleonor prefere mentir.
— Não queira papo com essa gente. Eu lembro o que o avô dele fez com o seu avô... — Hermes para de falar.
Pai e filha seguem em silêncio, até que Hermes liga o som do carro para escutar a Rádio Jornal do Commercio de telecomunicações de Pernambuco.
"Professor Fred, dono da escola Educandário Infantil, foi encontrado morto hoje pela manhã, em sua casa, pela funcionária doméstica Lucicleide Silva, quando a mesma chegava para trabalhar. Segundo informações preliminares, faltam dois órgãos do corpo do pobre homem, e no lugar do coração havia um HD dentro de um saco plástico. A funcionária doméstica disse pra o nosso repórter, Luiz Ventura, que nunca havia visto tamanha desgraça feita numa pessoa. Para maiores infelizmente, traremos todas as informações desse caso hoje, às 19h, na TV Jornal."
Eleonor, sente seu sangue escorrer pelas suas pernas e sua alma sair querer sair do corpo quando pega o livro para conferir se o nome do dono da escola era o mesmo que o do livro.
Para sua surpresa, ao abrir o livro, o capítulo 1 já não estava lá mais escrito... agora, o livro começava com o capítulo 2.
Eleonor deixa o livro cair do seu colo.
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SENHOR DA NOITE - Lançamento dia 04 de Abril de 2024
TerrorSENHOR DA NOITE "Yvi Sorrento nasceu numa data qualquer em um mês com nenhuma celebração, no calendário Espúrio." Foram essas frases que Eleonor de Medeiros, estudante de medicina da Universidade Federal de Pernambuco, leu na...