Eleonor, pega o livro velho e acaricia sua capa. Algo a convida para abrir, haja vista seu coração bate loucamente acelerado... como quem está prestes a ler a carta do seu amor. E quem sabe não seria isso mesmo?
Colocando o livro pesado junto ao coração, Eleonor sai do segundo andar da biblioteca de medicina, subindo para o terceiro piso, que tem um espaço maior para leitura e que também fica virada para uma grande área verde.
Eleonor, escolhe a mesa mais afastada, que lhe dá a percepção de todos os ângulos e de quem chega ou quem sai daquele andar. Ela sempre faz essa escolha, mais por sentir-se bem ali, do que por preocupação ou qualquer outro sentimento de preservação.
Porém, vale a observação que a mesa mais afastada se torna também a mais necessitada de luz ambiente, porque com a chegada do por-do-sol é o primeiro lugar a ficar mais escuro.
Já sabendo disso, Eleonor tira da sua bolsa um leitor de livro, fixando-o nas últimas páginas. Como o livro é gigante, as páginas são feitas do que parece ser um papiro antigo e o leitor de livro só consegue abraçar a capa e mais duas páginas.
Logicamente isso não impede Eleonor de desejar começar a ler, haja vista ela arruma a bolsa para ser um apoio confortável para o livro, tirando o peso dos seus braços.
O cheiro do livro é também diferente. Agora, com ele mais perto dela, Eleonor sente um agradável odor cítrico amadeirado, deixando-a confortavelmente tranquila para ler.
Porém, Eleonor observa uma coisa estranha. Ela percebe que as páginas em si exalam um leve odor de animal campestre, e não o aroma cítrico amadeirado. As páginas são velhas, porém, o papel é denso e só escrito na parte da frente, digo, não tem letras na frente e no verso.
O risco feito pela linda caligrafia tem força. Não foi qualquer um quem escreveu ali, naquelas páginas. Eleonor sente a marcação da força da caligrafia no verso da página, fazendo uma leve ranhura... lembrando a escrita tática utilizada para pessoas cegas ou com pouca visão, chamada Braille.
Mas, tem uma coisa que a deixou intrigada desde que pegou o livro para ler... o idioma usado pelo autor é o Português brasileiro.
Eleonor Medeiros, minutos atrás, já havia procurado qual era a edição ou qual a primeira datação do livro, porém, não achados nada... Só havia a capa, a primeira introdução narrada por uma terceira pessoa e depois a história que ela lerá, e nada a mais.
Eleonor lembra-se do fone de ouvido guardado dentro da sua bolsa, mexe rapidamente dentro dela para começar a leitura do livro. Fazia muito tempo que Eleonor não se empolgava com algo.
Antes de começar a leitura, Eleonor vê um rapaz vestindo uma camisa branca lisa com uma calça jeans desbotada, que tem em sua mão um papel da universidade. Parece um calouro perdido.
A jovem aluna de medicina do terceiro ano, escuta alguns "shhh" — Silêncio — para o rapaz de cor parda, cabelos crespos, que estão arrumados e presos para trás.
Colocando as mãos para frente, Eleonor pensa que fazendo isso conseguirá ficar invisível para o rapaz, que vendo a movimentação da moça, vem na direção dela.
— Boa tarde! Me chamo Rafael Torres.
— Boa tarde, sou Eleonor.
— As pessoas aqui são estranhas. — O sotaque do rapaz era diferente. Na verdade, não havia um sotaque. E ela acha engraçado ele dizer aquilo, porque é exatamente isso que ela pensa dele: estranho. — Estou de transferência da Universidade de Medicina de São Paulo e estou literalmente perdido. Aonde fica a Secretaria da Universidade?
— Você chegou quando? — Eleonor pergunta desconfiada.
— Cheguei a pouco tempo... Guardei minhas coisas na republica e vim direto pra cá.
— Rafael, quando você sair da biblioteca, à sua esquerda verá uma casa azul com portas de vidro... lembra um consultório médico...
— Então é lá! — Fala Rafael interrompendo Eleonor.
— Não! É passando pelo lado dela. A estrutura lembra um "L", sendo a secretaria a haste de cima da letra. Vixe, como compliquei. Meu Deus.
— Que nada! Foi sussa! Tranquilidade total. Já sei para onde vou... — Novos "shhhs" são ouvidos. — Porra, hoje tô incomodando geral.
Eleonor sorrir.
— Pelo menos valeu a pena.
— O que foi que valeu a pena? — Eleonor sabe o que Rafael vai dizer. Mas, mesmo assim fez a pergunta.
— O fato de ter sorrido do meu desespero está incomodando todo mundo. Foi um prazer te conhecer Eleonor e muito obrigado pelas informações.
Mais pedidos de silêncio.
— Já tô indo cambada.
Eleonor observa o rapaz de quase um metro de oitenta indo embora. Ela gostou do que viu, mas, algo puxou novamente sua atenção para dentro do livro... E Eleonor começou a devorá-lo.
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SENHOR DA NOITE - Lançamento dia 04 de Abril de 2024 - Em Andamento
TerrorSENHOR DA NOITE "Yvi Sorrento nasceu numa data qualquer em um mês com nenhuma celebração, no calendário Espúrio." Foram essas frases que Eleonor de Medeiros, estudante de medicina da Universidade Federal de Pernambuco, leu na...