O fato do vampiro ter me deixado vivo naquela noite, não quer dizer que minha vida tenha sido fácil ou que tenha sido uma benção.
Eu comi literalmente o pão que o diabo amassou até o dia que fui trabalhar na casa de um fidalgo inglês, que mais tarde descobri que não era inglês.
Mas, vamos por parte, parafraseando Jack... O Estripador.
Naquele dia, quando os policiais chegaram em casa e viram todo aquele sangue humano espalhado por toda parede, piso, cama e no meu rosto, eles estremeceram.
A minha cara parecia uma imensa bola 3 de uma sinuca de qualquer botequim.
Os olhos do meu pai revirado pelo terror, mostrava a pala branca... era como se as cores das íris tivessem sido sugadas.
No tórax da minha mãe tinha um buraco do tamanho da circunferência de uma bola de boliche ou um coco verde.
As íris da minha mãe estavam intactas. Na verdade, parecia que ela estava viva, de boca aberta, parada num loop temporal gritando na minha direção, um uníssono "NÃO".
A polícia ficou perdida naquele ambiente de morte explícita e dilacerante. Eles deram todo o crédito das mortes dos meus pais para Jack, O Estripador.
Era mais fácil justificar que um assassino corrido da Inglaterra começou a matar na França, do que qualquer outra teoria... até porque eu ainda não tinha 10 anos de idade, logo a culpa não iria cair nas minhas costas.
E sei que deixei um dos seis policiais perplexos com minha resposta, quando me perguntaram quem teria sido o autor daqueles crimes tão bárbaros... respondi que infelizmente não havia sido eu, mas um vampiro.
Seis deles gargalharam.
Por mais que esbravejasse dizendo que foi um "vampire", ninguém acreditou.
O legista, que era uma profissão sem reconhecimento, avisou que a degola feita no pescoço do meu pai fora feita por um animal gigante.
Ele afirmou isso na minha frente.
Não fique chocada por terem tratado isso na minha frente, uma criança ainda muito pequena respondendo perguntas sobre seus pais assassinados, com os corpos deles diante desse menino.
Acredite quando digo que o conceito de infância ainda não havia sido criado.
Um dos policiais presente, frequentava a casa que trabalhava... éramos lamentavelmente conhecidos e foi único que não gargalhou.
Sei que a polícia nao estava nem aí para morte dos meus pais e fui largado sozinho na minha casa para sobreviver.
Depois que foram embora, Dormi como uma criança que era... sem medos que tirassem meu sono. Naquela noite me sentir seguro. Espero não ter te chocado com essa afirmativa, mas, é a mais pura verdade.
Somente aquela escuridão do olhar daquela criatura me fazia sentir vivo.
Aqueles olhos pretos, com uma escuridão infinita, sorrindo para mim, embalaram meu sono.
Deixo aqui esse registro, porque ninguém nunca me olhou, nos momentos finais de suas vidas, com o terror que meu pai olhou para aquele vampiro. Eu sei que causo terror e várias vezes o pavor que provoquei tirou a vida das minhas vítimas antes mesmo de crava-lhes os dentes.
Mas, provocar nas pessoas aquele olhar de terror que meu pai fez, é ainda hoje um modelo a ser alçando por mim.
Voltando para história, fui morar com a irmã de meu pai. A pobre mulher trabalhava diariamente como garçonete para sustentar 8 filhos, deixados pelo marido, que foi morto por engano pela polícia.
O marido da minha tia era um homem forte, musculoso, preto, que trabalhava como dentista e foi confundido com um ladrão de bolsas que mais tarde foi preso.
O ladrão preso era um homem branco, com 1,60 de altura, que se entregou à polícia nem sei o porquê.
Minha tia se chamava Adelaide Sorrento. Voltou para o sobrenome de solteira depois da viuvez.
Ela era ruiva e tinha os cabelos encaracolados e vermelhos iguais ao fogo.
Tia Adelaide fugia do padrão de beleza da época... era magra.
Nos dias atuais, Tia Adelaide com certeza seria uma modelo das mais bem pagas.
Acredite, beleza é um conceito criado para oprimir as mulheres.
Tia Adelaide colocou-me para estudar, e foi na escola que meu novo inferno particular começou e que atendia pelos nomes. Aaron, Valentin e Logan.
Eram três garotos de 17 anos que aterrorizavam todos que eram menores que eles. E comigo não foi diferente. Todo dia eu apanhava e batia. Avisando que não era nessa ordem. Primeiro batia, depois apanhava.
Minha tia parou de perguntar depois da terceira vez que respondi que minha cara arrebentada foi causada por quedas na rua.
E devo confessar o que foi um alivio não ter mais que justificar meus olhos roxos ou meus braços quebrados.
As vezes passei semanas sem voltar para casa da minha tia, ficava perambulando pela rua, sem destino e comendo do lixo. Essas ausências foram sentidas também na escola. E quando minha tia teve lá, descobriu que não estava frequentado a sala de aula.
Tia Adelaide, só sossegou quando me viu passando por ela, no outro lado da rua. Tempos depois, minha tia conversou que ficou paralisada, sem saber o que fazer, haja vista, ela tinha 8 filhos para criar sozinha. E desses oito, 4 tinha menos de 12 anos.
E nenhum deles parou numa Casa dos Desejos.
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SENHOR DA NOITE - Lançamento dia 04 de Abril de 2024
TerrorSENHOR DA NOITE "Yvi Sorrento nasceu numa data qualquer em um mês com nenhuma celebração, no calendário Espúrio." Foram essas frases que Eleonor de Medeiros, estudante de medicina da Universidade Federal de Pernambuco, leu na...