Um Ano Depois...
Percorri o corredor, o som das minhas botas era o único que se ouvia no silêncio da manhã. Depois desci as escadas largas, que terminavam num espaço grande, elegante, que ficava em frente da porta principal com imensa luz que entrava das enormes janelas, e várias plantas decorando o espaço, e segui na direção da sala onde a familia real tomava o café da manhã.
Uma sala grande, com janelas, que iam do chão ao tecto, espalhadas a intervalos regulares, preenchendo uma das paredes. O chão marmóreo, imaculadamente limpo e brilhante, as paredes de tons claros, bem como todos os móveis que a preenchiam, e com vários quadros perfeitamente pintados que adornavam as paredes.
Dois guardas do lado de fora das portas, abriram as mesmas para mim, soltando um "bom dia, menina Collins", antes de eu passar por elas e encarar os três rostos que me olharam ao mesmo tempo.
O Rei. A Rainha. E o príncipe Jace.
Parei no topo da mesa, encarando o Rei e ignorando o filho.
- Nyra. - O Rei me sorriu e indicou a cadeira vazia. - Por favor, tome o café da manhã connosco.
Resisti á vontade de franzir o cenho e sentei na cadeira livre, achando tudo aquilo demasiado estranho. Não o facto de tomar o café da manhã com eles, isso já acontecera antes, mas sim o facto de estarem preparando uma nova edição das provas... E eu nunca era convidada a sentar com a familia real nessa altura, por receio de o povo ver isso como um sinal de proteção a um dos concorrentes.
Lancei um olhar rápido ao príncipe, esperando que ele deixasse seu rosto revelar algo, mas ele continuava o mesmo idiota de sempre, e nessa manhã dava total atenção á sua comida.
- Como se sente hoje, Collins?
Olhei o Rei, que me sorria amigavelmente, e assenti, tentando sorrir.
- Muito bem, sua majestade.
Ele riu. Um som alto e quente, um riso rouco. O mesmo riso do filho mais novo.
- Ora, Nyra, cinco anos vivendo nesse palácio e ainda não perdeu essa mania de me tratar por majestade?
Sorri, querendo fazer o meu melhor sorriso timido. - Nunca o faria, senhor.
A Rainha me sorriu e depois regressou ao seu café.
Olhei, pelo canto do olho, para Jace, percebendo ele sorrindo enquanto cortava um pedaço de fruta.
Queria apagar aquele sorriso torto do seu rosto.
- Bom mas vamos ao que importa. - O Rei chamou minha atenção novamente. - Esse ano será a 10° Edição das Provas de Sangue e, como tal, queremos algo especial. - O Rei falava diretamente para mim, pelo que achei que os restantes já saberiam do que se tratava. - Ora, já temos algo especial. - Me indicou. - Você. A primeira vencedora por cinco anos consecutivos. Agora as novidades. - Ele juntou as mãos em cima da mesa. - Esse ano haverá armas, á semelhança dos anos anteriores, mas os Mutes serão autorizados a usarem as suas habilidades.
Franzi o cenho, relembrando a última vez que usara elas em provas. Um escudo contra um rapaz que controlava o elemento Terra. Uma memória que eu preferia esquecer devido aos factos que haviam ficado longe dos olhares dos espectadores. Apenas entre mim e um Mute agora morto.
Senti as palmas das minhas mãos suadas e tentei esconder, isso e o facto do meu coração ter começado a bater que nem louco.
- Além disso - Continuou ele. - Meu filho irá entrar nessa edição.
Franzi o cenho, confusa, e o Rei olhou para Jace e, quando olhei na sua direção, já ele tinha aquele sorriso enorme preparado para mim.
- Espero que esteja preparada, Collins. - Disse Jace, na sua voz forte.
Fiquei apenas olhando ele. Como eu iria lutar contra o príncipe? Jace era um dos mais poderosos Mutes que existiam em Elmswood, além da sua forte técnica em combate, que ele aperfeiçoara em todos esses anos. E era essa última parte que me preocupava.
O príncipe era um Mute da mente. Um leitor de mentes excepcional, que além de ler pensamentos, conseguia ver as imagens que passavam pela cabeça dos adversários. Além disso, Jace conseguia usar isso em seu benefício, conseguindo entrar na mente do oponente e controlar todos os seus movimentos.
Todas as pessoas estavam vulneráveis perto de si. Todos menos eu.
Por algum motivo o poder do príncipe não funcionava comigo. E todos achavam que era por eu ser um escudo... Eu sabia que a verdadeira razão era outra. Se bem que o facto de ser um escudo ajudava bastante.
- Assim como em anos anteriores, os treinos começarão três semanas antes das Provas. - Disse o Rei. - Isso dará a possibilidade de vocês treinarem suas habilidades, sejam elas de Mutes ou não, e de conviverem com os restantes concorrentes.
Olhei o meu pão. Conviver para depois matar. Depois ergui o olhar, encontrando o do Rei, e assenti.
Ele sorriu. - Tudo familiar para você.
Sorri, parecendo divertida e confiante. - Claro.
Mas eu só queria sair dali correndo. Esse ano eu iria morrer, e seria nas mãos do príncipe mais idiota da história.
De repente, as portas da sala abriram e um rapaz entrou, sorrindo, um sorriso bastante familiar.
Era alto, de cabelo da cor do chocolate, rosto amigável, olhos do mesmo tom do cabelo, vestindo roupas de viajante, uma espada presa no seu cinto, descendo pela sua coxa esquerda. Era alto e sua postura possante, não tanto quanto Declan, mas ainda assim impunha respeito.
A Rainha levantou e o rapaz a abraçou forte, se afastando um pouco depois, recebendo carinho no rosto. Depois o Rei o abraçou, apertando forte nos seus braços.
- Pensei que demorasse mais. - Disse o Rei.
O rapaz riu. - Tentei ser rápido, não queria perder nada. - Se aproximou de Jace, que já se levantara, e abraçou ele, socando o seu ombro quando ambos se afastaram. - Principalmente quando meu irmãozinho vai participar na edição desse ano.
Jace revirou os olhos.
E foi aí que entendi. O sorriso familiar, o mesmo tom de cabelo do Rei, o olhar doce da Rainha... Aquele era o irmão do Jace. O príncipe herdeiro de Elmswood, que regressava de uma viagem pelos arredores do Reino, onde várias tropas do Rei estavam espalhadas, para proteção do mesmo. Eu nunca vira ele, em cinco anos que permanecia no palácio, pois sempre que ele aparecia, eu estava lutando pela minha vida. Aquela era a primeira vez que ele surgia antes de eu entrar nas Provas.
Seu olhar caiu sobre mim e ele se aproximou, esticando a mão para mim, delicadamente.
Coloquei a minha mão na dele, apenas por pura cortesia, e ele a levou até aos lábios, beijando as costas da mesma suavemente, sempre me olhando. Depois sorriu.
- Você deve ser a Nyra, encantado. Sou o Leonard, irmão do Jace. - Falou, sua voz suave.
Sorri e assenti levemente. Ele me soltou, sempre me olhando e depois foi ocupar o seu lugar, entre o Rei e o irmão.
Dei total atenção para a minha comida, segurando a faca com mais força do que a necessária, enquanto o Rei falava animadamente com o filho mais velho.
Começava a ficar ridiculamente cansada da família real e das suas Provas, principalmente quando ia enfrentar o filho mais novo do Rei, o mais poderoso dos Mutes existentes em Elmswood.
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Blood Proofs
General FictionO Reino de Elmswood não existiria sem a queda do mundo como o conhecemos. E nem as sangrentas "Provas de Sangue", combates entre pessoas, escolhidas do povo do Reino, que têm de lutar entre si pela vitória e a possibilidade de viverem no palácio...