Estranhos laços

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Woo Tak

O silêncio inquietante é como uma praga dentro do ônibus, ela se espalha e com ela acompanha traumas como o momento que cada um de nós estava na hora da infecção, quem perdemos, como no primeiro dia e os que perdemos durante o caminho, alguns não tivemos tempo suficiente para saber os seus nomes, apenas uma vaga memória que um dia estiveram por aqui, vítimas. Dirigi durante algumas horas, seis para ser mais exato, alguns dos ocupantes do ônibus revisavam a direção comigo até pararmos na beira da estrada, como diriam "no meio do nada" por uns minutos, decidimos seguir até um sitio secreto da família Kim, Eunyu contou que seu pai era um pesquisador que dedicou sua vida em entender infecções virais e preparou um local de emergência, um sitio isolado da civilização com paneis de luz solar, plantações com terra fértil que provavelmente teríamos que recuperar, poço e um sistema de filtração caseiro, um lugar perfeito para a situação atual. 
- Esse ônibus está desanimado, precisamos de uma música. – Diz Jieun enquanto se agacha ao meu lado, não tinha notado quando ela se aproximou.
- Não podemos fazer barulho. – Lembro. 
A garota ignora completamente o meu aviso enquanto colocava uma fita gravada no aparelho de som, ela era ágil em fazer o que queria sem que os outros notassem.
- Senhor Todo-poderoso, eu sinto minha temperatura subindo. – Ela começa a cantar Burning Love do Elvis Presley no ritmo que a música começa a tocar. - Mais alto e mais alto, está queimando dentro de minha alma. – Canta brincando sinalizando com as mãos enquanto se abana como se estivesse com calor. - Garota, garota, garota, garota. – Ela aponta para si. - Você vai me incendiar, meu cérebro está flamejando, não sei qual caminho tomar. – Jieun canta balançando a cabeça. – Vamos, cante comigo.. – Pede manhosa fazendo beiço.
- Seus beijos me elevam mais alto, como uma doce canção de um coral, você ilumina meu céu de manhã, com amor ardente. – Canto rendido com ela que sorri vitoriosa, me fazendo rir com a animação dela por algo bobo.
Reconheço que a animação dela me deu ânimo, nosso cenário é como um inferno na terra, as vezes precisamos de um pouco de luz para fugirmos do loop infernal que estamos condenados e presos. Encaro um posto de gasolina há dez metros de distância, precisaríamos de gasolina para chegar até a próxima parada, ainda mais próximo reparo uma loja de conveniência que seria útil para abastecer nossos suprimentos. Estaciono em frente a bomba de gasolina e retiro o cinto de segurança, viro-me para encarar os ocupantes que pareciam animados com a descoberta da primeira parada. 
- Irei encher o tanque e procurar alguns galões extras, a viagem será longa, ainda mais que temos a parada do estádio para buscar o irmão do garoto estranho. – Aviso.
- Você que é estranho, fica se escondendo com seu rosto pálido nas sombras igual o menininho do Grito. – SeungHo responde enquanto limpa a lente de seus óculos escuro e põe no rosto, sorrindo debochado em minha direção. 
Reviro os olhos e direciono a atenção para a janela, observando se os carros estacionados pelo o posto estão vazios, mas os vidros são escuros, melhor evitar. 
- Eu e Jinyoung podemos ir no posto para varredura do local, se estiver limpo, avisamos para outros entrarem e reabastecerem as mochilas. – Eunyu sugere. 
- Eu vou com você. – Jieun afirma me cutucando.
- Não. – Nego e me afasto, saindo do ônibus. 
Não queria ser grosseiro com a garota, algum tempo notei que ela me observava no nosso prédio e sempre deixava biscoitos de café da manhã antes de eu ir trabalhar, confesso que ela me atraí bastante, mas seria perigoso para ela sair do ônibus e encontrar um doente que a machucaria. Caminho até a estante que havia galões de gasolina, seguro dois em cada mão e retorno até o ônibus, a garota estava na porta do veículo e corre em minha direção, pegando um galão com muito esforço para tentar me ajudar. Respiro fundo e não critico, as vezes é mais fácil manter perto do que longe. 
- Boa menina. – Zombo acariciando o topo de sua cabeça. 
- Eu não sou um cão doméstico. – Ela retruca.
- Com certeza, ele é mais obediente. – Respondo enquanto retornava até a estante, escutando ela bufar atrás de mim, me fazendo sorrir timidamente. 
Escuto um grito e viro me rapidamente, ela estava cercada, corro até a garota e solto a mangueira da bomba de gasolina, passo a mangueira ao redor do meu braço direito, usando meu ombro de apoio, deixando um metro e meio solto, flexiono o braço pra trás e arremesso a ponta da mangueira na cabeça de um doente próximo a ela, abro um espaço entre eles, me agacho e passo pelo o meio de dois doentes, me posiciono na frente dela e solto mais um metro da mangueira, jogo ela para trás para pegar impulso e a puxo de volta, arremessando nos doentes com força o suficiente pela a velocidade impulsionada, derrubando como peças de boliches. Seguro na mão de Jieun e corro com ela até o nosso ônibus, espero ela entrar e fecho a porta atrás dela. Como ao redor da gasolina, a loja de conveniência está cheio de doentes, os vidros quebrados enquanto entravam cada vez mais infectados no estabelecimento, caminho apressado e agachado por trás da loja, entrando pela a porta de trás, logo que entro um infectado grunhe esticando os braços até mim, seguro no ferro da estante na parede ao meu lado, puxo o móvel derrubando em cima do doente, apoio uma mão na estante e impulsiono meu corpo saltando por cima. Ergo o rosto procurando pelo os dois policiais, os infectados cercavam ambos enquanto os dois estavam em cima da estante do corredor do meio, alguns doentes tentavam segurar os seus pés para alcançá-los. Olho ao redor procurando por algo que pudesse ajudar, sigo até o freezer e retiro duas garrafas de refrigerantes, abro ambas e despejo o liquido nos corredores enquanto os doentes estão distraído, rasgo pacotes de balas e jogo nos pés dos infectados que começam a resbalar e caírem um sobre o outro. Caminho abaixado até o corredor do meio e ajudo os dois a descerem, agora ambos no chão, corremos em direção a porta dos fundos, uma doente segura no ombro de Jinyoung e o puxo para trás, Eunyu rapidamente fecha o punho e acerta um soco na cara da infectada que cai para trás. 
- Só eu toco nele. – Ela diz. 
Reviro os olhos e corro com os dois para fora da loja, subimos no ônibus e fechamos a porta, Euntak estava sentado no banco do motorista que liga o veículo e dirige para longe dali, minha respiração estava bastante ofegante, me sento em um banco no fundo e fecho os olhos, adormecendo.
Entreabro os olhos devagar e me afasto batendo com a cabeça na traseira do ônibus com a figura pequena e irritantemente feliz me encarando. Ela franze as sobrancelhas fazendo uma careta provavelmente se sentindo culpada pelo o susto que me deu.
- Você está bem?. – Jieun pergunta preocupada.
- Poderia estar melhor. – Resmungo e ajeito a postura. 
Noto que o ônibus está parado e havia alguns passageiros faltando nos bancos, arqueio a sobrancelha e me afasto novamente, reparando a outra criatura estranha de óculos escuro e sorridente sentado ao meu lado, estou cercado de malucos. 
- Encontramos um Motel Spring Light, calma safadinho. – Ele começa brincando. – Apenas para dormir relaxados, mas sem relaxar demais, ou talvez sim. – Ele ri e dá uma piscadela. 
- Eu cuido do ônibus. – Ofereço quase desesperado.
- Meu irmão e a namorada vão ficar no ônibus, estão acostumados a ficarem de patrulha, o restante de nós ficará em quartos, mulheres para um lado e homens para o outro. – Jieun explica. 
A garota logo que finaliza sua explicação, adentra o ônibus Jinyoung, Eunyu, Jongin e Euntak, avisando que os quartos do primeiro andar estão limpos para passarmos a noite, sem infectados despidos.
- Será que vamos ver algum infectado transando?. – SeungHo pergunta enquanto saíamos do ônibus. Sinceramente, estava começando a considerar prender ele em um quarto "Não limpo".
Uma santa pequena do nosso grupo, que aparentemente parece se importar com o rapaz irritante, arrasta ele para dentro do Motel, presenteando o restante com alguns minutos de paz sem as esquisitices dele. Na entrada, encontramos as chaves em formato de coração rosa, cada uma com o número do quarto, obviamente cada quarto tem uma cama de casal, formamos duplas para a divisão justa e respeitosa: Areum e Jennie, Soobin e Jieun, Krystal optou por ficar em um quarto sozinha para manter sua "privacidade", a divisão masculina: Jongin e Euntak, infelizmente, eu e SeungHo. Pego a chave do meu quarto e caminho pelo o corredor rosa pink acompanhado do meu colega, felizmente, ele parecia tão cansado quanto eu. Abro a porta e franzo a testa observando o quarto inteiro rosa com luminárias brilhantes, meus olhos ardem com tamanha cor chamativa. 
- Acho que um unicórnio vomitou por aqui. – Zomba SeungHo. – Que saudade da minha casa. – Resmunga. 
- Eu também. – Comento.
Sem abrir os olhos, sinto uma respiração próxima ao meu rosto, um bafo gélido e com fedor de cadáver, exalava a morte, abro os olhos e encaro um infectado completamente sem roupa na minha frente, um homem sem órgão genital. Dou um pulo para trás, derrubando SeungHo da cama que se posiciona em pé de imediato. Puxo a coberta e jogo na cabeça do homem, corro com o meu colega para fora do cômodo, fechando a porta atrás de nós. Escuto passos acompanhados de um barulho alto, um doente havia caído da escada, outro cai sobre ele, assim empilhando um sobre o outro, enquanto os de cima começam a cair para o chão ao lado, rastejando para fora do pequeno empilhamento de doentes.
- Acorda eles!. – Mando. 
Corro até a parede do corredor, seguro o extintor e puxo com força, retirando do suporte, viro o extintor na versão vertical, puxo a trava rompendo o lacre de segurança, com a outra mão seguro a mangueira e aperto o gatilho, direcionando o jato dos infectados, os atrasando enquanto SeungHo batia nas portas dos quartos, avisando o restante do grupo. O jato começa a falhar e arremesso o extintor nos doentes, correndo com os sobreviventes para fora do Motel, retornando para o ônibus, fomos direto para a janela para bater no vidro e alertar os policiais, mas somos surpreendidos, Eunyu estava sem roupa sentada no colo do Jinyoung, fazendo movimentos sugestivos de estar subindo e descendo, ambos arregalam os olhos e param o que estavam fazendo, ponho as mãos na frente dos olhos de Jieun, tampando sua visão, ao meu lado vejo Jongin fazer o mesmo com sua irmã Soobin.  
- DEPRESSA!. – Gritamos. 
Eunyu veste o casaco de Jinyoung e corre até a porta do ônibus, apertando na trava para abrir a porta, entramos todos apressados e logo que a porta do veículo é trancada, encaramos ambos. 
- Acho que estou traumatizada para o resto da minha vida. – Jieun resmunga. 
Os doentes começam a bater na lateral do ônibus, sento rapidamente no banco do motorista, começo a dirigir para longe do Motel, ambos passageiros ficam acumulados nos bancos da frente do veículo enquanto o casal se vestia. Começo a gargalhar dirigindo, arrancando olhares confusos entre todos, mas é a primeira cena normal que presenciamos nos últimos dias e foi a que mais nos surpreendeu. Estamos vivos, temos desejos, prazeres, os doentes não tem mais isso, devemos fazer o que tivermos vontade enquanto ainda temos tempo e claro, ainda vivos. Dirijo com uma mão e com a livre estico até o porta luvas, pego uma fita e coloco na entrada do rádio, logo que começa a melodia reconheço, é uma das preferidas da minha mãe.
- Escute, amor. – Canto chamando a atenção de um ser pequeno. - Não há montanha alta, não há vale profundo, não há rio largo o suficiente, amor, se você precisar de mim, me chame, não importa onde você esteja, não importa a distância
- Não se preocupe, amor. – Completa Jieun em pé ao meu lado, segurando na barra de segurança. - Apenas chame meu nome, estarei lá depressa, você não tem que se preocupar. – Ela diz e me cutuca com o seu braço, 
- Oh, amor, não, há montanha alta o suficiente, não há vale profundo o suficiente, hão há rio largo o suficiente, que me impeça de chegar até você, amor. – Cantamos juntos e sorrindo. 
Encaro a estrada a minha frente, o sol nascendo, acompanhado de pessoas estranhas, quando antigamente eu não conseguia dar um "bom dia" para alguns companheiros de serviços, hoje estou cantando com uma garota e sonhando com um amanhã com estranhos, e com esperança de um futuro.

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