Soltem O Meu Preto [1]

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Envolve de negritude o que nunca foi, o infante em meus braços traz em si uma miríade de narrativas, mas escolhe o silêncio, pois as lágrimas já expressam tudo que é necessário. Se uma mãe escravizada pudesse sorver das águas do riacho, entregaria tudo aos céus e agradeceria por vislumbrar além da escuridão. Há inúmeras formas de clamar por socorro, mas a fome por uma liberdade distante mantém sua visão límpida; seu marido não pode escapar das grades, pois, afinal, não roubou o bastante.

O que está consignado no papel é indelével; as correntes que o prendem podem ser vistas como um vigia particular que sussurra obscenidades, mas tudo depende da perspectiva. A tinta é negra, assim como seus pensamentos, mas isso não pode justificar suas traições. O infante, que se desenvolveu no ventre daquela mulher, agora padece de fome, e você sabe que não pode socorrê-lo.

Inominável é o sangue que flui das veias daquela pequena criatura. Você sabe que, no momento, não há um local onde possa ser sepultado, mas, para você, deve ser fácil resolver, dada a sua vasta experiência. Não pretenda que somos iguais. Jamais seremos, pois você precisa criar um mundo imaginário onde desfazer-se de cadáveres é uma tarefa árdua. Esforce-se mais, assim como aquele homem por trás das grades.

Viver o luto permite expandir a mente para uma experiência insólita, mas, primeiramente, é necessário imergir em um ambiente inóspito de luz, completamente escuro, pintado pela história e pelo sentimento de cada um que ali esteve. Sinta a tinta penetrar em lugares dentro de você, tudo não passa de uma lente moldada pelo policial que esteve no cenário do crime. O desfecho é invariavelmente o mesmo, desde que a moeda de troca seja algo replicável. Algo como uma mãe sem marido, sem infante e sem um futuro definido.

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