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Harry recebeu a comida num cepo de madeira fino. Carnes, legumes e pão. Ele comeu como se fosse a única refeição que tivera em meses. Sua barriga se embrulhava a cada mordida, reclamando como um animal faminto. A água foi tomada de uma vez, quase o engasgando no processo. A carne estava especificamente divina, com temperos de verdade e uma maciez que o fez revirar os olhos. Aquela refeição era um banquete que comeria pela primeira e última vez. Elizabeth não costumava servir nada além de pão velho e leite dormido. Legumes eram uma vez na semana e carne, quando mereciam, uma vez ao mês.

Ele estava feliz demais, até se dar conta de que aquela seria –literalmente– a última refeição de sua vida. Seu estômago doeu, sua garganta se formou um nó e então ele só foi rápido o bastante para vomitar ao lado da cama, sujando o chão com tudo que havia comido naquela última hora. O guarda entrou, alerta. Mas Harry não precisou se explicar, ele viu a lavagem espalhada. Outro soldado que entrou atrás do homem o chamou de "medroso", mas Harry sequer se importou. Ele se sentiu impotente quando os criados vieram limpar sua sujeira, ele tentou levantar para ajudar, porém o soldado que estava sempre em sua cola mandou que ele se deitasse e ficasse quieto.

Harry nem mesmo viu quando terminaram, pegou no sono antes disso.

Ele acordou com o quarto parcialmente iluminado. Mas ainda estava muito desorientado para ter certeza se ainda era de manhã ou tarde. Harry conseguiu ficar de pé, sentindo o chão frio sob seus pés descalços. Ele foi até a porta e bateu até que o guarda de sempre abrisse. O soldado ficou em alerta, colocando a mão sobre a espada e esticando uma mão para que ele desse alguns passos para trás. Harry nem mesmo protestou, parecia óbvio para si que não havia meios de escapar naquela situação.

— Que horas são? — Harry perguntou.

— Se quer saber, é o momento em que você será julgado. — Disse indo até ele.

— Eu poderei ver minha irmã antes da execução? — Indagou, colaborando ao colocar as mãos para trás. O guarda pareceu surpreso, mas não hesitou ao amarrar seus pulsos mais uma vez.

— Andando.

Harry percorreu o mesmo caminho que veio. Viu guardas e criados. Talvez tenha até flagrado um guarda cortejando uma criada que sorria com a mão sobre a boca. Seu lábio se curvou para cima, inconscientemente. Ele imaginou que poderia abraçar Gemma uma última vez. Pensou, por um momento, que talvez tenha piorado as coisas ao criar aquela confusão no prostíbulo. Ele se perguntou, caso sua irmã tivesse sido levada, a veria em algum estágio de sua vida? Talvez se tivesse colaborado, o rei fosse piedoso e permitisse que pudessem se encontrar num vale não tão distante. Talvez tivessem a permissão de matar a saudade uma vez no ano, talvez duas, talvez todos os dias. Por ventura, apenas continuasse sendo o prostituto mais procurado do bordel e sua irmã uma das meninas do harém do rei.

Mas não. Harry sabia que estava se enganando. Não haveria visitas, nem piedade. Daria o último suspiro sem nunca mais tocar no rosto sardento da irmã. Ela iria sofrer até o dia em que o rei se cansasse e então a mataria e a substituiria como uma bota velha e sem uso.

— Ajoelhe-se. — Foi empurrado. Sequer havia se dado conta de que já estavam ali. O cenário era o mesmo. As pessoas sentadas nas extremidades ao seu lado direito e esquerdo. O tablado com o trono e um rei entediado, apoiando o queixo numa mão e o cotovelo sobre o braço da cadeira acolchoada.

— Harry Styles, — Um homem à sua direita disse alto o suficiente para toda a sala ouvir. — você assume sua responsabilidade sobre seus crimes contra a autoridade do rei William?

Harry franziu o cenho.

— Não. — Disse. No instante que se seguiu as pessoas se expressaram com sons surpresos, como se ele houvesse cometido mais um crime.

The Last Great King {lwt+hes}Onde histórias criam vida. Descubra agora