quem não tem mais medo sou eu (e eu sou você)

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Boa tarde! Fiquei muito feliz com a recepção de vocês do último capítulo. E quem falou que se identificou com a Natália ou pagou de alguma maneira, se sintam abraçadas ❤️‍🩹❤️‍🩹❤️‍🩹. Espero que gostem desse, comentem durante a leitura ou no fim para eu saber o que estão achando. Bom capítulo <3

A música do título é Medo - Terno Rei

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POV Natália

Acordei desorientada. Um tufo de cabelo cobria minha boca, o que não era incomum já que eu me mexia enquanto dormia. No entanto, ao abrir os olhos, a cor do cabelo parecia escura demais para me pertencer.

Tentei me situar e tudo voltou como uma bomba em cima de mim. Tudo que tinha falado para Carol noite passada. Tudo que eu tinha revelado para ela. O sono que me atingiu depois, a calmaria depois de uma noite tempestuosa.

De alguma maneira, durante a noite, devo ter me mexido e me acomodado em seu ombro. Seu braço estava por baixo do meu corpo e passava pelo meu pescoço, indicando que também tinha se acomodado em mim da mesma maneira. Aproveitei a sensação por míseros segundos até me forçar a levantar e ir até o banheiro. Carol apenas se virou e continuou dormindo.

Encarava meu reflexo no espelho depois de uma noite bem dormida. Considerando o teor da minha conversa com Carol ontem, esperava olheiras maiores e sinais do peso da minha confissão. Pelo contrário, sentia que, sob a aceitação de Carol, o segredo que mantive por tanto tempo era apenas mais um detalhe sobre mim. Adicionei às minhas palavras.

Natália Cardoso. Tia. Amiga. Irmã. Fotógrafa. Lésbica.

Pela primeira vez em muito tempo, não parecia pejorativo. Parecia comigo, ali, com 40 anos, prestes a sair de um casamento falido. Com as marcas que o tempo adicionou desde a última vez que tinha pensado na minha sexualidade. E nada disso me fazia menos lésbica.

Era o mais perto que já tinha chegado de sentir orgulho de mim. A responsável por tal feito estava acordada quando voltei para o quarto.

— Bom dia — desejou, me olhando curiosamente. De certo procurando indicativos do meu estado depois da crise que presenciou — Dormiu bem?

Sentei na cama: — Nem percebi quando adormeci. Acho que tirar todo aquele peso dos meus ombros foi cansativo.

— Acho que a gente tem que conversar sobre o que descobrimos ontem.

Ali estava. Carol ia dizer que tinha pensado melhor, que não queria ficar perto de mim por eu ser tão mentirosa quanto Ulisses. Que não entendia como uma mulher poderia desejar outra. Que tinha nojo de mim. Já estava preparada, vivia preparada para esse discurso desde que descobri minha sexualidade. Imaginava minha mãe dizendo isso para mim, seu olhar já não me reconhecendo. Meu pai dizendo que nada mais que era deles seria meu. Parece que não importa o quanto eu achasse que estava evoluindo, a rejeição sempre estaria no fundo da minha mente, como uma semente esperando que alguém plante. O que não significa que doeria menos. Esperei o baque.

— O que a gente vai fazer agora que sabemos que Ulisses tem mesmo uma amante aqui?

O assunto me pegou totalmente de surpresa. No meio de tudo, tinha esquecido completamente de Ulisses e de todo o motivo por estarmos ali, dividindo uma cama em outra cidade.

— Acho que temos que contar para a mulher, mas não pode ser agora, porque se não Ulisses pode saber que a gente sabe e nosso plano vai por água abaixo. Eu digo pra a gente continuar seguindo ele à noite para se certificar de que não tem mais nenhuma outra e, no fim da viagem, contamos e pedimos para esperarem até conseguirmos tudo que precisamos. O que acha?

lágrimas negras // narol Onde histórias criam vida. Descubra agora