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🖇️ | Boa leitura!

Por um tempo, nada daquilo pareceu real

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Por um tempo, nada daquilo pareceu real. Mas quando eu finalmente caí em mim, a realidade me acertou como se alguém tivesse jogado algo pesado no meu peito.  Primeiro, me senti sozinha, como quando eu estava no orfanato esperando que alguma família me escolhesse. De novo, eu não tenho mais pais. Mas ao contrário de como aconteceu quando eu era criança, eu tenho pessoas que querem cuidar de mim simplesmente porque me amam. As coisas seriam mais difíceis se eu não tivesse uma mão para segurar o tempo todo desde o momento em que saímos de casa e enterramos o meu pai em seu descanso eterno.

Ganhei uma licença de uma semana do trabalho e não fiz nada além de existir no meu apartamento durante aqueles dias. Dormir também foi um pouco difícil e às vezes eu amanhecia o dia com o isqueiro do meu pai na mão, apertando o objeto enquanto eu olhava para o nada.

Só não fiquei totalmente sozinha porque o Noah insistia em vir e ficar comigo, mesmo que eu dissesse que não queria companhia. Não falamos do meu luto, ele só foi ele mesmo e me tratou como sempre. Estar apaixonada por ele passou a ser mais fácil do que antes, principalmente porque ele terminou com aquela coisinha brilhante e sorridente que queria que ele se vestisse como um boneco. Isso poderia me dar um empurrão para algo com ele, mas minha vida ainda está pesada demais para pensar em namoro.

Nós maratonamos séries, ele me mostrou seus quadrinhos novos, me ensinou a jogar videogame – e devo dizer que essa merda vicia, então eu entendo a obsessão dos nerds por isso –, cozinhou para mim e, principalmente, não me deixou sozinha. Noah fez exatamente o que prometeu naquele dia no hospital.

Agora é segunda-feira e a minha semana de pausa chegou ao fim. A vida adulta bateu na porta e eu fui obrigada a atender.
Estou no balcão da cafeteria com o queixo apoiado em minha mão olhando os poucos clientes da manhã. O horário de pico já passou, então só alguns aposentados e adolescentes matando aula estão por aqui. Tento me concentrar em alguma dessas pessoas e fazer o que eu sempre fiz: olhar as peculiaridades humanas. Mas por mais que eu focasse, eu não conseguia me interessar por ninguém. Na parede, o relógio faz um barulho que eu nunca notei antes, mas que agora está sendo bem irritante.

Tic-tac.

Não tem nenhuma mesa que eu já não tenha limpado, o chão está brilhando e todos os clientes foram atendidos.

Tic-tac.

Pela vidraça da porta, vejo um homem de terno passar apressado e esbarrar numa mulher, derrubando todas as compras dela. Ele não para para ajudar. É só mais uma segunda-feira comum com gente apressada e grosseira.

Tic-tac.

Na cozinha, escuto a garçonete nova rir de alguma coisa que o cozinheiro diz. Acho que eles estão flertando.

Tic-tac.

Do meu bolso, tiro o isqueiro do meu pai e o abro observando a chama. Em uma das nossas últimas conversas, ele tentou me incentivar a procurar um rumo melhor para a minha vida, porque tinha medo de me deixar sozinha e sem apoio financeiro.  Isso me faz lembrar que agora não tem mais ninguém para pagar o meu plano de saúde ou cobrir o meu aluguel quando eu não tiver o suficiente.

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