Capítulo 14: O Medo e a Coragem

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— EU SENTI TANTA FALTA DE VOCÊS!

Corro até Rodrigo e Xaiane e pulo em cima deles, derrubando os dois no chão e começando a chorar. Eu estava no ponto de ônibus, apenas esperando o ônibus que os trazia de volta da rodoviária.

— Nós também. — Rodrigo diz, me tirando de cima dele e levantando do chão. — Mas não precisa nos derrubar na rua.

Ele pega a mochila do chão e põe nas costas, enquanto Xaiane ainda se levantava do chão. Seco as lágrimas e dou o braços aos dois, caminhando com eles até suas casas. Pelo o que sabia, eles moravam no mesmo terreno, Rodrigo na casa de baixo e Xaiane na casa de cima, com seus respectivos pais. Rodrigo chegou a contar que seus avós tiveram seis filhos. Uma mãe de Rodrigo, outro o pai de Xaiane, Roberta, Jonathan e outros dois que faleceram, um quando tinha dez meses de vida e o outro aos vinte e três anos de idade.

— Como foi o carnaval aqui? — Xaiane pergunta.

— Ah, eu lutei contra o Fofão, depois minha mãe levou a Clarissa e eu para a balada só que encontramos a Vanessa e o bonde das maravilhas e começamos a brigar e fomos levados pela polícia. Aí a Vanessa e a Clarissa dormiram lá em casa, e passamos o resto do carnaval todo cumprindo serviço comunitário, e eu descobri que a família ocultista da Vanessa são os covers da banda Calcinha Preta. — Conto, fazendo Xaiane e Rodrigo me olharem assustados com tanta informação. — E eu conheci a tia Roberta e o tio Jonathan.

— Como assim você foi presa? — Rodrigo pergunta confuso. — E como assim os bruxões do medo são covers do Calcinha Preta?

— Pois é, também fiquei chocada quando soube. — Dou de ombros.

— O que achou dos nossos tios? — Xaiane pergunta, ignorando tudo o que eu havia dito.

— Achei sua tia uma diva. E o tio de vocês, e mercenário, pareceu bem normal para mim. — Admiro, chegando no portão da casa deles. — Vou deixar vocês descansarem. Nos vemos amanhã no colégio?

— Com certeza. — Rodrigo afirma e boceja, e eu sabia que ainda eram seis da manhã e que a viagem deles foi super longa.

Me despeço deles e vou para a praça pública, onde seria nosso último dia de serviço comunitário. As aulas voltam amanhã, mas eu estava sinceramente pensando em faltar. Pelo menos tudo isso me fez refletir para nunca mais na vida fazer alguma besteira que me leve para a prisão.

Encontro Clarissa, Vanessa e Maurício lá, já limpando as ruas. Haviam outros garis hoje, mas eles se aproveitavam da nossa sentença para limparmos a maior parte. Vanessa quase não trocou nenhuma palavra conosco desde quando começamos a coleta, mas era melhor assim. Durante esse tempo também não teve nenhuma lenda. Acho que os Calcinha Preta estavam ocupados demais fazendo shows ao invés de se preocuparem com lenda urbana. A única pessoa que poderia fazer os rituais enquanto o culto estava no trio elétrico, estava ali limpando o chão comigo.

Quando terminamos, respirei fundo, aliviada por ver que as ruas já estavam todas limpas. Eu estava cansada, era um trabalho difícil e exaustivo. Hoje estava fazendo muito calor e o sol ainda queimando a tudo e todos. Imaginei como devem ser as pessoas que trabalham com isso todos os dias, e a pouca valorização que eles têm na sociedade.

— Você vai vir comigo antes de ir para casa. — Clarissa avisa quando nos trocamos, e eu a olhei confusa.

— Aonde?

— Você vai ver.

Assim que terminamos de nos trocar, começamos a andar pela rua. Enquanto eu contava a história de como quebrei meu dente brincando de balanço com a Shakira, Clarissa me guiou até dentro da floresta. Desconfio um pouco, pois a última vez que estive ali, coisas ruins aconteceram.

Coração de Lobo, Alma de BruxaOnde histórias criam vida. Descubra agora