Eu já ouvi falar da lenda da desgraça uma vez.
Desde quando eu era bem pequena, minha mãe dizia que minha avó detestava a palavra "desgraça". Uma vez meu avô chegou em casa cansado do trabalho, com raiva, e só queria descontar na minha mãe, na minha tia e na minha avó. Ele disse, repetidas vezes:
— DESGRAÇA! QUE DESGRAÇA DE VIDA! MINHA FAMÍLIA É UMA DESGRAÇA!
E minha avó Ivete sempre o repreendia, pois segundo ela, ele estava convidando a desgraça para dentro de casa.
Quando todos estavam dormindo, minha mãe contou que levantou de madrugada naquela noite e caminhou silenciosamente até o quarto dos seus pais. Ela ouviu arranhados e grunhidos na porta, e que conseguiu ouvir minha avó rezar bem baixinho, em meio a um choro quase silencioso.
No dia seguinte, meu avô amanheceu morto devido a um ataque cardíaco. Minha mãe diz que minha avó passou vinte e um dias rezando para o Arcanjo Miguel, a fim de proteger sua casa contra qualquer entidade maligna. Minha avó não gosta muito de tocar no assunto, mas ela disse que viu a própria personificação da desgraça na noite em que seu marido se fora. A desgraça repetia incontáveis vezes para meu avô:
— Não foi tu quem me chamou? Pois eu ouvi você.
A palavra "desgraça" então se tornou uma palavra proibida na casa da minha avó. Toda vez que, por algum motivo, alguém dissesse essa palavra, deveria bater três vezes na madeira. Assim fomos criados eu, meus irmãos e meus primos, e eu não duvido que a desgraça realmente tenha aparecido para ela.
As lendas urbanas sempre existiram, e era difícil o paranormal não acessar ao mundo real de vez em quando. Porém, agora a história era outra; as lendas estavam mais reais e mais fortes, e seu objetivo era único e mútuo: assustar ao máximo de pessoas que conseguisse.
— Que desgraça o quê! — Um dos convidados da festa diz, zombando do medo de Maurício.
— Droga! — Ouço Francis murmurar ao meu lado. — Já volto.
Estranho quando a vejo se afastar. Francis não parecia ter duvidado e muito menos se assustado quando o Maurício e a Raquel falaram da Desgraça. Me aproximo de Rodrigo, enquanto Xaiane parecia estar dormindo sentada em um banco.
— Esse lugar é grande demais para encontrarmos o emblema. — Rodrigo diz apreensivo.
— Vou tentar falar com a Clarissa.
Pego meu celular e escrevo seu número, ouvindo a linha de espera do outro lado. O telefone toca, mas ela não me atende. Envio uma mensagem, mas aparentemente Clarissa estava sem internet. Tento ligar de novo, mas ela não atende.
Ouço gritos apavorados vindo da floresta, e então, algumas ondas se criam no lago que normalmente é calmo e parado. Vanessa olha ao redor, enquanto haviam algumas pessoas ao seu redor. Ela parecia confusa e um pouco irritada.
— Ei, você não consegue parar isso? — Pergunto, pois era óbvio que os pais dela estavam por trás disso tudo.
— Eu não faço parte do clubinho do medo. — Ela responde, como se fosse óbvio. — Eu sei que tem o emblema que quando é queimado, o ritual é quebrado, mas aqui na floresta eu não faço ideia de onde esteja!
— Então você vai ajudar a procurar. É o mínimo que pode fazer! — Falo, usando uma tonalidade de voz ameaçadora.
— Vou deixar a Xaiane lá dentro. Ela não vai conseguir fazer nada desacordada. — Rodrigo avisa, segurando Xaiane no colo e a levando para dentro da casa do lago.
— Só para você saber, eu não tenho nada a ver com as lendas urbanas estarem acontecendo. — Vanessa diz, enquanto começamos a olhar todos os cantos, procurando o emblema. — Isso é coisa da minha família para trazerem o Altharion de volta.
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Coração de Lobo, Alma de Bruxa
FantasíaStefany Lobos é uma adolescente que se vê obrigada a mudar de cidade e viver em Três Luas junto com a família. Porém, as coisas se tornam estranhas quando as lendas urbanas começam a se tornar realidade e o medo se instala na cidade. Em meio às inve...