— Você tem certeza que quer ir? — Minha mãe pergunta preocupada, enquanto Ricardo me ajudava a carregar minha mochila extremamente pesada até seu carro. — E se você ficar com dor?
— Relaxa, mulher. Eu só torci o pé, dá para andar de muleta. — Falo, mostrando a muleta e entrando no banco carona do carro do Ricardo.
Na madrugada do dia anterior, eu levantei para beber água. Porém, a querida Shakira pulou em cima de mim enquanto eu estava descendo as escadas, me fazendo rolar e torcer o tornozelo esquerdo. Lucas e minha mãe me levaram às pressas para o hospital, e lá o médico enfaixou meu tornozelo e me deu um remédio para dor. Desde então, estou andando manca, mas nem isso me faria perder a maior viagem da escola.
— Ela vai ficar bem, Ione. — Ricardo diz tranquilamente, se aproximando da minha mãe e lhe dando um beijinho na bochecha. — Não se preocupe, eu vou ficar de olho. Se acontecer alguma coisa eu te aviso e trago ela de volta.
Minha mãe faz uma oração antes de Ricardo começar a dirigir. Quando eles começaram a namorar, fiquei com medo dele magoar minha mãe, mas aos poucos fui percebendo que ele era um bom homem. Apesar de não ter muita proximidade com Rafaela e com Lucas, que são os mais velhos, Ricardo sutilmente passa uma sensação de paternidade para mim, algo que eu nunca recebi. É estranho, diferente, mas eu estou gostando. É uma coisa que eu sentia falta sem mesmo nunca ter vivenciado.
Assim que chegamos na escola, Ricardo abre a porta para mim e eu logo vejo Rodrigo e Xaiane se aproximarem correndo. Notei os dois grandes ônibus de passeio parados na rua, enquanto os professores faziam a fila dos alunos para entrarem.
— E aí, como você está? — Rodrigo pergunta, alternando o olhar para meu rosto e para minha muleta.
— Manca. — Respondo. — MAS ANIMADA! VAMOS ACAMPAR!
— Que ideia mais estúpida, colocar um monte de adolescente para dormir junto! — Xaiane diz com desdém e cruza os braços. — Espero não ouvir coisas indesejadas.
— Não se preocupem, crianças. As barracas femininas e as masculinas vão ficar em repartimentos diferentes. — Ricardo diz, pegando minha mochila e me entregando.
— Meio que isso não impede nada. — Respondo baixo, e ele me encara um pouco desconfiado.
— Bom, vamos logo. — Rodrigo diz ao meu lado, me ajudando a caminhar até a fila do ônibus.
Enquanto conversávamos empolgados, finalmente entramos no ônibus. Me sentei no meio, no banco do canto, enquanto Xaiane sentou ao meu lado. Já Rodrigo ficou atrás da gente, no banco da ponta, atrás da Xaiane. Percebi que as duas turmas do terceiro ano estavam misturadas no ônibus. Até onde eu sabia, o acampamento seria um passeio para pôr em prática alguns conceitos que aprendemos em sala de aula em algumas disciplinas como história, geografia, biologia e artes.
— Vou fazer a chamada. — Diz Ricardo na frente do corredor, assim que todos os alunos entraram no ônibus.
— Ana Clara, Arthur, Beatriz, Caio, Clarissa... — Ele vai falar enquanto os alunos respondem, me dou conta que Clarissa estava no ônibus também.
Dou uma rápida olhada pelo ônibus, e logo a vejo da fileira do outro lado, sentada uns três bancos a frente. Ela estava com a representante de turma da sala dela, e elas pareciam estar dividindo o fone de ouvido. A garota fala alguma coisa para Clarissa, que apenas dá um sorriso e responde de volta.
Mesmo incansavelmente, sinto um imenso incômodo por dentro. Era uma mistura de raiva, vontade de gritar e quebrar tudo, e ao mesmo tempo só ficar chorando em posição fetal. Eu não fazia ideia de por que estava me sentindo assim, a única coisa que eu sabia era que eu detestava isso.
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Coração de Lobo, Alma de Bruxa
FantasyStefany Lobos é uma adolescente que se vê obrigada a mudar de cidade e viver em Três Luas junto com a família. Porém, as coisas se tornam estranhas quando as lendas urbanas começam a se tornar realidade e o medo se instala na cidade. Em meio às inve...