Prólogo

1.1K 137 19
                                    

Vinte anos antes...

Freen abriu os olhos e levou um momento para se lembrar de onde estava. A luz que passava pela persiana entreaberta e empoeirada iluminou a parede do outro lado do cômodo.

Uma mulher de jaleco branco estava ao lado da cama, com uma prancheta na mão, e o som da caneta contra o papel era quase abafado pelo bipe dos monitores.

— Você está acordada de novo. — A voz da médica era baixa.

A mente de Freen girou um pouco enquanto ela tentava se lembrar o nome da médica. Teresa? Tracy? Trudi? Tinha certeza de que começava com “T”, mas seu cérebro estava lento desde o procedimento.

— Como você está se sentindo?

A jovem fez menção de assentir, mas sua cabeça era como um peso morto. Se forçou a engolir em seco. Queria muito poder escovar os dentes.

— Bem — resmungou. Pelo menos, esperava ficar bem. Depois de seis anos vivendo momentos de muita tensão, sua expectativa era de que isso marcasse um recomeço. O início de uma nova vida. Fazia dois dias desde a operação. Tinha tubos saindo de sua boca e nariz, estava cheia de pontos, mas estava viva.

A médica a olhou fixamente, então assentiu.

— Só não se esqueça de que você vai se sentir mal por um tempo. Vá com calma e seja gentil consigo mesma. Não exagere. Você tem o resto da vida pela frente. Nada de levantar pesos, correr ou pular.

Ter uma chance seria ótimo.

A médica apertou seu braço. — Vejo você mais tarde. Descanse um pouco. — Ela fechou a porta com um clique silencioso.

Freen se ajeitou na cama. Sentiu um pouco de dor. Seus molares doíam, o peito estava apertado e as pálpebras estavam quase se fechando. Respirou fundo, então fez uma careta. Queria se inclinar e se enrolar em uma bola. Qualquer coisa para aliviar as dores constantes.

Mas tudo valeria a pena. Logo, seus dias de hospitais e salas de espera de consultórios terminariam. Com o tempo, poderia até ser capaz de correr. Chega de calcular o risco em cada passo. A médica prometeu que ela viveria uma vida tão normal quanto qualquer outra.

Mas será um caminho lento, sobretudo nos primeiros meses. Você vai ter que ser paciente.

Essa era uma habilidade que ela havia aperfeiçoado.

— Você vai superar isso. Você é a minha guerreirinha. — Era o que a mãe sempre dizia. Freen brincou que, no próximo ano, iria pular de paraquedas para comemorar seu aniversário de um ano. A mãe disse que ela não faria isso. Talvez não o fizesse mesmo. Não queria causar ansiedade à mãe. Talvez pegasse leve e fizesse coisas normais. Coisas que todo mundo tomava como certo.

Como correr para pegar um ônibus, dançar como louca... Talvez até beijasse uma garota. Ela se permitiu dar um sorrisinho, embora as maçãs do rosto doessem. Seria demais. Além disso, talvez pudesse finalmente realizar seu sonho de se tornar atriz. Se inscrever em um curso de teatro, como sempre prometeu. Mal podia acreditar que essas coisas estavam ao seu alcance.

A jovem teve uma segunda chance e não estragaria tudo. Viveu os últimos seis anos de sua vida como uma lagarta preguiçosa. Agora, estava pronta para sair de seu casulo e se tornar a borboleta que sempre deveria ter sido.

Freen podia ousar sonhar.

Onde mora o coraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora