Capítulo I - Volta

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630 quilômetros. 10 horas. Aproximadamente.
É o tempo que leva entre o meu presente e o meu passado.
O lugar do recomeço e o lugar do fim, respectivamente.






630 quilômetros e 10 horas pensando no porque eu decidi voltar, se eu poderia ter feito tudo remotamente, ou até mesmo ter enviado alguém no meu lugar.






A teimosia realmente é o meu ponto forte.





Dirigi o dia todo e não parei em nenhum momento, na doce ilusão de chegar o mais rápido possível no lugar aonde eu jurei nunca mais pisar.





A ilusão de resolver problemas rápido, eu mesma, do meu jeito — a teimosia.
Isso não existe. Tudo leva tempo. E um problema desse tamanho levaria muito, mas muito tempo.






Mas eu gosto do tempo. O tempo é rei.





Gosto que ele passa, até rápido demais às vezes.
Gosto que ele cura. E cura mesmo. Me curou.
Aquelas feridas que você acha que nunca vão sarar, ele vai fazer passar.
Mas gosto quando ele passa devagar também.
O tempo te faz pensar, refletir. Te faz amadurecer. Ele coloca tudo no lugar. Te mostra o que foi bom e te faz querer continuar a agir assim, e te mostra o que foi ruim te fazendo melhorar.






Melhorar.





Eu acredito que melhorei.





Será que ele também melhorou?





O tempo que me levou de Ilhéus foi o ruim.
O que me deixou em Linhares foi o que me curou.
O mesmo tempo, fazendo diferentes papéis.




Então porque eu estou voltando para o ruim? Dando para mim mesma a desculpa mais esfarrapada que existe no mundo: "são negócios."?





Mas são negócios. Um erro de cálculo, não meu, que me levou muito dinheiro. Um desfalque que deu para sentir na alma, que me fará perder uma de minhas fazendas. 





Eu venho de uma longa linhagem de negócios do café. É o que a minha família sempre fez, é o que mais sabemos fazer.
Cresci vendo meu pai e meu avô envolvidos nessa indústria, e desde pequena foi o que eu quis fazer também.
O trabalho na terra me fascinava, desde a plantação das sementes até a época da colheita. Era sempre uma festa.
Quando não estava presa no escritório, eu gostava mesmo era de estar com os trabalhadores no campo, no meio do sol, com os pés no chão sentindo a terra por entre meus dedos, colhendo o café junto com eles.





Saí de Ilhéus e fui estudar em Salvador, me especializando em todas as áreas possíveis para continuar com o legado da família.
Filha única e sem irmãos, tudo estava em minhas mãos.






E foi lá também que conheci um homem, com quem me casei antes de voltar para casa. Foi uma surpresa para minha família, uma surpresa boa.
Todos os anos que passei fora de casa foram no único intuito de estudar, de me aprimorar, me profissionalizar. Claro que eu tive namoros rápidos, romances curtos, mas um casamento ninguém esperava, nem eu.
Mas tive a sorte de ter tido pais compreensíveis, que sempre deram liberdade para minhas escolhas, e confiavam nelas. Foi isso que me deu coragem a vida toda para encarar tudo de frente, mesmo que depois desse errado, como deu. Um apoio, um ombro amigo para chorar, um abraço carinhoso para confortar, sacudir a poeira e dar a volta por cima, se levantando e começando tudo de novo. A felicidade plena foi o que eu sempre busquei.






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