Capítulo XII - Provas de Amor

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Se é amor, tem desencontros. Tem?
Amar também, um contra o outro, e lutar sempre por esse amor que morre e reascende... Melhor.
Melhor?




Já faz uma semana que descobri toda a verdade.





Naquela noite, depois que saí da biblioteca, dormi no quarto de João. Carreguei meu filho porque ele seria o meu consolo. Não falei nada, apesar dele querer saber tudo. E João me confortou, dizendo que seja lá o que tiver acontecido ele estaria ao meu lado. A minha cabeça estava um turbilhão, mas as palavras dele me aliviaram pelo menos naquela noite. E quando João finalmente dormiu, eu chorei.





Eu não estava com raiva. Eu estava triste.
Essa é a importância de dizer a verdade. Uma mentira desse tamanho não pode te fazer bem, nem se o intuito dela for o seu bem.
Durante muito tempo eu senti raiva de Inocêncio, porque eu tentava entender os motivos dele e não chegava a lugar nenhum. Mas agora que sei de tudo, dentro de mim não tem nada mais além de tristeza.





Quando meu pai foi embora para Minas, ele começou a jogar. Foi isso o que Inocêncio me contou naquele dia.
O meu pai começou a frequentar festas, os eventos do agronegócio, e conheceu gente muito torpe. Fez "grandes amizades" e se perdeu ali.
No começo o que ele perdia era pouco, conseguia pagar com facilidade com seus lucros. E quando você ainda consegue sustentar os seus vícios isso não tem problema algum. O problema começa quando você não consegue parar.





A cada palavra de Inocêncio, meu coração se desfazia. E eu nem posso culpar meu pai por isso, porque vício é uma doença. E doença é doença.
E não existe nenhuma possibilidade de eu ter julgado o meu pai por isso, mas o que fez ele se calar foi a vergonha. Principalmente de mim.
Ele não contou à minha mãe para poupa-la, mas a mim foi por puro constrangimento.





Depois de acabar com toda a sua reserva pessoal, e de minha mãe também, ele começou a mexer na empresa.
Tirava uma pequena quantia daqui, outra dali, o que já era muito, para pagar as dividas de jogo.
Foi quando Inocêncio percebeu.
Nessa época João era pequeno, então eu não estava muito envolvida nos negócios.
E aí Inocêncio foi para Minas, dizendo que queria ver a produção com os próprios olhos, porque estava muito boa para ser verdade. E eu não desconfiei de nada, pelo contrário, senti até orgulho.
E o inferno começou na volta.
Mês após mês, o buraco na contabilidade era maior. Até chegar ao ponto de não ter mais dinheiro bruto para cobrir o déficit. E Inocêncio ralou muito até chegar a isso. E a única solução foi hipotecar a fazenda.  E como a de Minas era a que menos produzia, e a do Espírito Santo era a que eu mais me envolvia, a escolhida foi a da Bahia. A principal, a sede. E meu pai implorou para que eu não soubesse de nada. Ele sabia que mesmo eu gostando muito do Espírito Santo, a Bahia era a minha casa, o meu lar. Foi onde me apaixonei por tudo, e o que ele menos queria era que eu soubesse que poderia perder aquilo.
No começo Inocêncio relutou, queria me contar, porque ele sabia que eu entenderia, mas meu pai já estava totalmente perdido, como um doente em fase terminal, e o fez prometer que eu nunca saberia. Que seria capaz de tirar a própria vida se eu soubesse de alguma coisa. Que a maior felicidade e o maior orgulho da vida dele era eu. Que não suportaria que eu soubesse que ele estava acabando com o patrimônio da família e pior ainda, com o progresso que eu tinha feito, que ninguém fez antes. Que tudo ali era mérito meu. Do meu trabalho e do meu amor por aquilo.
E eu fui absorvendo tudo. Entendendo cada desencontro e cada desentendimento entre mim, Inocêncio, os negócios e o casamento.
E no final de tudo isso, o que mais me importava era o último.






Pelo menos agora eu sabia a verdade. Eu só precisava assimilar. E para ser muito sincera, eu entendi completamente toda a parte do vício, da doença, das dividas, da hipoteca e do silêncio de meu pai. O que me pegou mesmo foi Inocêncio não ter me falado nada. Mesmo sabendo o que ele disse a seguir, que se me contasse a verdade e me pedisse para que eu não falasse nada para meu pai, eu não ficaria quieta, e pode ser que o pior acontecesse, e eu jamais me perdoaria. O silêncio de Inocêncio me feriu. Mas ele estava certo.
Então temos um embate.
A mentira nunca tinha feito parte da minha vida e eu não sabia lidar.
Como eu perdoaria Inocêncio por ter mentido pra mim?
A cabeça entendia, mas o coração era carrasco.
E a maior ironia agora era justamente a fazenda de lá que tentávamos recuperar. E eu preocupada com a reação de Inocêncio porque foi a fazenda que ele mais trabalhou e que agora a solução era vender. E honestamente depois de saber de tudo isso que aconteceu, para mim era a melhor resolução.





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