08. Reconfortante, como cheiro de café em uma tarde de quinta-feira

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O livro em suas mãos era sua nova distração. Nunca foi muito de ler quando era mais novo, tinha coisas melhores para fazer, como assistir televisão e brincar com seus irmãos no quintal de sua casa. Porém, há alguns anos atrás assistir já não era mais uma opção pois quando foi morar com seu amigo, encontrou tudo na casa, menos uma televisão, e a única coisa que restou-lhe para se distrair foi alguns livros velhos que Taerae tinha jogado pela casa, não mentia dizendo que pegou apreciação pela leitura, entretanto era um ótimo passatempo e distraía sua mente enquanto seu amigo não parava um minuto em casa, sempre andando com seus amigos como se fossem os reis do mundo. Gyuvin achava até mesmo engraçado.

Romeu e Julieta nunca foi seu romance preferido, mas o final, sem dúvidas, é extasiante, e talvez torne mais interessante para si, e agora se tornou melhor ainda. Depois que quase teve seu nariz quebrado pela porta em sua cara, tentou chamar o garoto que vivia dentro da casa, mas apenas recebeu silêncio em troca, resolvendo voltar ao seu trabalho e tentar consertar isso quando as coisas estivessem mais calmas.

Parado, agora, no balcão da cozinha, fazendo a massa de seus famosos cupcakes, pensava numa forma de fazer Ricky pegar seu livro de volta, pois era pouco provável que Shen abrisse a porta sem bater em sua cara logo em seguida, não depois de sua fala nada desejável. Gyuvin não era culpado, ele escutava muito disso quando rapazes paqueram as mulheres que iam na cafeteria, e incrivelmente sempre parecia dar certo. Mas, Ricky não é uma mulher, e com certeza não gostou do provável flerte.

Olhou para o livro ao seu lado e novamente para a massa que estava fazendo, pensando que talvez não precisasse devolver pessoalmente e ainda conquistar o coração do pequeno Ricky com algo que todos gostam e ninguém rejeita: seus cupcakes, especialmente porque prestou muita atenção enquanto Gunwook conversava com ele no terrível dia que teve sua testa acertada por um livro — ainda dói —, e pensou que Shen pudesse gostar de seus bolinhos. Colocou um toque a mais de essência de baunilha, pois a casa do loiro o lembrava vagamente cheiro de baunilha, provável que fosse coisa de sua cabeça, mas olhar para Ricky o lembrava morangos frescos,seus preferidos. Poderia ser apenas o seu cérebro apaixonado tentando criar uma situação perfeita para o porquê Kim Gyuvin ter se apaixonado tão rapidamente, já que eles nunca se falaram de forma civilizada ou se conhecem tão profundamente para despertar tais sentimentos. Gyuvin só sabia que sentia, e queria entender o motivo de tudo aquilo, queria conhecer Ricky e desencantar, ou se encantar mais ainda com cada descoberta.

Já sabia que o loiro gostava de livros pesados, músicas românticas de discoteca, não gostava de sair nem de socializar, percebendo bem seus atos quando se encontraram, e quase certeza de que ele gostava de seus bolinhos recheados.

Se empenhou para fazer os melhores bolinhos de sua vida, colocando toda gota de amor presente em seu corpo, criando várias situações em sua cabeça, a maioria utópica, onde eles se apaixonam tão perdidamente quanto Romeu e Julieta, porém sem a parte trágica do final, queria uma final feliz para a sua pobre vida miserável, nem que terminasse com ele preso junto ao loiro naquela casinha minúscula que cheira a baunilha — o que é realmente a paixão de Gyuvin, pois o único aroma que aquela casa exala é de café. Mas, Gyuvin gosta de perfumes doces.

Terminou de decorar os cupcakes para a venda, colocando no balcão quase vazio. Sorriu para as pessoas que foram em sua direção e pegaram os bolinhos, acenou para a senhora Min, que foi retribuído por um sorriso fofo da senhora com as bochechas cheias. Era a maior fã de qualquer um de seus doces.

Voltou para a cozinha, começando a decorar o bolinho especial, colocando bastante recheio de geleia de morango e gotinhas de chocolate, fechando-o e fazendo um perfeito traço com o chantilly, jogando granulados coloridos e sorrindo ao perceber sua nova obra prima.

Pegou o livro e o pequeno bolo, indo com toda sua coragem até a parte de trás do estabelecimento, sendo parado por um nanico com a feição curiosa e desconfiada. Rapidamente colocou seu melhor sorriso no rosto, no caso de amolecer o duro coração de Park.

— Posso saber aonde pretende ir? — Pergunta, cruzando os braços.

Gyuvin revira os olhos discretamente.

— Vou ler e comer um bolinho! — Ergueu os itens em suas mãos, balançando-os levemente.

Gunwook semicerrou os olhos, como se não acreditassem realmente em suas palavras e sua forma nervosa de mentir.

— O que quer que esteja fazendo, Gyuvin, apenas pare! É tempo perdido, eu sei exatamente como é. — Maneou levemente a cabeça, sorrindo fraco.

Bateu levemente nos ombros de Gyuvin, o deixando confuso tanto com a sua fala quanto com sua atitude. Park não costuma ser muito gentil em suas palavras, e quando as disse pareceu realmente sincero.

Sem tempo para criar histórias em sua cabeça, Gyuvin ignorou e abriu a porta dos fundos, tendo acesso à aquele beco esquisito que o trazia péssimas memórias de tempos atrás.

Assim que chegou em frente a porta, deixou o livro no tapete e em cima o cupcake colorido e perfeitamente feito. Bateu na porta três vezes e desceu correndo em seguida, entrando novamente na cozinha, sem a mínima coragem para ver se ele tinha atendido e pegou sua entrega.

Gyuvin se sentia levemente ansioso, e bastante nervoso, e quando viu o senhor Park carregando uma bandeja olhando para ele com curiosidade, só pôde se recompor e acenar com as mãos.

— Se eu não o conhecesse bem diria que está aprontando, mocinho. — O mais velho riu, e nervosamente, Kim o acompanhou.

— Jamais, Doyoung-hyung!

— Vá para casa, filho, Gunwook pode dar conta do resto.

O homem deu mais uma risada e saiu para a sua sala, levando a bandeja com vários tipos de pães, provavelmente comeria todos.

Gyuvin rapidamente tirou seu avental roxo com estrelinhas e colocou no gancho, pegou suas chaves e saiu da cozinha, passando e acenando para os clientes conhecidos, e para Gunwook, que o encarou com pouco caso, rolando os olhos e jogando um prato vazio na bandeja. Geralmente os clientes gostam mais da gentileza de Kim.

Quando Ricky abriu a porta, preparando-se para quem quer que fosse na sua casa, porém ao abrir não se deparou com ninguém, e sim com um cupcake e o seu livro, que pensará durante a noite toda que deveria ter pedido seu livro antes de bater a porta na cara do abusado do dia anterior. Sorriu levemente ao ver o bolinho dentro de um copinho roxo com estrelinhas amarelas, abraçou seu livro e o colocou em sua pequena mesa na sala.

Encarou o bolinho, se perguntando se deveria comer aquilo que um desconhecido deixou em sua porta, aprendeu a ser muito desconfiado ao decorrer de sua vida, e agora se perguntava se havia qualquer tipo de veneno no doce. Resolveu deixar em cima do balcão, em sua cozinha.

Percebeu que o Sol já estava se pondo, sorriu minimamente, indo até sua varanda, e respirando fundo o cheiro de pão fresco do comércio abaixo. Essa era a melhor parte de se morar em cima de uma padaria, o cheiro era sempre acolhedor.

Passou a olhar as pessoas andando nas ruas, algumas crianças brincando no parque à frente, e um garoto olhando para si. Se assustou ao perceber uma cabeça erguida em sua direção, logo reconhecendo os cabelos pretos de outras ocasiões. O moreno ao perceber que Ricky olhava para ele, andou para trás e tropeçou em dos mínimos degraus das escadas, não caindo por muito pouco.

Ricky sorriu de forma leviana, pensando que, caso realmente tivesse veneno em seus bolinhos, seriam gotas de Feniletilamina.

Shen percebeu o que estava acontecendo ali, mas sabia que um projeto de The Smiths jamais seria alguém perfeito para si. Talvez ninguém realmente fosse.

1982 AnalogiasOnde histórias criam vida. Descubra agora