Lauren nunca foi uma mulher doméstica. Não cozinhava muito bem, na realidade, não tinha muita destreza de usar facas ou cozinhar alimentos usando mais de duas panelas sem fazer uma lambança, ou queimar alguma coisa. Ela tentava, apenas não era boa e também não gostava muito. Sobrevivia basicamente de aplicativos de comida, e por mais que quisesse mudar, não seria naquele dia, pois, ao invés de ir para o supermercado e comprar suprimentos para o primeiro mês de vida em sua nova casa, a escritora seguia para a melhor — segundo o site de pesquisa — livraria de Niterói. Quando Lauren chegou lá, ficou aliviada, pois o local se encontrava vazio. Ela estacionou o seu carro na apertada rua, há alguns metros de distância da fachada da livraria. Ao sair do carro, escorregou os óculos escuros para cima de sua cabeça e retirou os de grau do decote de sua blusa social de botões. Estava calor e a escritora já sentia o começo da fina camada de umidade nascendo em sua nuca, levaria algum tempo até se acostumar com a vestimenta de um país quente como o Brasil. Adicionava o fato de que, em todo, não gostava de mostrar muito o seu corpo, mesmo tendo um corpo cheio de curvas, como era de se esperar de uma brasileira. Olhou para o exterior do estabelecimento e o achou charmoso, aprazível, aquele tipo de ambiente que tinha o potencial de se sentir bem dentro dele. Ele era composto por reproduções de quatro pilares romanos e janelas de vidros, formando duas vitrines, contendo recém lançamentos e best-sellers do momento. Lauren ainda se lembrava da primeira vez que viu os seus livros expostos para todos que passavam pela rua. Recordou-se da sensação de orgulho e do beijo na bochecha que recebeu da esposa, na manhã fria de um inverno castigador de Londres. Julgava, em seus pensamentos, que, talvez, esse era o sonho de todo autor. Estar em evidência, com livros empilhados um sobre os outros, formando pirâmides ou desenhos geométricos, que os vendedores sempre faziam para chamar atenção. Entre as vitrines, e logo acima das portas de vidro, uma placa em forma de um pergaminho gigante desenrolado estava escrito em letras elegantes e cursivas o nome da livraria: "Biblioteca de Alexandria". A escritora sorriu ao nome, ignorando as pessoas que se desviavam dela na calçada. Quando abriu a porta da livraria, o sininho que ficava no canto superior da porta tocou. Lauren olhou em volta e viu que o interior era misteriosamente um organizado desorganizado. A livraria continha prateleiras que preenchiam todas as paredes, elas estavam lotadas de livros empoleirados e espremidos, um ao lado do outro. A impressão era de que a qualquer momento eles quicariam para fora, devido à grande quantidade de lombadas que disputavam lugares. Certamente, lutando para serem compradas o mais rápido possível e serem libertas do aperto. Distribuídos ao centro da loja, estantes compridas e baixas exibiam mais livros, assim como os da vitrine de lançamentos. Nos fundos da loja, logo abaixo de um mezanino, quatro estantes tão altas quanto as prateleiras, guardavam mais livros, formando um pequeno corredor, acolhedor e mais escuro. A escada de ferro na outra extremidade da livraria, ligava ao pequeno e charmoso bistrô que a Biblioteca de Alexandria oferecia. Já à esquerda da entrada da livraria, havia o caixa, com dois atendentes que finalizavam as compras dos leitores ávidos ou aqueles que começavam a adquirir o gosto pela leitura. Lauren andou um pouco incerta pela loja, à procura de algo que pudesse chamar a sua atenção, livros que serviriam para inspiração, talvez alguns romances sáficos, ou até mesmo livros de terror, ou suspense. Ler algo totalmente contrário do que iria escrever a ajudava e mesmo pegando alguns livros na estante longa, virando-os para ler a sinopse, nada parecia puxá-la para dentro do romance. Decepcionada. "Afinal, não era essa a melhor livraria de Niterói?"
Caminhou para o corredor das estantes, até que entre uma e outra, algo lhe chamou sua atenção. "uma morena de pele bronzeada". Seu cabelo castanho estavam presos em um coque que deixava soltos vários fios rebeldes. Enquanto segurava livros em sua mão direita e com grande dificuldade tentava colocar um deles no apertado espaço das prateleiras. Lauren olhou para trás, e voltou os seus olhos para funcionária, ao menos considerou que a mulher trabalhava ali, já que vestia um avental mostarda, o mesmo que os dois rapazes do caixa usavam. Talvez, ela pudesse ajudar a escritora. Procurar bons livros de terror, seria através da tensão que acharia inspiração para escrever o seu novo romance sáfico erótico. — Olá? — Foi o primeiro contato de voz não tão firme que Lauren usou, aparentemente, não foi o suficiente para que a mulher a ouvisse. — Oi? — Limpou a garganta. Nada. Lauren colocou a mão na lateral do pescoço e apertou, de repente, sentindo-se exposta por estar falando sozinha. Novamente, procurou qualquer outra pessoa que pudesse estar por perto e não encontrou, era melhor assim, pouparia a humilhação pública de estar sendo ignorada. — Oi! — disse firme, e com tom de impaciência. Finalmente, a mulher de cabelo castanho virou para Lauren. Ela arfou em susto e seus olhos cor de chocolate, encararam aturdidos os opacos de uma noite fria da escritora. Tomou um passo para trás em supetão, pisando no ar e se desequilibrou. Os livros foram os primeiros a encontrar o piso branco e lustroso, ela seria a próxima, mas Lauren se adiantou, e antes que a funcionária pudesse encontrar o chão, os braços firmes da escritora seguraram a cintura da mulher. As duas se olharam por um instante. Lauren sorveu a beleza de seus olhos de chocolate, pele bronzeada, lábios carnudos, contrastavam com a cor de sua pele. Sensações foram duas: primeiro, decidiu que sua protagonista teria a beleza dessa mulher e segundo, assim que percebeu que ela estava segura, soltou-a rapidamente, afastando-se, até que suas costas batessem contra os livros apertados da outra estante. — Não quis te assustar — disse Lauren, um pouco sem graça. — Não, tudo bem... Eu estava distraída, desculpa. — A funcionária se agachou para recolher os livros. — Eu posso te ajudar em alguma coisa? — indagou, ao levantar a cabeça por um momento, antes de finalmente se colocar de pé. Lauren era um pouco mais alta do que ela. Baixando os olhos, a escritora pegou o vislumbre do nome da funcionária no crachá preso em uma fita com as cores do arco-íris adornando seu pescoço. Camila. — Estou procurando livros de terror, suspense, talvez um romance lésbico. Tentei procurar, os de terror, mas não encontrei. — Entendo, é porque eles ficam mais escondidos, me segue que eu te mostro. — Com os livros em mãos, Camila saiu do apertado corredor e se esgueirou no próximo, e Lauren fez o pedido. — A livraria está arrumada em gêneros, ao menos a gente tenta, às vezes um livro escapa de seu lugar — contou Camila, como se eles tivessem vida própria, a escritora achou ouvir aquilo engraçado, pois, imaginou os livros criando perninhas e, com dificuldade, escalar as prateleiras, enfiando-se nos apertados espaços, com o único propósito de confundir os funcionários. — Algum autor em específico? — perguntou. — Não, acho que não. Não pensei sobre isso — respondeu Lauren, olhando Camila mais uma vez. Vestia uma calça jeans preta, coturnos, e uma camiseta listrada, branca e preta, seus ombros e braços tinham mais sardas. — Caso você se perca, há plaquinhas avisando os gêneros ali em cima — explicou Camila, ao apontar com o dedo para a última prateleira de cada estante, e uma pequena plaquinha com o nome do gênero escrito em letras garrafais pôde ser vista. — Elas são bem pequenas, eu sei. Há também a possibilidade de você não encontrar o livro, ou passar despercebido pelos seus olhos. Ai, você pode me chamar que eu procuro no sistema, eu sei que disse que não sabe o que está procurando, mas talvez, você se lembre de algo. Lauren se virou para a estante e seus dedos passaram pelas lombadas de diferentes tamanhos e cores. — Obrigada, Camila — agradeceu a escritora, ao virar a cabeça e ofereceu um pequeno sorriso para a funcionária. As bochechas ficaram ainda mais rubras e com um leve cumprimentar, Camila saiu de perto. Alguns minutos se passaram, e Lauren estava completamente emergida nas sinopses e nas capas dos livros. Sentia um pouco de dificuldade de retirá-los das prateleiras e era ainda mais irritante ter que colocá-los de volta. Seus olhos já ardiam um pouco, mas seu ímpeto de procurar algo que pudesse fazer sentido para ela naquele momento continuou dentro de si, e quando se deu conta, já estava com três livros em suas mãos. Agachada, sentiu um arrepio navegando por sua espinha e quando olhou para o lado. Viu Camila com a ponta da unha de seu opositor na boca. Os olhos de chocolate a olhavam, e quando foi pega no flagra, voltou a organizar os livros da estante do outro lado do corredor, ou ao menos pretendendo. Lauren se levantou e esperou alguns segundos, fingindo estar distraída com a capa dura do livro que havia acabado de decidir que o levaria. Novamente olhou para Camila e, mais uma vez, ela estava lá, com os olhos atentos, um pouco mais próxima. — Tá tudo bem? — É... Tá... Desculpa... — Camila falou com a timidez carregada em sua voz. Ela se aproximou um pouco mais, segurando seu crachá em aparente sinal de tensão. — Você não me é estranha. A situação era estranha, sim. Lauren duvidou que a conhecesse, havia saído há dez anos do Brasil, Camila não parecia ter muito mais do que trinta anos. Nunca havia se relacionado com mulheres mais jovens, na realidade, todas as namoradas da escritora foram mais velhas, sem contar que achava difícil Camila e ela ter o mesmo ciclo de amizade. — Eu não estou lembrada de você... — Não, não é isso. — Camila balançou a cabeça em negativo. Atravessou o corredor principal, colocou-se frente a frente com Lauren, inclinou-se mais um pouco, deixando a escritora um pouco nervosa pela aproximação. — Você é Lauren Jauregui, não é?! — exclamou a funcionária, antes de encolher os ombros e colocar as mãos na frente da boca. Como se estivesse pedindo desculpas pela falta de educação. Lauren esquecia que era uma autora reconhecida. — Isso... — sussurrou a escritora. — Eu gosto muito dos seus livros, eu sei que você deve ter ouvido isso de outras pessoas trocentas vezes. — Ela rodou os olhos e fez uma careta, debochando de sua própria fala. Voltou os seus olhos para os verdes de Lauren e tentou transmitir sua satisfação por estar diante dela. — Mas eu realmente admiro o seu trabalho. Muito. — Um tom mais sério foi usado, com a vontade de mostrar confiança em sua fala. — Obrigada. É bom ouvir isso. E realmente era. Sorriu, e foi um ato genuíno. — Você se importa de autografar um livro para mim depois? — Camila pediu um pouco sem graça. — Tudo bem se você não puder, eu sei que deve ser um saco ter que- Lauren levantou a mão para cima, silenciando a funcionária no mesmo instante. — Claro que não. Eu já estava indo pagar, se você tiver algum livro meu aqui na livraria, eu faço uma dedicatória. — Lauren respondeu educadamente. Um sorriso gigantesco foi aberto nos lábios de Camila, e a escritora o observou com um certo contentamento. Era bela a mulher com quem falava. Camila pegou os livros da mão de Lauren e as duas foram para o caixa. Deixando os exemplares em cima do balcão de madeira, afastou-se novamente. Observou o rapaz apanhar os livros e fazer o ritual monótono de seu serviço, mas que para os olhos da escritora era algo fantástico de se descrever. Ele virava os livros, antes de apanhar o leitor de código de barras que parecia uma pequena pistola emitindo uma luz vermelha, e após, um apito fino e curto, levava-os para dentro da sacola. Essa mesma função foi realizada três vezes. Tinha ali um de suspense, um de terror e um erótico lésbico, e foi apenas quando Lauren pagou a conta, que Camila surgiu. Camila retirou a caneta do bolso do avental, pegou o livro e soltou o comentário: — Você é a minha escritora predileta. Foi a minha melhor companhia em um dos momentos mais difíceis da minha vida. Nunca pensei em te encontrar aqui, do nada. Acho que estou com sorte, estou precisando um pouco disso. Lauren estava fragilizada, e mesmo ouvindo isso inúmeras vezes, a fala vinda dos lábios de Camila, a fez ter um estranho formigar em sua nuca. Estava tão carente e tão confusa que qualquer tipo de elogiado, tinha vontade tremenda de chorar, se sentia vulnerável. Ela não sabia mais se comportar. Os anos de terapia de repente não apreciam ter valido de nada. Abriu o livro e na contracapa começou sua típica dedicatória genérica, sem muita emoção, mas o suficiente para os leitores não se sentirem preteridos. Sinceramente, ela era uma farsa como autora, contudo, quando encostou a caneta na página, sua mão tomou liberdade de escrever algo totalmente diferente do que sempre escrevia. Entregou o livro para Camila e olhou, quando a funcionária o levou contra o peito, abraçando-o. De repente, o que escreveu ali dentro pareceu certo. — Obrigada! — agradeceu a mulher de cabelo castanhos. — Se você soubesse o quanto isso é significativo para mim. Lauren queria saber, mas não tinha coragem de perguntar. Mais do que nunca, desejava voltar para casa, mas estava compelida a ficar mais um pouco e observar a excêntrica e faladeira funcionária da Biblioteca de Alexandria, mas estava se sentindo por demasiada exposta. — É um prazer, Camila. E assim, se virou. Lauren saiu da loja, colocou a mão no bolso para pegar a chave do carro e junto com ele, puxou o cartão dado por Mani na noite anterior. Talvez, ela pudesse realmente usar os serviços, assim, estaria mais preparada para lidar com flertes e, principalmente, saber socializar na frente de mulheres bonitas. Ela não queria ser mais o que estava sendo, e decidiu se arriscar. Não desejava mais se sentir um ser diferente dos outros, descolada e presa em uma realidade onde a aproximação lhe assustava. Ter alguém que pudesse ensiná-la isso novamente seria bom. Pagar alguém para isso é melhor ainda. Assim, evitaria passar vergonha. Não queria ser humilhada. Lauren já tinha sua cota de emoções ruins dentro de si, não aguentaria mais uma. Atravessou a rua, entrou no carro, jogou a sacola no banco de carona e com o seu celular na mão, digitou o número do cartão. Três toques foram o suficiente. — Paraíso Éden, sou Demi Lovato, no que posso ajudá-la?
VOCÊ ESTÁ LENDO
Desejo Proibido
DragosteLauren Jauregui uma escritora renomada, retorna ao Brasil em busca de um recomeço após a perda de sua esposa. Ela conhece a jovem Camila Cabello acompanhante de luxo especializada em mulheres. O que começou com um simples contrato entre cliente e a...