09. Lembranças

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Acordei, e já passavam das 9:00 da manhã.
Minha cabeça doía um pouco, e as lembranças da noite anterior ainda estavam vívidas. Eu precisava entender o que estava acontecendo, o que significavam esses eventos que eu estava vivenciando. Mas com quem eu dividiria tais coisas sem ser taxada de louca? E onde eu iniciaria minhas pesquisas?
Por mais que eu não quisesse aceitar, algo estava acontecendo! E não adiantaria nada eu continuar negando isso.
Olho em direção ao espelho e decido que o pano ficará ali até eu me livrar dele.

Levanto-me, vou ao banheiro, faço minha higiene e sigo para a cozinha. Sobre a mesa, encontro um bilhete da minha mãe.

《 Estou indo para a casa das suas tias para ajudar na mudança. Não demore, prometi que nós as ajudaríamos. 》

Solto o bilhete sem ânimo. Por que as pessoas prometem coisas pelos outros? Quem disse que eu quero ajudar? Suspiro cansada e vou preparar meu café da manhã.
Hummm... Se existe coisa melhor que panquecas com calda de morango, eu desconheço.
Quando termino, vou para a casa das duas bruacas. Por alguma razão, as irmãs do meu pai não gostam de mim, e desde que me lembro, elas me tratam com indiferença.

Sigo para a casa delas pensando no pesadelo que tive. Será que encontro alguma coisa sobre pesadelos e essas experiências que estou tendo em algum livro? Nunca vi nada relacionado a isso na biblioteca.
De repente, um estalo na mente.

- O antiquário! Lá tem muitos livros antigos - penso alto.

Na segunda-feira vou lá. A menina de cabelos roxos deve poder me ajudar com algo, ou me indicar algum livro.

Ao chegar na casa das minhas tias, vejo uma bagunça total: caixas por todo lado, móveis desmontados, pilhas de louças para serem embaladas. Minha vontade era ir embora.

- Finalmente você chegou Tália. Se demorasse mais um pouco, não teria mais nada pra fazer - disse tia Lidiane.

- Desculpe tia, eu não dormi bem essa noite.

- Sei, como sempre dando desculpas. Deixe de conversa e vá lá no quarto arrumar umas caixas que a Letícia tirou do guarda-roupas. Tem livros, documentos, contas. Separe tudo o que for importante e jogue fora o que for inútil. Depois, volte aqui e embale as porcelanas com folhas de jornal e coloque nas caixas.

- Claro, tia.

Quando entro no quarto, vejo caixas e mais caixas de papéis. A vontade de xingar aquelas duas está na ponta da língua.
Começo a organizar as pilhas de papéis; a maioria vai pro lixo. Qual a necessidade de juntar tanta coisa velha?
O cheiro de poeira e papel velho impregna o ar. Estou na última caixa e algo me chama a atenção! No fundo da caixa, tem uma pasta preta com meu nome escrito. Eu a pego, e quando abro, encontro jornais velhos, alguns documentos e uma foto minha de quando era bebê. Mas o que é tudo isso?

Eu me sento no chão e começo a ler as linhas amareladas do jornal.

MENINA DE APROXIMADAMENTE UM ANO É ENCONTRADA ÀS MARGENS DO RIO AMAZONAS.

Uma menina que aparenta ter menos de um ano, foi encontrada às margens do rio Amazonas. Ainda não temos informações sobre o paradeiro dos pais. Indígenas da região teriam ouvido o choro do bebê, e assim o resgataram dos perigos da floresta.

Outra matéria:

BEBÊ ENCONTRADO ÀS MARGENS DO RIO AMAZONAS ESTÁ SENDO ASSOCIADO A LENDAS E MITOS INDÍGENAS.

A menina de aproximadamente 1 ano que foi encontrada às margens do rio está gerando um alvoroço na região. As autoridades competentes tiveram trabalho para retirar a menina da tribo que a encontrou.
Segundo informações, o pajé da tribo relata que a menina foi um presente do espírito das águas, entregue a ele para protegê-la das serpentes de fogo.
Quando questionado sobre suas falas, o pajé respondeu que a voz das águas disse a ele que a menina era o elo que separa e une os dois mundos. E se o mal entrar todos sofrerão.

Outra matéria:

INVESTIGAÇÕES NÃO ACHAM QUALQUER PISTA SOBRE O PARADEIRO DOS PAIS DA PEQUENA CRIANÇA ENCONTRADA ÀS MARGENS DO RIO.

Depois de semanas de investigações, ainda não se sabe o paradeiro dos pais da pequena menina encontrada às margens do rio. As tribos da região estão chamando a menina de Amanaci (Deusa da Chuva) e pedem que ela seja devolvida, pois a voz das águas pediu para que ela fosse cuidada por eles.
A assistência social, no entanto, diz que já há candidatos para a adoção e que logo a pequena terá um lar com muita atenção e cuidado.

Outra matéria:

CASAL QUE PERDEU FILHA E NÃO PODE MAIS GERAR, ADOTA A PEQUENA AMANACI.

Um casal que já estava na fila de adoção há um tempo conseguiu finalmente a chance de fazer a família crescer. A pequena ganhou um lar, e os pais, que são baianos, mas moravam aqui na região a algum tempo, irão voltar para sua terra natal.
Segundo o casal, a atenção que a pequena recebeu e vem recebendo pode ser prejudicial nesse momento tão delicado de adaptação.

Eu olhava para os papeis sem acreditar. Eu sou adotada? Meus olhos se encheram de lágrimas, e eu não fiz força para segurar.
De repente a porta se abre e vejo tia Lidiane, quase sem fôlego e com os olhos arregalados me encarando. Deve ter se lembrado que haviam mais que papéis velhos nas caixas que me mandou arrumar.

Caminho dos Sonhos- A Terra SecretaOnde histórias criam vida. Descubra agora