Minha tia me olhou, a boca dela se abriu e fechou algumas vezes. Acho que estava tentando achar as palavras.
– Tália, eu sinto muito por você ter descoberto dessa forma – disse tia Lidiane.
– Sente mesmo, tia? A senhora nunca se importou comigo. Acho que agora já tenho uma noção do motivo.
– Olha, Tália, eu realmente não queria que você descobrisse assim. Apesar de não considerar você como minha sobrinha, eu não desgosto de você. Você é uma criança como qualquer outra. – disse tia Lidiane.
– A senhora não gosta de mim só porque sou adotada?
– Você entrou nessa família para tapar um buraco que não podia ser preenchido. Sua adoção foi um erro. Letícia e eu tentamos conversar com seus pais, mas eles estavam decididos a ter uma criança para alegrar a casa. Mas, para mim, Tália, olhar para você, especialmente quando você era pequena, era sinônimo de dor.
– Por quê? O que eu fiz para a senhora?
– Essa história não é minha, não tenho o direito de contar. Sua mãe já deve estar voltando, ela foi acompanhar o caminhão de mudanças para o novo endereço. Quando ela voltar, converse com ela. Afinal, você só está aqui por causa dela. Ela fez tanta questão que conseguiu enfiar uma criança que não tem nosso sangue dentro de casa. - Disse tia Lidiane
Eu olhava para minha tia, e as lágrimas desciam. Ser adotada não era o problema, o problema era descobrir que até agora eu estava vivendo uma mentira. Eu não sabia nem a minha origem. E ouvir que fui um "tapa-buraco" em uma família me fez sentir tão pequena.
– O que está acontecendo aqui? – perguntou tia Letícia, entrando no quarto.
– Ela achou as reportagens sobre a adoção – respondeu tia Lidiane.
– Não sei por que guardou esses documentos. Como se pudesse mudar alguma coisa – disse tia Letícia, olhando para a irmã.
Então prosseguiu falando:
– Tália, você já está crescida, perto dos 14 anos, já pode mesmo saber de tudo. Você só está nessa família por insistência da sua mãe. Acho que até ela se arrependeu depois de ter feito essa burrada, trazendo uma criança sem procedência para nossa família – disse tia Letícia.
Aquelas palavras me atingiram como lava, queimando por onde passava. Eu fui uma burrada na vida dos meus pais?
– Procedência? Eu sou o quê, um cachorro? – respondi à minha tia.
– Daria menos trabalho e não ocuparia um lugar que não é seu se fosse. Sua mãe tentou por muito tempo engravidar, mas nunca conseguia...
– Letícia! Deixa a mãe dela contar isso – interrompeu tia Lidiane.
– Qual o problema? A história será a mesma. Como eu dizia... Na última tentativa, ela conseguiu levar a gravidez adiante. O bebê nasceu, a coisa mais linda. Nossa menina, Vitória. Mas, a saúde dela sempre foi frágil, e mesmo com todo nosso zelo, ela pegou pneumonia e nosso anjinho nos deixou.
Minha tia me olhava com tanta dor, e acho que até com raiva, como se eu fosse culpada por aquela tragédia que contava.
– Sua mãe entrou em um processo depressivo, e parecia que nada poderia curar aquele buraco na alma dela. Seu pai... ah, nosso irmão... ele sempre sonhou em ser pai. E naquele momento, ele havia perdido o mundo dele.
Meu coração estava tão apertado, retumbava no meu peito como se quisesse fugir.
Tia Letícia continuou:
– Depois de alguns meses, sua mãe procurou novamente a médica para tentar uma nova inseminação. Mas ali ela descobriu que não poderia mais gerar, pois o risco seria grande. Ela quase morreu de tristeza. Vendo Marcela naquele estado, meu irmão teve a brilhante ideia de adotar. A partir daí, eles começaram a buscar uma criança – contou tia Letícia.
– Onde já se viu? Querer substituir uma criança que foi desejada e amada por uma que nem sequer sabemos de onde veio. Nossa Vitória nunca deveria ter sido esquecida. E foi isso que você fez, apagou Vitória da vida dos seus pais – disse tia Lidiane.
Eu escutava aquilo sem acreditar. Elas me culpam por achar que ocupo um lugar que não deveria ser meu? É isso?
– Vocês têm um coração horrível! EU NÃO PEDI PARA SER ADOTADA, NEM PARA OCUPAR O LUGAR DE NINGUÉM! – gritei em meio aos soluços de choro.
– Sempre ingrata. Você deveria agradecer pelo lugar que ocupa. Era para ter crescido no meio do mato. Combina com você, afinal, sempre foi uma selvagem ingrata – disse tia Letícia.
– Mas o que está acontecendo aqui? – perguntou minha mãe ao entrar no quarto.
Olhei para a mulher na porta, minha mãe. Queria falar tanta coisa, entender por que ela nunca me contou. Será que ela se arrependia de me adotar, e por isso nunca estava em casa? Eram tantas perguntas.
Eu simplesmente caminhei em sua direção, entreguei os papéis em suas mãos e saí dali. Minha cabeça doía, e minha mente não queria mais estar ali. Saí correndo para casa, as lágrimas desciam quentes pelo meu rosto. Agora eu não tinha mais certeza de nada sobre mim.
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Caminho dos Sonhos- A Terra Secreta
FantasyOlá querido leitor... Eu me chamo Tália, e estou aqui para contar a minha história. Você encontrará nas linhas a seguir muito drama, aventura, suspense , um pouco de terror e ódio e também amor . Afinal de contas é assim que se desenrola a vida . ...