21. O Ritual

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Eu me acomodei no chão da cabana, cruzando as pernas e observando Alexis com atenção enquanto ela colocava uma série de objetos no centro da pequena fogueira que havíamos feito. O calor leve do fogo nos cercava, e meu coração batia mais rápido pela expectativa.

— Sabe — disse Alexis, com a voz suave, mas com a gravidade de quem está prestes a revelar algo importante —, talvez o rio de prata que você vê nos seus sonhos não seja apenas uma visão aleatória. Pode ser um caminho... o caminho para a terra-mãe de onde você veio, ele está marcado em você,  sempre que faço a leitura da sua mão,  ele está lá. Então ele é uma peça importante.

Ela me olhou, e vi nos olhos dela a mesma esperança que às vezes, eu tentava abafar em mim mesma.

— Talvez... — Suspirei, encarando as chamas. — Mas eu não controlo para onde os sonhos me levam Alexis. Eles vêm e vão como querem, como se não fossem meus. Como se fosse outra força a guiar o que vejo.

Alexis deu um sorriso misterioso, aquele que ela sempre dava quando estava prestes a revelar algo de suas pesquisas místicas. Seu interesse pelas artes ocultas era uma constante em sua vida, e eu sabia que ela passava horas lendo, estudando, sempre em busca de novas maneiras de entender e manipular o que não podíamos ver.

— E se tentássemos controlar isso? — Ela sugeriu, com o olhar firme em mim.
— Podemos fazer um ritual, algo que direcione seus pensamentos e que te ajude a mergulhar no sonho de propósito, como uma porta que você abre.

— Um ritual? — Eu a encarei com ceticismo, mas também com curiosidade. — Com o quê? O que usaríamos?

— As ervas e pedras sagradas dos Iruá — ela respondeu com naturalidade, como se isso fosse a coisa mais óbvia do mundo. — Eles acreditam que essas coisas possuem poder, certo? Vamos utilizar isso a nosso favor. As pedras canalizam energia, as ervas abrem a mente... E o fogo, bem, o fogo é a força transformadora. Não é só sobre o que você sonha Tália, é sobre como chegamos lá.

A ideia dela começou a tomar forma na minha cabeça. Talvez houvesse mesmo uma maneira de encontrar o que eu precisava saber, uma forma de guiar os sonhos para que eles me mostrassem o caminho certo. Meus pensamentos correram rapidamente, já visualizando a cena. Alexis sempre soube mais sobre esses mistérios do que eu, então se ela acreditava que isso poderia funcionar, quem era eu para duvidar?

Começamos a preparar o ambiente. Alexis colocou as ervas secas em torno do fogo, suas mãos se movendo com familiaridade sobre os ramos de cheiro forte. Peguei as pedras sagradas que os Iruá haviam nos dado, sentindo o peso delas em minhas mãos antes de entregá-las a Alexis, que as posicionou em um círculo ao nosso redor. As pedras pareciam vibrar, como se estivessem respondendo à intenção que estávamos colocando naquele momento.

— Agora, respire fundo — ela disse, sua voz baixa, quase um sussurro. — Deixe o som do fogo te guiar, deixe a fumaça te envolver, e quando eu começar a cantar, você se concentrará no rio de prata. Não tente lutar contra o sonho Tália. Apenas o siga.

Fechei os olhos e fiz o que ela mandou, tentando deixar minha mente livre, tentando me abrir para o que viesse. A voz de Alexis, suave e melódica, começou a entoar um cântico antigo que eu não reconhecia. As ervas queimaram, liberando uma fumaça densa e aromática que encheu o ar ao nosso redor. As pedras, o fogo, a fumaça... tudo começou a se misturar em minha mente.

Eu me senti flutuando, como se a gravidade não me prendesse mais ao chão, e então, de repente, luzes brilharam ao meu redor...

O sonho começou suave, como se eu estivesse flutuando entre as estrelas. Era uma sensação familiar, mas também misteriosa. Ao meu redor, o mundo parecia mudar de cor, os sons se dissipavam até que só restasse um silêncio acolhedor. Aos poucos, me vi sendo guiada para um lugar diferente, e então eu estava ali, à beira do rio de prata mais uma vez. O reflexo das águas brilhava de forma surreal, mas desta vez, algo era diferente. Eu sabia que não estava apenas sonhando. Eu sabia que Alexis estava comigo, mesmo que eu não a visse.

O ar ao redor era leve, quase etéreo, e um aroma doce, parecido com flores da noite, pairava sobre tudo. Eu me aproximei da margem hesitante, incapaz de desviar o olhar...

- É magnífico ...! Falei em um sussurro.

O rio de prata fluía sem som, e sua superfície espelhada refletia um céu estrelado, mesmo que eu soubesse que estava sonhando. O mundo ao meu redor se moldava, mas o que se formava não era uma paisagem comum. Árvores imensas de folhas cintilantes cercavam o rio, e ao longe montanhas surgiam, suas encostas banhadas por uma luz suave. Era um lugar de beleza indescritível, calmo, acolhedor, silencioso, e ao mesmo tempo carregado de algo que eu nunca havia experimentado antes, era uma lugar mágico, em todos os sentidos da palavra.

Então ouvi uma voz distante: era a voz de Alexis.

- Tália, toque nas águas...

Quando fiz o que ela falou, o rio brilhou suavemente, então senti que ele parecia me chamar... eu entrei no rio e subitamente, uma voz ecoou ao meu redor. Não vinha de um ponto específico, mas parecia estar em toda parte, ressoando dentro de mim como o som de uma correnteza suave. Era profunda e serena, e ao ouvi-la, soube que o momento mais importante da minha vida havia chegado.

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