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A viagem até o acampamento havia sido muito barulhenta, um som incessante que enchia o ônibus me sufocava.

Apesar do barulho, eu me sentia distante, como se estivesse presa em uma bolha. Quando descemos, a mudança para a escuridão da floresta foi um alívio inesperado, embora o vento gélido mordesse a minha pele.

A lua, fraca e difusa, mal iluminava as árvores ao nosso redor, enquanto o vento sussurrava segredos que eu não conseguia decifrar.

Por alguns instantes, fiquei ali, parada, observando os outros adolescentes se dispersarem rumo aos chalés. Todos tão à vontade, tão integrados naquele ambiente, como se pertencessem àquele cenário. Eu, por outro lado, estava perdida, em mais de um sentido.

Eu deveria estar indo para o chalé do segundo ano, mas, sem perceber, meus pés hesitantes me levaram ao lugar errado. Quando me dei conta, já estava diante do chalé dos alunos mais velhos. Antes que pudesse dar meia-volta e sair dali, as garotas me notaram. Seus olhares curiosos me travaram no lugar.

— Você... está no lugar certo? — uma delas perguntou, com um sorriso carregado de ironia, os olhos passando rapidamente pela minha roupa, me examinando de cima a baixo.

Hesitei, tentando encontrar uma desculpa para sair, mas algo me impediu. A mala ao meu lado parecia pesar toneladas, e o simples ato de admitir meu erro me parecia grande demais. Então, fiquei. Sorri de forma forçada, um sorriso que não dizia nada além de "não sei o que estou fazendo aqui".

— Acho que ela se perdeu — outra garota comentou, o tom condescendente fazendo as outras rirem.

— É... isso. Eu... me perdi — As palavras saíram de mim como um sussurro, mas ninguém pareceu notar ou se importar.

— Bom, fica um pouco — disse a garota de cabelo curto, apontando para um lugar vazio ao lado dela, com um sorriso que parecia quase desafiador.

Me sentei, sem jeito, tentando parecer invisível enquanto as conversas ao redor continuavam. Algumas meninas jogavam cartas, outras estavam deitadas nas camas, mexendo em seus celulares. Eu me esforcei para me integrar, mas a sensação de que não pertencia àquele lugar só aumentava.

— Você é irmã do Patrick, não é? — uma das garotas falou de repente, atraindo a atenção de todas. Senti o olhar delas pesando sobre mim.

Meu estômago deu um nó. Eu sabia que aquilo estava vindo. O que eu não sabia era como lidar com isso.

— Sou — respondi, a voz baixa, querendo que o assunto morresse ali.

— Ele tá um gato, né? — outra garota falou, dando um sorriso malicioso.

— E você? Não anda com ele? — Outra garota surgiu ali, sentando ao meu lado.

— A gente... não se fala muito — admiti, sentindo o rubor subir pelas minhas bochechas. As palavras pareciam mais pesadas do que eu imaginava, como se, ao dizê-las em voz alta, a distância entre nós se tornasse ainda mais real.

— Sério? Que estranho — a garota de cabelo curto se inclinou para frente, os olhos brilhando com um interesse maldoso.

— Ele deve ter vergonha — uma outra garota comentou, e as risadas que seguiram atingiram meus ouvidos como socos.

— Deve ser difícil, não é? Ter um irmão tão inteligente, tão... incrível. — O sorriso da garota era afiado, cortante, e por um segundo eu quis desaparecer, evaporar daquele lugar.

Naomi, a garota de cabelo curto, estendeu um pote de Oreo para mim. O gesto era estranho, quase gentil, mas eu sabia que havia algo mais. Aceitei o biscoito, sentindo o gosto doce se tornar amargo na minha boca.

— Gosta de Oreo? — ela perguntou com um sorriso que não alcançava os olhos.

— Gosto, sim — respondi, minha voz mais frágil do que eu queria, como se estivesse prestes a quebrar.

— Ah, que fofa. — Uma das outras garotas falou, zombando.

Aqueles comentários me atingiram com uma força que eu não esperava. Tudo ao meu redor pareceu se distorcer, as risadas delas se tornando ecoantes e distantes. Patrick tinha seguido em frente, enquanto eu permanecia presa no passado, no que tínhamos sido antes de tudo isso.

— Ele te apresentou pra namorada dele? — A pergunta veio casual, mas o impacto foi brutal.

Namorada? Patrick tem uma namorada? O pensamento ecoava na minha mente, me jogando num estado de confusão e incredulidade. Como eu não sabia disso?

— Você não sabia? — Naomi perguntou, fingindo surpresa.

A dor daquela revelação foi imediata. Meu estômago revirou, e o mundo ao meu redor começou a girar.

— Preciso ir — murmurei, me levantando de forma tão brusca que quase tropecei na mala ao lado.

Elas me observavam com sorrisos satisfeitos, seus olhares afiados como lâminas, enquanto eu escapava para fora antes que pudessem ver as lágrimas que começavam a se formar nos meus olhos.

Troquei minhas pantufas pelas sandálias e praticamente corri para longe dali.

O ar frio da noite me atingiu como uma bofetada, mas em vez de me trazer alívio, apenas intensificou o nó apertado no meu peito. Andei pela trilha sem rumo, meus passos rápidos e descoordenados, tentando escapar da dor que me perseguia.

Patrick tinha seguido em frente. Ele estava vivendo uma vida nova, uma vida da qual eu não fazia mais parte.

Tropecei em um galho, quase caindo, mas continuei andando, como se a escuridão da floresta pudesse esconder o que eu sentia.

Os sons distantes dos outros adolescentes — risadas, conversas — agora pareciam tão irreais, como se fizessem parte de outro mundo. Um mundo ao qual eu já não pertencia. A realidade era que eu não sabia mais como me conectar com as pessoas. E essa percepção me aterrorizava.

Caminhei até a beira de um lago. A água calma refletia o brilho pálido da lua, e me ajoelhei ali, sentindo o frio da terra sob meus joelhos. Olhei para a superfície do lago, tentando me ancorar naquele momento, mas as lágrimas que eu havia segurado por tanto tempo começaram a escorrer pelo meu rosto, silenciosas e quentes, caindo na terra úmida.

A solidão naquele momento era quase palpável. Como se o espaço entre mim e o resto do mundo tivesse se alargado tanto que já não havia mais como atravessá-lo.

𝐜𝐡𝐚𝐫𝐦! boris pavlikovskyOnde histórias criam vida. Descubra agora