— Boris? — chamei, enquanto ele saía de uma das cabanas de madeira, onde ficava a secretaria. O sol estava começando a se esconder no horizonte, lançando sombras longas e frias ao nosso redor.
Ele me olhou rapidamente, mas a expressão em seu rosto me fez engolir em seco. Sua boca estava cheia de sangue, e eu senti um frio na barriga ao ver a cena. Ele desviou o olhar, como se estivesse tentando se afastar da situação.
— Ei, deixa eu ver — pedi, tocando suavemente seu rosto. Fiquei assustada ao notar a coloração roxa que se espalhava pela sua bochecha, um sinal claro do golpe que ele havia recebido.
— Deixa pra lá — ele deu de ombros, como se não fosse nada. A indiferença na sua voz não combinava com o que eu via. — Vou lavar isso.
— Boris, eu sinto muito... — minha voz tremia, completamente arrependida. Eu sabia que a briga com Patrick tinha sido mais do que apenas um desentendimento; era um reflexo de algo muito mais profundo entre eles.
— Ele tava merecendo — Boris disse, começando a andar, evitando me deixar vê-lo de perto. Notei que havia manchas de sangue na camisa dele, e a imagem me deixou angustiada. O contraste entre seu jeito despreocupado e a gravidade da situação me deixava inquieta.
— É, mas... — comecei a argumentar, mas as palavras falharam. O que eu poderia dizer? Que eu não queria que ele tivesse se metido em uma briga por mim?
— Ei — ele parou de repente na minha frente, me encarando com intensidade. — Relaxa.
A maneira como ele disse isso, quase como se estivesse tentando me proteger da realidade, fez meu coração acelerar. O olhar de Boris, que antes carregava raiva, agora tinha uma pitada de fragilidade. Era como se ele estivesse tentando me convencer de que tudo estava bem, mesmo quando eu sabia que não estava.
Respirei fundo, tentando encontrar as palavras certas. — Eu me importo com você.
Ele hesitou por um momento, a expressão no rosto suavizando. — Eu sei, mas você não precisa se preocupar comigo. Isso não é nada que eu não consiga lidar.
— Mas é você que está machucado — repliquei, um nó se formando na garganta. — Eu não gosto de ver você assim.
Boris respirou fundo, como se estivesse lutando contra a tempestade interna. Ele finalmente permitiu que eu o visse de perto, e os olhos, antes tão cheios de bravura, agora carregavam um peso que eu não sabia como aliviar.
— Vamos até a cabana — sugeri, tentando puxá-lo para longe daquelas lembranças ruins. — Precisamos de um tempo longe disso tudo.
Ele concordou, mas apenas com um movimento de cabeça, e seguimos juntos, a atmosfera entre nós dois mudando.
Chegamos ao dormitório vazio, um espaço que exalava uma serenidade inesperada, com as paredes de madeira aquecidas pela luz suave do final da tarde. O cheiro do ambiente era de madeira polida e um leve toque de limpeza, um contraste reconfortante com a tensão que carregávamos. As camas de solteiro, arrumadas de forma simples, estavam alinhadas contra as paredes, e algumas prateleiras de madeira exibiam livros e objetos esquecidos, como se o tempo ali tivesse parado.
Boris se encostou em uma das paredes, os olhos fixos em um ponto distante, a expressão ainda tensa. A angústia parecia pairar no ar, e eu podia sentir a preocupação crescendo dentro de mim enquanto tentava pensar no que fazer. O silêncio entre nós era pesado, mas ao mesmo tempo, havia uma sensação de segurança ali, longe do tumulto do acampamento.
— Espera um segundo — pedi, decidida a cuidar dele. Caminhei até um armário que rangia ao ser aberto e comecei a vasculhar seu conteúdo. Encontrei uma caixa de primeiros socorros, meu coração se enchendo de esperança ao ver que ainda havia suprimentos dentro.
— O que você está fazendo? — ele perguntou, a voz tingida de curiosidade e desconfiança.
— Estou pegando algo para cuidar de você — respondi, enquanto abria a caixa e examinava seu conteúdo. As minhas mãos tremiam levemente, mas eu sabia que precisava ser forte. Peguei uma toalha limpa e um frasco de solução salina, sentindo um alívio ao ver que havia o suficiente para tratar seu ferimento.
— Não precisa se preocupar com isso — ele disse, mas não pôde esconder a dor em seu olhar.
— Vamos, isso vai doer menos do que parece — insisti, tentando manter a atmosfera leve enquanto caminhava até ele. Eu me agachei ao seu lado e pedi que se virasse para que eu pudesse limpar o rosto dele.
Enquanto começava a limpar a ferida com cuidado, o toque suave da toalha contra sua pele parecia criar uma conexão sutil entre nós. A presença dele era confortante, e eu me sentia segura em cuidar dele. Mas, para minha surpresa, ele cortou o clima ao dizer:
— Minha boca tá com muito sangue.
Senti um frio na barriga ao ouvir isso, a realidade do momento batendo com força. Levantei os olhos, encontrando o dele, e percebi a fraqueza que ele tentava esconder por trás da bravura. Havia uma vulnerabilidade em sua voz que me fez sentir ainda mais próxima dele, como se, naquele instante, a dor que ele sentia fosse também a minha.
— Eu sei, mas vou cuidar de você — respondi, tentando sorrir para aliviá-lo, mesmo sabendo que a situação era grave. — Fica tranquilo.
Ele assentiu, um sorriso pequeno, quase imperceptível, surgindo em seu rosto. Era um momento frágil, onde o medo e a preocupação se misturavam com a esperança. Eu continuava a limpar sua ferida, e enquanto fazia isso, me perguntei se aquela conexão que começava a se formar entre nós poderia ser a luz em meio à escuridão que estávamos enfrentando.
— Pronto — disse, finalmente, enquanto colocava um curativo sobre o machucado. — Agora está melhor.
Boris virou-se para mim, e o olhar dele parecia mais leve, como se, mesmo que temporariamente, o peso que carregava tivesse diminuído. Era como se a fragilidade dele tivesse se transformado em uma força, uma força que, eu esperava, poderíamos compartilhar enquanto tentávamos encontrar um caminho para lidar com tudo o que estava acontecendo ao nosso redor.
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𝐜𝐡𝐚𝐫𝐦! boris pavlikovsky
Roman pour Adolescentsdurante um verão que deveria ser uma fuga dos últimos acontecimentos, você embarca em um acampamento escolar, esperando passar os dias e noites com tranquilidade. tentando deixar o passado para trás, você conhece um garoto excêntrico, fã dos filmes...