Tem alguém aí? - Volume 1

Suicídio

Já faz uma semana.
Uma semana.
**
Caminhei lentamente pela calçada molhada. Minha bota preta tinha gotas da chuva. O céu estava cinza. Era segunda feira. Tinha passado uma semana que o Logan não ia à escola, uma semana que eu não o via, e uma semana que eu estava na casa de Lolla.
A mãe do Logan foi mandada para o mesmo hospital que ele. Desde então nunca mais nos vimos. Nem temos notícias.
Chutei uma pedrinha longe, e suspirei. Eu não devia estar me preocupando tanto horas. Mas estava impossível.
- "Sabia que é ruim ver você assim"? - Kate disse, do meu lado. Se tornou normal a presença dela. Era ela quem me ajudava na escola, me protegia das coisas estranhas, era praticamente meu anjo da quarda.
- Ter você do meu lado já melhora muita coisa. - Eu disse, tentando sorrir.
Nós dobramos a rua, e eu consegui ver a escola. Suspirei, e continuei andando.
Então eu ouço Kate dizer:
- "Poxa, já estava na hora". - Ela da um risinho. Me viro pra ela, franzindo a testa.
- Hã? De que? - Ela me olha, e aponta alguma coisa com a cabeça.
- "Olha ali". - Eu olho na direção que ela estava apontando. Vi um grupinho de meninas. Ergui uma sobrancelha.
- Hã...? - Então eu vi o que Kate estava falando. Logan. Estava no meio do grupinho, encostado na parede, com uma jaqueta preta, uma calça jeans preta, a bolsa tombando pelo ombro. O cabelo pentiado diferente. Estava com uma mão no bolso, e olhava fixamente para uma garota do seu lado, que se derretia cada segundo.
Franzi a testa, imediatamente querendo bater em alguém.
- O que...o que aconteceu ali? - Eu perguntei, atônita. Kate olhava, interessada.
- Ele está... Diferente. - Eu disse.
- "Vai falar com ele". - Kate falou, dando de ombros. Eu senti minha cara esquentar. Logan estava diferente. Do nada, ele leva um tiro, vai pro hospital, volta sem falar com ninguém, e volta assim?!
Eu contínuo andando. Passo do lado dele. Ele me olha de relance, mas logo desvia o olhar pra menina de novo.
Franzi a testa, e olhei pro chão.
- "Olha, o Logan está arrebentando, hen?". - Ouço Kate. Reviro os olhos.
- "Ele sempre foi assim?". - Ela pergunta.
- Não, ele não era assim. - Respondi secamente.
Subi as escadas, e entrei na escola. Vi Lolla logo na entrada, sentada no banco. Corri até ela, e fui dizendo:
- Você viu o Logan?! - Lolla balança a cabeça, e diz:
- Você é a centésima pessoa que me pergunta isso Sam. Está todo mundo falando dele. Principalmente Caroline. - Ela diz.
- O que aconteceu com ele? Você falou com ele? - Perguntei.
- E eu tenho coragem? Ele chegou aqui atraindo os olhares de todo mundo. Posando de gostosão. - Lolla disse. Uma garota de cabelos cacheado e blusinha que batia no umbigo passou dizendo:
- Querida, ele não posa de gostosão. Ele é. - Abri a boca, atônita, e vi ela se afastar.
- Viu isso?! - Lolla disse, atônita. Bufei, e sentei do lado dela.
- Oque aconteceu? Do nada...- Eu balbuciei.
- Ele fez uma cirurgia Sam. Creio que a cirurgia mexeu um pouco com a cabeça dele. - Ela disse.
- Há, e fez ele virar...aquilo?! - Eu quase gritei.
- É estranho mesmo...ele chegou aqui do nada, virou aquilo do nada. Eu não sei. - Ela disse. O sinal tocou. Soltei o ar, e levantei, indo pra sala.
Sentei na cadeira da frente. Lolla sentou atrás de mim.
Os alunos foram chegando, e o professor um pouco depois. Notei que as meninas da sala ainda não tinham entrado.
Então um pouco depois do professor fechar a porta, Logan a abriu, com o monte de grupinhos de meninas patricinhas e falantes atrás dele.
Ele entrou, e o professor encarou ele de cima abaixo. Uma garota que estava do meu lado, deixou escapar um suspiro.
Revirei os olhos. Ele sorriu, passou o braço pelo ombro de uma garota, e disse:
- Opa, professor! Cheguei atrasado, eu sei. - O professor levantou uma sobrancelha.
- É Logan... Chegou atrasado sim. Você está meio diferente não é? Por que faltou por uma semana inteira? - O professor perguntou.
Ele enlaçou uma outra menina pela cintura, que pareceu prestes a desmaiar.
- Eu fiquei fora uns dias. - Ele disse somente, olhando para a garota, sorrindo.
*****
- ELE MUDOU COMPLETAMENTE! - Eu disse para Kate, que brincava com o cadarço do meu tênis.
- Agora só fica dando em cima das mulheres, nem conversou com agente, não olhou na nossa cara! Fingiu que não conhece! - Eu disse, baixinho, para Lolla não ouvir. Eu estava na sala, ela estava no quarto dela, no andar de cima, e eu estava deitada no sofá, com um cobertor.
- "Sabe o que você está parecendo? Aquelas meninas que ficam chorando porque foram traídas". - Kate disse. Eu parei, e sentei no sofá. Olhei para a cara dela.
- Não fui traída! Eu e ele não éramos nada, apenas amigos. - Eu disse, a olhando. Ela afirmou com a cabeça.
- "Há, sim. Foi por isso que vocês se beijaram". - Kate falou.
- "Bem, eu...te prometi falar como eu morri". - Ela completou. Eu afirmei, relutante.
- "Eu já não aguentava mais. Aquele orfanato estava me matando por dentro. E tem uma coisa que você não sabe. Ficou muito pouco tempo lá. Mas...a verdade é que Clara, maltratava agente. Ela batia na gente, e fazia uma coisa muito...horrível de se falar.
Ela...deixava homens abusar de nós. Em troca de dinheiro". - Ela disse, lentamente. Abri a boca, e franzi a testa.
- Você...M-meu deus...- Balbuciei. Ela assentiu.
- "Eu...me matei. Era impossível continuar querendo viver com um homem abusando você todo dia. Quando você foi adotada, fiquei novamente sozinha. Então esperei até o dia do meu aniversário. Fizeram um bolo pra mim. Pediram pra eu assoprar as velas, e fazer um pedido. Eu assoprei, e desejei estar morta. E todos aplaudiram, sem saber de nada. O bolo acabou, e eu fui pro quarto. Vazio de novo. Peguei a corda que eu tinha separado. Pulei a janela do quarto, que deu para o jardim do orfanato. Peguei o banquinho embaixo da janela, e levei para a árvore mais próxima. Subi nele, e enrosquei a corda no galho, e fiz um nó. Encaixei ele no meu pescoço, e criei coragem para chutar o banquinho para o lado. Eu não via muita coisa, apenas o ar frio da noite me embalar. Fui perdendo o fôlego, eu tentava respirar, mas não podia. Minha garganta estava apertada. Eu sentia dor. Tentava voltar, mas a morte resolveu atender meu pedido.
E estou aqui agora.