Uma sombra...?

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Um trovão ecoou pelo céu azul escuro daquela noite.
Luke seguia com o carro, com cuidado, tentando limpar o vidro embasado pela chuva. Tudo estava confuso, e o fato de ninguém estar nas ruas ajudava mais ainda.

Engoli em seco, olhando as luzes pingadas dos postes de iluminação. Estávamos perto do cemitério da casa de Agatha, ainda era dez para meia noite.

Luke deu a volta para conseguir chegar á casa de Agatha. Avistei a cruz do portão do cemitério. Onde Emily estava sentada.

Arya do meu lado, se virou lentamente para mim, com a expressão desconfortável.

- S-Sam... Eu não quero mais... Me leva pra casa... Por favor - Ela gesticulou nervosa - Alguma coisa ruim vai acontecer, Luke me leva para a casa, sai daqui, por favor! - A mesma repetiu, aumentando a voz chorosa. Ela ficou aflita de uma hora para outra, como se pressentisse algo horrível.

Luke olhou pelo retrovisor. Os olhos cinzas, demonstravam que estava nervoso também.

- Não dá, Arya. Já estamos aqui, vai sobrar para mim se eu não achar Agatha. Por favor, me ajuda. Isso é meu futuro. - Ele insistiu. Mas dava para perceber que estava controlando a voz.

- Com certeza, se você for médico, não terá que sair por ai atrás de seus pacientes - Ela argumentou.

- Não, mas no caso, eu estou apenas começando o estágio. Vai sobrar para mim, acredite. - Ele respondeu, se voltando para a estrada, que já deixava a vista a casa de Agatha.

Luke parou com um solavanco. O fim da rua vazio e escuro, só restava a casa da garota. A chuva, parecia deixar o ambiente mais macabro.

- Não sai do carro, Arya. Sam, vem comigo. - O rapaz chamou, com um tom tenso. Me soltei do cinto de segurança, e abri a porta, depois de lançar um olhar tranquilizador para a outra do meu lado.

Assim que sai do carro, os pingos frios da chuva queimaram minha pele, e o vento gelado fez meus cabelos esvoaçarem para trás.

Olhei para Luke, que estava fechando a porta, observando a casa com a tinta despedaçada. O segui, um pouco vacilante. Arya nos olhava de dentro do carro.

- Agatha? Agatha, por favor, pare com isso! Estou tentando te ajudar, é para seu bem! Me escute, por favor? - O rapaz chamou. Nós dois vimos a mesma coisa. Uma sombra de capuz preto, atravessou o espaço entre a casa e o cemitério, alcançando a porta do casarão. Assim que a alcançou, a abriu, e quando Luke chamou, a sombra pareceu se virar para nós, e parar.

Eu fiquei em silêncio, observando a pessoa. Com certeza era Agatha, pelo seu jeito anti-social e encolhido de andar.

Mas a sombra não respondeu. Apenas se virou, abrindo mais a porta, entrando e depois a fechando novamente.

Luke bufou, passando as mãos pelo cabelos nervosamente. Se virou para mim, e falou:

- Vamos lá. Temos que entrar na casa e tirar essa garota de lá. Meu Deus, que coisa irritante - Ele reclamou.

Dei de ombros, e o segui, ainda desconfiada. Subi as escadas, do lado dele, que olhou para mim, e suspirou, evidentemente tentando não pensar que estávamos em frente a um cemitério, de costas, a praticamente meia noite.

Luke apertou minha mão. Sorri forçadamente para ele, e observei ele levar a outra mão para a maçaneta da porta. Abriu a porta, vacilante, com um rangido. Olhei para dentro do lugar. Um ar quente com um cheiro insuportável de pó, saiu para fora, como se ninguém entrasse ali há pelo menos um ano. O que era meio óbvio. Agatha não fazia nada naquela casa, e sua presença era o mesmo que nada.

Meu braço latejou. O olhei. Ele estava roxo ainda.Talvez aquele senhor morto no cemitério, tivesse errado. Meu braço não estava quebrado... Mas apenas ferido. De um jeito que prejudicou o osso um pouco. Mas nada que precise de gesso. Coisa irritante.

- Agatha? Se você não sair, serei obrigado a chamar alguém - Ele balbuciou, e percebi que o mesmo também estava com certo receio de entrar ali.

Silêncio. Apenas o barulho da fina chuva na telha da casa.

- Agatha, você não lembra de mim, mas eu sei como você se sente. Você me contou sua história... Deixa Luke te ajudar! É melhor para ambos - Tentei dizer algo. Nenhuma resposta. Abaixei a voz e me virei para Luke:

- Vamos entrar. Pegamos ela de vez, e acabamos logo com isso. Nada vai acontecer. - Sorri. O outro assentiu, e me seguiu para dentro da casa.

Quando meus olhos se acostumaram com o escuro, não vi ninguém ali. O rapaz girou o olhar pelo lugar, igualmente confuso.

- Será que ela está no andar de cima? - Ele perguntou, soltando minha mão. Dei de ombros, demonstrando que não sabia, mas teríamos que descobrir.

No canto da sala, uma vela gasta, fracamente acessa, denunciando que alguém havia estado ali. Fui na direção da vela, e a peguei cuidadosamente, para iluminar o caminho onde passávamos. Luke me seguia por onde eu passava, talvez por saber que eu já conhecia a casa.

Algumas goteiras molhavam o chão de terra, deixando tudo uma lamaceira por todo o lugar. A porta da janela bateu violentamente em um segundo. Pulei, assustada, e vi que o vento obrigada a pequena portinha a bater repetidas vezes. Dei a vela na mão de Luke, e corri até lá, fechando rapidamente.

Foi assim que ouvi um sussurro, próximo a meu ouvido:

- Não acha melhor fechar a porta também, pelo enorme frio que está fazendo? - Uma voz áspera que me envolveu como uma serpente fria. Tremi, largando a porta da janela, logo em seguida ouvindo um baque atrás de mim, deduzindo que a porta havia se fechado. Luke estava do meu lado, e pulou, se voltando para a porta, agora fechada.

- Samanthaaa!!! - Ele arquejou, olhando para os lados. Fiz um gesto para ele ficar calmo, e apontei para cima.

- Vem, vamos procurar ela lá em cima - Falei. Ele engoliu em seco, nervosamente.

Subi, com a ajuda de Luke, o que restava da escada, com medo de ela desabar mais ainda, e nos machucar.

Me virei, um tanto aliviada por ter passado da escada, e avistando o quarto de Agatha. Senti um arrepio ao pensar que anos atrás, Agatha estava correndo naquele corredor, sendo perseguida por Lee, que carregava um machado.

Soltei o ar, tentando não pensar nisso. Andei, o salto da minha sandália emitindo um barulho seco pelo casarão.

Entrei em seu quarto, puxando o braço de Luke para iluminar o lugar. Continuava tudo do mesmo jeito que estava da última vez que estive ali.

A não ser por um papel jogado na frete da cama. Exatamente no lugar que Emily tinha sido acertada pelo machado.

Engoli em seco, e agachei no chão, pegando a vela da mão de Luke, iluminando o papel.

"Um sorriso forçado, é o mesmo que um rasgo no meio da cara, que é segurado por um barbante, que ameaça estourar"

Era isso que estava escrito no papel. Franzi a testa, e larguei o papel de novo, me levantando.

- Agatha? - Chamei.

Nada... ... ...

A não ser por uma mão que saiu de baixo da cama.

- HAAAAAAAAAAA!!! - Berrei, indo para trás, esbarrando no Luke.

A mão se fechou, e foi se alongando, se transformando em um braço. Uma cabeça saiu, iluminada pelo fogo fraco da vela.

Eu estava parada, petrificada, olhando para a sombra que saia de baixo da cama.

Os olhos vermelhos me encaravam. O pescoço estilhaçado, a cabeça amassada, dando a ideia de que aquela pessoa tinha se tacado de uma janela, diretamente para o chão.

Tacado de uma janela...

Lee.

Abri a boca, mas ele sorriu, tombando a cabeça para o lado, lentamente.

- Não acha que é muito ingênua, garotinha? - Ele disse apenas, a voz rouca e grossa, de um adolescente rebelde.



Tem alguém aí? - Volume 1 Onde histórias criam vida. Descubra agora