008 - storm in sight

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Era um daqueles dias em que o céu começava claro, mas com uma promessa silenciosa de que as coisas iam mudar. O calor estava diferente, mais pesado, e as ondas do mar pareciam bater com mais força do que de costume. Eu sempre soube que, depois de um período de calmaria, a tempestade vinha. Mas, naquele dia, eu estava mais preocupada com o JJ do que com qualquer sinal meteorológico.

Sarah tinha comentado, mais cedo, que ele estava “estranho”. Claro, ela sempre exagerava, mas dessa vez, sua preocupação parecia genuína. Mesmo que JJ fosse o tipo de pessoa que raramente demonstrava quando algo o incomodava, eu conseguia perceber quando ele não estava 100%.

Depois de passar a manhã com o grupo, surfando e rindo, o plano era voltarmos para a casa de John B para um almoço improvisado. Eles eram o tipo de gente que vivia à base de churrascos e lanches rápidos, e eu me perguntava como não cansavam disso. Cléo e Pope estavam discutindo sobre a melhor maneira de grelhar hambúrgueres, enquanto John B e Sarah sumiam para pegar mais cerveja. Era a dinâmica de sempre, mas algo em JJ estava diferente.

Ele se afastou do grupo logo que chegamos à casa, indo direto para o fundo do quintal, onde ficava um dos balanços de corda. Ele estava lá, sozinho, olhando para o mar distante. Eu hesitei antes de segui-lo, me perguntando se ele queria mesmo companhia. Mas, no final, minha curiosidade sempre vencia.

— Pensando em se balançar até o infinito? — eu brinquei, me aproximando devagar.

JJ olhou para mim por um segundo, antes de sorrir, mas o sorriso não chegou aos olhos.

— Talvez, se o balanço aguentasse o tranco — ele respondeu, tentando ser leve, mas ainda havia algo no ar.

Me sentei no balanço ao lado dele, as cordas rangendo levemente sob o meu peso. O silêncio entre nós era confortável, mas também carregava uma tensão não resolvida. Eu sabia que ele não ia se abrir logo de cara, então esperei.

— Você nunca falou muito sobre sua família — eu disse, meio que sem pensar, mas foi o que veio à minha mente.

Ele suspirou, encostando a cabeça contra a corda. — Não tem muito o que falar. É complicado.

Eu sabia que era, mas essa era a primeira vez que ele mencionava isso de forma tão direta.

— Complicado como? — perguntei, querendo saber mais, mas ao mesmo tempo com receio de forçar.

— Só… complicado. — Ele riu de um jeito que parecia mais um reflexo do que uma verdadeira risada. — Meu pai é ausente, minha mãe faz o que pode. Mas sabe quando parece que você não pertence a lugar nenhum? Como se você fosse sempre o cara de fora?

Eu senti um aperto no peito ao ouvir isso. JJ era o tipo de pessoa que estava sempre cercado de gente, sempre no centro de tudo, mas essa confissão me fez perceber que, por trás da fachada, ele se sentia sozinho.

— Sabe que você não está sozinho, né? — eu disse, baixinho, porque a verdade é que essas coisas são difíceis de dizer sem parecerem piegas.

Ele me olhou, realmente olhou, como se estivesse tentando entender o que eu queria dizer.

— Não sei se é bem assim, Kiara — ele murmurou, quase para si mesmo.

Eu queria dizer algo inteligente, algo que fizesse sentido e resolvesse toda a confusão na cabeça dele, mas percebi que isso não era possível. Em vez disso, apenas segurei a corda do balanço e olhei para o mar com ele.

O silêncio que seguiu foi mais leve, como se JJ tivesse aceitado que não precisava fingir estar bem o tempo todo. Eu sabia que, por trás daquela máscara de garoto despreocupado, ele escondia mais do que deixava transparecer, e, de algum jeito, isso o tornava ainda mais real para mim.

Quando o grupo voltou com as cervejas, JJ pareceu voltar ao normal, ou pelo menos à versão dele de normal. John B estava rindo, jogando a cabeça para trás enquanto Sarah contava uma história ridícula de algo que tinha acontecido no verão passado.

— JJ! — Pope gritou, enquanto mexia na grelha. — Dá uma força aqui, cara. Ou você vai deixar queimar tudo de novo?

JJ levantou as mãos, como se estivesse inocente. — Aquilo foi uma vez! Vocês nunca me deixam esquecer!

Ele se afastou, indo ajudar Pope, e eu fiquei ali por um momento, observando como ele voltava a se misturar no grupo, escondendo qualquer vestígio da vulnerabilidade que tinha mostrado antes.

Eu sabia que era só uma questão de tempo até a tempestade se manifestar de novo.

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Mais tarde, já no fim da tarde, o céu começou a escurecer de verdade. As nuvens se aglomeravam, e o vento ficou mais forte. Sarah, sendo a rainha do drama que era, já estava começando a entrar em pânico, dizendo que a tempestade ia destruir tudo e que deveríamos ir embora antes que "virássemos isca de tubarão". John B revirava os olhos, tentando acalmá-la, enquanto Cléo sugeria que simplesmente nos abrigássemos dentro da casa, como pessoas normais.

— Eu gosto de tempestades — JJ disse de repente, como se estivesse lendo meus pensamentos.

— Claro que gosta — eu respondi, o tom irônico sem conseguir ser evitado. — Aposto que você adorava correr pela praia no meio de um furacão.

Ele riu, mas havia algo mais em seu sorriso agora. — Eu correria se você fosse junto.

Eu pisquei, surpresa pela repentina ousadia dele. O JJ que flertava era familiar, mas a profundidade nas palavras dele, aquele subtexto de verdade, era uma novidade.

— Nem pensar. Eu sou mais de observar de longe, com segurança — respondi, tentando disfarçar o quanto a intensidade dele me abalava.

O vento estava mais forte agora, jogando areia em nossos pés. John B e Sarah começaram a guardar tudo que estava ao ar livre, enquanto Pope e Cléo organizavam as coisas dentro da casa. Eu ajudei onde pude, mas minha mente estava longe. Estava em JJ e no que ele tinha dito mais cedo.

O problema com JJ era que ele fazia tudo parecer uma aventura. Até os momentos mais simples tinham um peso maior quando ele estava por perto. E, quanto mais eu me envolvia com ele, mais difícil ficava imaginar o que viria depois do verão.

Enquanto terminávamos de arrumar as coisas, o primeiro trovão ecoou à distância. O céu, agora quase negro, piscava com os relâmpagos, e o mar começava a rugir mais alto, como se respondesse à fúria do clima. JJ olhou para o horizonte com um olhar quase desafiador, como se ele estivesse esperando por isso.

— Você não vai realmente correr pela praia no meio da tempestade, vai? — eu perguntei, meio que esperando que ele dissesse que sim.

Ele sorriu, mas, dessa vez, foi diferente. — Não. Hoje, acho que vou ficar quieto.

Foi uma resposta inesperada, mas, ao mesmo tempo, totalmente típica dele. JJ era um paradoxo ambulante, e, naquele momento, eu percebi que talvez estivesse mais disposta a desvendar esse mistério do que jamais estive disposta a admitir.

O vento zunia ao nosso redor, e enquanto a tempestade finalmente chegava, a sensação de que algo maior estava por vir se instalou no fundo da minha mente.

Porque, no final das contas, ninguém passa por uma tempestade sem sair mudado.

𝐄𝐍𝐃𝐋𝐄𝐒𝐒 𝐀𝐔𝐆𝐔𝐒𝐓 . . . ʲᶦᵃʳᵃOnde histórias criam vida. Descubra agora