Os dias se transformaram em semanas, as semanas em meses. O sol nascia e se punha, as estações mudavam, mas a rotina dentro do presídio de Yokohama se mantinha implacável. O rumor das chaves abrindo e fechando as celas, o barulho distante das refeições, o constante murmúrio da vida regimentada. O único fio que ligava Izana ao ritmo do mundo lá fora eram as cartas.
Até que um dia, o silêncio se instalou. As cartas, que antes chegavam com a regularidade das marés, pararam de chegar. Um vazio se instalou no coração de Izana. A sensação era de um fio rompido, uma conexão bruscamente interrompida.
Os guardas, como se tivessem previsto a angústia de Izana, entraram em sua cela com um ar compassivo. — O senhor ainda está com as cartas, não é? A gente até tentou rastrear a garota que as escrevia, mas não deu em nada. Parece que ela simplesmente parou de mandá-las.
Izana não os encarou, apenas fitou as paredes de sua cela. Ele as havia decorado, quase imperceptivelmente, com as cartas: algumas presas com alfinetes, outras cuidadosamente dobradas e guardadas em um canto. Os guardas se retiraram, deixando-o em sua quietude.
As cartas, apesar de serem simples peças de papel, haviam se tornado algo precioso para Izana. Elas eram a única ponte para um mundo que ele havia desdenhado, um mundo que agora parecia inatingível. Era como se a promessa de redenção que se acendia em seu peito tivesse sido brutalmente arrancada.
Sem as cartas para acompanhá-lo, a solidão de Izana se intensificou. Ele revivia cada palavra, cada traço da caligrafia, tentando decifrar o porquê do silêncio. A cada dia, a culpa se afundava mais fundo em seu coração. Será que ele havia assustado a garota? Será que ela percebeu a monstruosidade que ele carregava dentro de si e resolveu se afastar?
A solidão se agarrava a ele como um carrapato sugando sua energia vital. A falta das cartas era como um fantasma, uma presença constante que o assombrava. O ciclo de violência que o havia levado até ali parecia se fortalecer, cobrando seu preço.
Izana tentava esquecer, abafar o vazio em seu coração, mas era impossível. As cartas eram uma lembrança incômoda de que ele também era capaz de sentir. As palavras daquela garota desconhecida, quase como um sopro de vento fresco, haviam despertado algo dentro de seu peito. Algo que ele havia enterrado há muito tempo.
Ele se viu preso novamente: aprisionado em sua própria culpa e em um presídio de concreto e solidão. A única diferença era que agora ele carregava consigo a sombra daquilo que havia perdido, a memória de uma esperança que havia se esvaído, e a culpa que lhe corroía por dentro.
Izana sentou-se no canto de sua cela, abraçando os joelhos e observando as paredes. As letras e palavras que preenchiam o espaço, antes reconfortantes, agora pareciam zombar dele. Ele se odiava por se sentir assim, por se importar com a ausência de uma simples carta.
Ele era o Rei de Yokohama, o homem mais temido dos presídios, e ali estava ele, lamentando a perda de palavras escritas por uma garota inocente.
A raiva era um sentimento que sempre conseguia afogar qualquer emoção nele. Mas agora, até a raiva não conseguia afugentar a tristeza. Ele se perguntava onde tinha ido parar seu coração frio e calculista, que nunca se permitia se apegar a nada.
Ele riu baixinho, uma risada sombria que ecoou nas paredes da cela. Ele se sentia ridículo. Ridículo por se preocupar com uma garota que ele nunca conheceu.
Izana segurou a foto de Yana entre os dedos, a única prova que revelavam a existência daquelas cartas.
"Yana Kōharin" esse era seu nome, e tudo o que ele sabia era que tinha vinte anos, além do seu nome.
O nome dela parecia quase mágico para ele, uma combinação de som tão doce quanto o próprio mel. Apenas dizer o nome dela em voz alta parecia acalmá-lo.
Ele observou a foto novamente, estudando cada detalhe dela. O vestido branco, o sorriso doce, os olhos negros. Por que ela havia parado de enviar as cartas?
E se... E se ela tivesse algo acontecido com ela? Esse pensamento quase fez seu sangue congelar. A ideia de algo acontecendo com a única pessoa que tinha tocado seu coração era insuportável.
Ele precisava saber se ela estava bem. Precisava descobrir o que tinha acontecido para que as cartas tivessem parado de chegar.
— Guardas! — Izana chamou em um tom alto e sombrio como uma ordem sinistra do próprio diabo.
Os guardas se reuniram rapidamente na frente de sua cela. Estavam acostumados com os chamados e pedidos de Izana, mas nunca o tinham visto com uma aparência tão sombria.
Um dos guardas, um homem de cabelos negros e olhar atento, deu um passo à frente e se pronunciou em um tom sério:
— O que deseja, Kurokawa-sama?
A voz calma e fria de Izana ecoou pela cela enquanto ele se levantava, a foto ainda em suas mãos. Seus olhos violeta estavam arregalados e determinados.
— Eu quero saber o que aconteceu com a garota das cartas. — As palavras foram quase cuspidas com um misto de impaciência e exigência.
Os guardas imediatamente se entreolharam, desconcertados e preocupados com o tom de Izana. Eles sabiam que aquele assunto era um ponto delicado para ele, mas nunca o tinham visto tão perturbado quanto naquele momento.
Um deles, o homem de cabelos negros, deu um passo à frente novamente.
— Kurokawa-sama, nós... nós tentamos descobrir o que aconteceu, mas não encontramos nenhum sinal dela. Ela parece ter sumido completamente.
— Nós...— um outro guarda murmurou — acreditamos que ela tenha desistido de escrever, já que nunca recebia uma resposta.
As palavras dos guardas atingiram Izana como uma pancada no peito. Ele se sentiu quase tomado pela culpa quando ouviu que a garota poderia ter desistido por falta de retorno.
Ele baixou o olhar para a foto, os olhos fixos naquele sorriso doce que havia se tornado tão precioso para ele.
— Isso é absurdo. Ela não desistiria assim tão facilmente. — Izana rosnou, a frustração tomando conta dele. — Ela é doce demais, inocente demais para desistir assim.
Os guardas trocaram olhares novamente, desconcertados com o quanto Izana sabia da garota, considerando que só conhecia ela pelas cartas. Mas sabiam que não era uma boa ideia questioná-lo.
— vamos aguardar e ver se chega alguma carta — o guarda disse tentando acalmar a situação
Izana franziu a testa, inconformado e impaciente. Ele não era um homem de esperar, mas, na ausência de opções, ele não tinha escolha.
Ele assentiu bruscamente, a expressão ainda sombria.
— Ótimo. Mas quero saber imediatamente se alguma carta chegar.
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JINGOKU - Kurokawa Izana
Приключения⚠️🚫18+ Dark Romance 🚫⚠️ "Você é a luz na minha escuridão, a paz na minha guerra. Eu nunca deixarei nada te machucar."