Capítulo 06 - Feto

53 105 2
                                    

O ambiente do quarto em que Tita estava era pesado, quase opressivo, enquanto Tita se via em meio ao caos. O eco da voz de Tenébrio ainda ressoava em seus ouvidos, trazendo uma onda de pânico.

— Corra, pequena Tita, que a polícia já deve estar chegando!

Ela olhou ao redor, desesperada, sussurrando para si mesma.

— Meu Deus, senhor, me ajuda!

Foi então que um jovem surgiu no corredor do hotel, cortando a tensão que a cercava.

— Moça, por aqui, vem! — disse Guinzé, com um olhar decidido.

Tita hesitou com a insegurança transparecendo em seu rosto, mas a urgência a forçou a aceitar a ajuda.

— Quem é você? — perguntou Tita, enquanto se dirigia rapidamente para a saída.

— Desculpa, nem me apresentei. Guinzé! Sou filho de dona Juvelina, irmão de Pretinha.

— Tita! — ela respondeu.

Após conseguir saírem do hotel e um pouco mais tranquila, Tita falou. — Conheço sua mãe. Pensei que você ainda estivesse morando fora!

— Voltei há pouco. Mas, antes que me diga, posso adivinhar o que você estava fazendo naquele quarto!

Ela franziu o cenho, mas a curiosidade tomou conta.

— Como assim?

— Um teste de trabalho, acertei?

A tensão que antes a consumia começou a se dissipar enquanto eles caminhavam pela rua.

— Quem é você? — Tita indagou, tentando compreender a situação.

— Guinzé, eu já te falei, cheirosa. Não se preocupe, eu sei disso porque eu também estava fazendo a mesma coisa! — ele respondeu, rindo levemente. — Só não era com um homem, era uma mulher. Levei o espumante como me pediram, ela dormiu, peguei os pertences dela, encontrei você, fugimos e estamos aqui!

Tita estava perplexa, ainda tentando processar a realidade que a cercava.

— E como você conseguiu esse teste? — indagou.

— Um link que achei na internet. Guinzé sorriu de forma enigmática. Aqui em Marajó, qualquer emprego que aparece não se torna suspeito quando você precisa!

— Mas isso não é perigoso? — perguntou Tita, a preocupação evidente em seu olhar.

Guinzé ergueu uma sobrancelha e, com um sorriso irônico, respondeu:

— Defina perigoso.

Tita hesitou, ponderando. A tensão entre a curiosidade e a insegurança a fazia lutar com as próprias palavras.

— Eu já ouvi falar sobre algumas lendas de Marajó, mas... várias delas são só histórias, não são?

Guinzé estreitou os olhos, o sorriso desaparecendo lentamente.
— Algumas lendas — disse ele, com a voz firme — são mais reais do que você imagina. Elas sobrevivem ao tempo porque carregam verdades que ninguém quer lembrar.

Tita sentiu um calafrio correr pela espinha, mas não desviou o olhar.

Guinzé inclinou-se ligeiramente para frente, como se quisesse que cada palavra cravasse fundo na mente dela.
— O mundo está cheio de esquecidos, Tita. Gente que o poder decidiu ignorar. Mas vou te dizer algo: alguns desses esquecidos vivem cercados de cadeados enferrujados. E se um dia as ferrugens desaparecerem, se esses cadeados forem abertos... — Ele fez uma pausa, seus olhos parecendo olhar além, para algo que Tita não conseguia ver. — Bem, digamos que ninguém sairá ileso.

CADEADOSOnde histórias criam vida. Descubra agora