XIV 🦋

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Maraisa ainda estava com o rosto molhado de lágrimas, sentada entre Marília e Luísa, quando a porta da sala se abriu devagar. Maiara apareceu no vão da porta, segurando um copo de água e com o semblante preocupado. Ela havia escutado o choro da irmã de longe e, mesmo sem saber o motivo, o som daquelas lágrimas a atingiu como um golpe. Ela sabia que algo sério estava acontecendo.

— O que tá acontecendo aqui? — Maiara perguntou, com a voz carregada de preocupação, enquanto se aproximava do grupo sentado no chão.

Marília e Luísa trocaram olhares rápidos, tentando encontrar a melhor forma de explicar a situação. Maraisa, ainda com os olhos vermelhos, apertou as mãos no colo, claramente desconfortável e envergonhada. Ela sempre se preocupava com o que Maiara pensava dela, e revelar algo tão pessoal era assustador.

Maiara se abaixou ao lado da irmã, colocando delicadamente a mão em seu ombro. — Isa, o que foi? Por que você tá chorando?

Maraisa balançou a cabeça, tentando conter mais lágrimas. — Eu... eu não sei ler, Maiara — confessou, a voz quase sumida. — Eu sou burra... Não consigo fazer as coisas que todo mundo faz.

O coração de Maiara apertou ao ouvir isso. Ela sabia que a irmã carregava muitas inseguranças, principalmente depois de tudo que viveram, mas nunca imaginou que algo assim a afetaria tanto. Ela respirou fundo, tomando um momento para processar antes de responder.

— Ei, ei... — Maiara começou, sua voz suave, mas firme. — Não fala assim, Isa. Você não é burra. Nunca foi.

— Mas eu sou! — Maraisa insistiu, as lágrimas voltando a escorrer pelo rosto. — Todo mundo sabe ler. Eu tento, mas as letras... elas se misturam, eu não consigo. Eu queria ser igual a vocês... mas eu não sou.

Maiara sentiu um aperto no peito ao ouvir a frustração da irmã. Ela sabia o quanto isso era importante para Maraisa, o quanto ela queria ser vista como alguém capaz. Ver a irmã se sentindo tão inferior a feria profundamente.

Marília, percebendo a tensão no ar, interveio suavemente. — A gente estava lendo juntas, Maiara. Maraisa se sentiu mal porque achou que deveria saber ler, mas não tem pressa pra isso. A gente pode ajudar, juntas.

Luísa assentiu, tentando contribuir para acalmar a situação. — Exatamente. Ninguém aqui acha que você tem que saber tudo, Isa. A gente vai aprender juntas, como um time. É assim que funciona, né?

Maiara olhou para as duas amigas, sentindo um profundo alívio por saber que Maraisa tinha tanto apoio. Ela respirou fundo, tentando encontrar as palavras certas para acalmar a irmã.

— Isa, você lembra de quando aprendeu a comer de garfo e faca com agente? — Maiara perguntou de repente.

Maraisa olhou para a irmã com uma expressão confusa, mas assentiu lentamente. — Sim... eu deixava a mimida cair muito...

Maiara sorriu levemente. — Pois é. Mas, com o tempo, você aprendeu. Lembra como você ficava frustrada porque as outras crianças já sabiam, e você não conseguia?

Maraisa abaixou a cabeça, mas um pequeno sorriso tímido apareceu em seus lábios. — Lembro...

— E o que aconteceu depois? — Maiara perguntou, incentivando a irmã a continuar.

— Eu... eu aprendi. — Maraisa respondeu, ainda com um tom de dúvida na voz.

— Exato! — Maiara disse, abraçando a irmã de lado. — Ler é a mesma coisa. Não importa o quanto você tente agora e ache que não tá conseguindo. Um dia vai fazer sentido. Mas você não precisa se apressar, e muito menos se comparar com os outros. A gente tá aqui pra te ajudar, cada passo do jeito que for melhor pra você.

Marília, com o livro ainda nas mãos, sorriu e acrescentou: — E sabe de uma coisa, Isa? Ler é só uma parte da vida. Você já sabe tantas outras coisas. Coisas que são muito mais difíceis que ler, como cuidar das pessoas e ter um coração enorme. Isso é o que realmente importa.

Luísa, sempre a mais prática, deu um leve tapinha nas costas de Maraisa. — E, sério, se você aprender a ler com a gente, vai ser bem mais divertido. A gente pode fazer disso uma aventura. Tipo, cada palavra que você aprender, a gente faz uma comemoração!

Maraisa fungou, limpando o rosto com as costas da mão. A tensão dentro dela ainda estava presente, mas a maneira como as três meninas a cercaram com carinho e apoio fez com que aquele peso começasse a diminuir. Ela não conseguia evitar de sentir que ainda tinha muito a aprender, mas, talvez, não fosse um problema tão grande quanto pensava.

— Vocês realmente acham isso? — ela perguntou, ainda com certa hesitação.

— Claro que sim! — Luísa respondeu, sorrindo. — E, além disso, eu sou péssima em matemática. Todo mundo tem algo que não consegue fazer tão bem, e isso não muda nada sobre quem a gente é.

Marília assentiu, pegando de novo o livro e mostrando para Maraisa. — Quer tentar de novo? Eu leio e você me ajuda a virar as páginas. Vamos começar devagar. Não tem pressa.

Maraisa olhou para o livro com cautela, mas, vendo o olhar encorajador de Maiara, Marília e Luísa, sentiu-se um pouco mais confiante. Ela pegou o livro com as mãos trêmulas e abriu na primeira página, observando as palavras que pareciam se embaralhar à sua frente. As letras ainda não faziam sentido para ela, mas, dessa vez, ela não estava sozinha.

Maiara sentou-se mais perto da irmã, envolvendo-a em um abraço protetor. — A gente vai passar por isso juntas, Isa. Eu prometo que você não precisa fazer nada sozinha. Nunca mais.

Maraisa respirou fundo, sentindo a presença reconfortante de Maiara ao seu lado. Era difícil, mas, naquele momento, com as pessoas que ela mais amava ao seu redor, ela percebeu que talvez aprender a ler não fosse o pior de seus problemas. O importante era que, por mais difícil que fosse, ela tinha Maiara, Marília e Luísa ao seu lado.

Marília começou a ler a primeira linha, com a voz suave e melodiosa, enquanto Maraisa a ouvia com atenção. Cada palavra parecia menos ameaçadora com as vozes das amigas ao seu redor. E, pela primeira vez em muito tempo, Maraisa sentiu que, mesmo com suas dificuldades, ela era amada e aceita exatamente como era.

Maiara olhou para a cena à sua frente, sentindo uma onda de alívio. Saber que Maraisa estava segura e cercada de amor era tudo o que ela precisava para se sentir mais tranquila. O caminho de Maraisa ainda seria longo, mas com as amigas e com Maiara ao seu lado, ela sabia que não enfrentaria nada sozinha.

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