021

283 22 8
                                    

Alice Veiga

Acordei com a luz fraca da manhã entrando pela janela. A casa estava em silêncio, o que era raro quando se tinha Endrick e Raphael por perto. Olhei no relógio e percebi que era mais cedo do que eu esperava. Me espreguicei, ainda sentindo um leve cansaço da noite anterior. A imagem de Richard rindo enquanto me jogava no mar veio à mente, e não pude deixar de sorrir.

Levantei devagar, tentando não fazer barulho, e fui até a cozinha em busca de café. Quando cheguei lá, encontrei Richard sentado à mesa, já com uma xícara nas mãos. Ele me olhou com um sorriso tranquilo, e por um momento me perguntei se ele tinha dormido. Ele estava com o mesmo cabelo bagunçado e a mesma expressão de ontem à noite.

— Você não dorme, não? — perguntei, pegando uma xícara.

— Dormi um pouco, mas sou mais do tipo que acorda cedo — respondeu ele, dando de ombros. — E você, que milagre é esse? Achei que ia ser a última a acordar depois de ontem.

— Eu também pensei — confessei, sorrindo levemente. — Acho que a adrenalina de ser jogada no mar ainda não passou.

Richard riu, e eu fiquei em silêncio enquanto preparava meu café. Algo na presença dele era confortável, apesar das brincadeiras de sempre. Ele parecia estar mais quieto do que o normal, o que me deixou curiosa.

— E aí, planos para hoje? — perguntei, tentando puxar assunto. — Ou vai ser só treino?

— Hoje tá mais tranquilo, só temos treino à tarde. Mas tô pensando em dar uma volta por aí antes disso — ele respondeu, olhando pela janela, como se estivesse pensando em algo distante. — Quer vir?

A pergunta me pegou de surpresa. Eu e Richard sempre tínhamos essa troca de provocações, mas ele raramente me convidava para passar um tempo só com ele. Geralmente, estávamos sempre com a galera toda.

— Dar uma volta onde? — perguntei, tentando disfarçar o espanto.

— Não sei ainda. Talvez ir a algum lugar tranquilo, só pra sair um pouco. A casa tá muito cheia ultimamente, e eu gosto de espairecer às vezes — ele disse, sem tirar os olhos da janela.

— Tá querendo fugir do Endrick e do Raphael, é? — brinquei, tentando manter o tom leve.

— Um pouco — ele admitiu, com um sorriso de canto. — E de você também, se você continuar me zoando.

Revirei os olhos, mas a ideia de passar um tempo longe da bagunça me parecia cada vez mais atraente. E, apesar de tudo, Richard sabia ser uma boa companhia quando queria.

— Tá bom, eu topo — respondi, pegando minha xícara de café. — Mas não vem com aquelas ideias de me jogar em qualquer lugar de novo.

Ele riu, se levantando.

— Prometo que dessa vez eu me comporto.

Algumas horas depois, estávamos no carro, Richard dirigindo pela cidade com as janelas abertas. O sol estava forte, mas o vento que entrava tornava o passeio agradável. Ele escolheu uma estrada que nos levava para fora da cidade, em direção à praia, mas uma praia diferente da que tínhamos ido na noite anterior. Esta parecia mais isolada, quase deserta.

— Esse lugar aqui é bem menos movimentado — ele comentou, estacionando o carro perto da areia. — Eu venho aqui às vezes quando quero pensar. Pouca gente conhece.

Saímos do carro e caminhamos até a areia, onde o som das ondas era praticamente a única coisa que se ouvia. Richard parecia mais sério hoje, o que me deixou um pouco intrigada.

— Tá tudo bem com você? — perguntei, quebrando o silêncio.

Ele parou, olhou para o mar e depois para mim, como se estivesse ponderando a resposta.

— Tá, só... muita coisa na cabeça ultimamente.

— Nathalia? — arrisquei, lembrando-me das conversas anteriores sobre o relacionamento conturbado dele.

Ele assentiu lentamente.

— Acho que tá tudo acabando de vez agora, sabe? Já faz um tempo que não tá dando certo, mas... sei lá, sempre fica aquela sensação de que você podia ter feito mais.

Eu me sentei na areia, olhando para o horizonte, enquanto ele permanecia de pé, olhando para o mar.

— Eu entendo — disse, depois de um tempo. — Mas, às vezes, a gente precisa aceitar que não dá pra consertar tudo. E ficar se culpando só vai te deixar mais preso a algo que já não faz sentido.

Richard me olhou, surpreso, e eu me perguntei se ele esperava que eu dissesse outra coisa, talvez uma piada, alguma provocação. Mas eu sabia que, dessa vez, o assunto era mais sério.

— Talvez você tenha razão — ele admitiu, sentando-se ao meu lado. — Só é difícil quando você investe tanto tempo, tantas emoções... e depois percebe que não era pra ser.

Ficamos em silêncio por alguns minutos, apenas ouvindo o som das ondas. Eu não sabia exatamente o que dizer, mas percebi que talvez o que ele precisasse fosse só alguém ali, ao lado dele, sem julgamentos.

— Eu acho que você merece mais do que isso, Richard — falei, enfim. — Alguém que te faça se sentir em paz, não sempre em conflito.

Ele me olhou com uma intensidade que eu não esperava, e por um segundo, senti como se algo tivesse mudado entre nós. Mas antes que eu pudesse dizer mais alguma coisa, ele desviou o olhar, rindo baixinho.

— Quem diria que você podia ser tão sábia, Alice?

— Não me acostumo com elogios, hein — brinquei, tentando quebrar a tensão.

Ele riu de novo, e o clima ficou mais leve. Continuamos ali por mais algum tempo, em silêncio, apenas aproveitando o momento. Não era preciso falar muito. Estar ali, naquele lugar tranquilo, parecia ser exatamente o que precisávamos.

Lisboa, Entre Nós, Richard Rios Onde histórias criam vida. Descubra agora