Capítulo três

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Estou nervosa para o começo de minha primeira aula de atuação, mas me obrigo a respirar fundo e a ficar calma. Lembro-me de que essa é, provavelmente, uma das aulas mais importantes do semestre para mim. Se eu conseguir o papel principal, significa que eu serei a estrela da peça na apresentação de inverno, quando o semestre terminar. E, como todos sabem, sempre há vários caras importantes do mundo do teatro e do cinema nessas apresentações. Portanto, facilmente eles poderiam ver meu talento e me contratar para algo futuro. Eu sei que soa impossível, mas ouvi dizer que isso já aconteceu antes.

Não há razão para pânico, porque eu certamente vou me dar bem nisso tudo. Faço aulas de teatro desde que era uma criancinha, então vou me sair bem. No entanto, vejo minha confiança destruída quando vejo alguém entrar. Cabelos castanhos, olhos cinzentos, camiseta preta, calça cáqui e coturnos marrons. Eu prendo a respiração. Não, não pode ser ele. Eu me viro imediatamente, com medo que ele me reconheça. Não deve ser ele. Não pode ser o cara em quem eu derramei café na cafeteria... Seria muita coincidência. É impossível!

Eu decido dar uma espiadinha. No mesmo instante em que eu o olho, seu olhar para no meu. Meu coração dispara e eu imediatamente me viro novamente. É ele! Mas, por sorte, acho que não me reconheceu, porque seu rosto não tinha expressão alguma e, certamente, se ele se lembrasse de quem sou eu, ele viria até mim para me xingar ou fazer qualquer coisa do tipo. Eu acho.

Inspiro todo o ar que meus pulmões aguentam antes de me virar para olha-lo. Dessa vez ele não está olhando para mim. Está sentado sobre uma cadeira, mexendo em alguma coisa dentro de uma pasta. Nossa sala de aula é, na verdade, um auditório, por isso há o palco e as cadeiras da plateia. Será que ele era um aluno? Não, não, seria impossível que isso acontecesse. Ou talvez ele estava ali apenas para assistir a uma aula? Talvez meu professor, o Sr. Montez, o expulsasse da sala quando chegasse. Eu o vi em uma foto no site da universidade e ele parece ser bastante rabugento para sua idade. Deve ter cerca de sessenta anos, por isso não tem paciência para engraçadinhos como o cara da cafeteria.

- Bom dia, calouros – o cara ogro da cafeteria fala, pondo-se de pé na frente de todos. Meu coração dispara novamente. O que raios estava acontecendo? – O Sr. Montez quebrou a perna e por isso está de licença do trabalho, por alguns meses. Eu sou o professor substituto.

Ah, droga.

Eu estou incrédula demais para fazer qualquer coisa. Sério. Nesse mundo tão gigante, como é que esse cara acaba justamente como meu professor? E por que tem que ser o professor de atuação? Fala sério! Eu estou cursando pelo menos outras seis matérias! O destino está tirando uma com minha cara e colocou alguém que me odeia para ser o professor da matéria mais importante do semestre! A matéria em que eu preciso me destacar para ser avaliada positivamente pelos críticos! Isso não poderia estar acontecendo.

Eu saio do meu transe quando escuto algumas garotas, que estão atrás de mim, cochichar sobre como o professor substituto é bonito, gato, forte e outros adjetivos que eu nunca havia ouvido antes. Eu tenho o impulso de me virar e gritar até que elas parem de falar. Mas não faço isso, é claro, porque não quero que pensem que eu sou louca. E também porque estou tentando parecer invisível para que o professor não me veja.

Ele não parecia ser muito velho. Na verdade, ele parecia ter cerca de vinte anos. Como é que um cara de vinte anos pode dar aulas em uma universidade? Aquilo só podia ser brincadeira... É claro! Sempre há dessas coisas na universidade, quando os veteranos invadem a sala dos calouros e aplicam uma pegadinha dizendo que vai haver uma prova ou então começam a passar um assunto difícil que não tem nada a ver. Essa deveria ser a minha pegadinha! Quase que eu caio nessa. Certo? Porque com certeza é uma pegadinha.

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