Capítulo vinte

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Por causa do susto, nós nos afastamos um pouco. Parece que o som do telefone nos trouxe de volta à realidade.

ALEXANDER GRAHAM BELL, EU TE ODEIO, CARA!

Conrado parecia um pouco desconcertado. Eu também. Ele apontou para o telefone e eu balancei a cabeça em positivo. Respirei fundo enquanto ele se afastava mais de mim para atender a chamada.

Sua expressão passou de constrangimento para pânico em apenas alguns segundos. Eu parei de pensar sobre a sombra de seu toque em minha pele quando vi seu olhar cheio de medo. O que estava acontecendo?

- Qual o endereço? – ele pergunta, agitado. – Sim, eu vou chegar aí em um minuto.

Quando Conrado desliga o telefone e se vira para mim, vejo que o mundo está desabando ao seu redor. Seus ombros estão caídos e sua expressão está destruída.

- O que aconteceu?

- Amanda e Gabriela sofreram um acidente de carro. Estão à caminho do hospital – ele responde.

Levo apenas um segundo para lembrar de suas duas irmãs que foram tão gentis comigo na loja de sapatos.

- Sinto muito – eu digo, entrando em desespero. Eu corro para a cozinha, pego minha bolsa e as chaves do carro de Conrado. – Pegue um casaco!

Enquanto ele veste a jaqueta, eu tranco a porta do 707. Descemos as escadas correndo, porque não há tempo para esperar pelo elevador.

- Eu dirijo – aviso quando chego ao estacionamento. Conrado nem mesmo discorda, o que me deixou um pouco mais tranquila. Ele estava apavorado e, claramente, sem condições de conduzir um carro. Era provável que causasse mais um acidente.

Ele me guiou até o hospital e eu obedeci a seus comandos. Chegamos lá em quinze minutos, porque, por um milagre, o trânsito não estava caótico como de costume.

Conrado foi correndo na frente, indo até o balcão de emergência para saber onde suas irmãs estavam. A moça demorou cerca de dez minutos para conseguir essa informação. Conrado parecia atônito, a ponto de pular no pescoço da pobre mulher e estrangulá-la ali mesmo. Eu fui até seu lado e segurei sua mão, só para garantir.

Nós dois entramos no prédio da emergência, mas não sem passar por alguns problemas. Conrado poderia entrar para a sala de espera interna porque era irmão das vítimas, mas eu não poderia. No entanto, eu aleguei que ele não poderia ficar sozinho naquele momento porque estava muito nervoso. Ela me olhou em dúvida e Conrado bufou, furioso, dando um soco na mesa em frente à ela.

- Dê a porcaria do adesivo de familiar para ela também! – ele gritou. – Ela é minha esposa!

A mulher arregalou os olhos e me entregou o adesivo, pedindo desculpas. Nós dois caminhamos com pressa até onde nos haviam dito para esperar e sentamos em duas poltronas (nada) confortáveis. Conrado estava tenso, impaciente, seus dedos não paravam de tamborilar na madeira dos braços da sua poltrona. Eu também estava nervosa. Tinha medo do que poderia ter acontecido.

Vez ou outra, eu o ouvia murmurar algumas palavras ininteligíveis. Porém, as poucas coisas que eu pude entender me chocaram. Ele dizia para si mesmo "eu não posso perder outra irmã, eu não posso perder outra irmã, eu não posso perder outra irmã". Ao mesmo tempo que aquilo me fazia querer abraça-lo, algo dentro de mim se contorcia por sentir a sua dor.

Depois que algum tempo se passou, ele se levantou e começou a caminhar em círculos pela sala de espera. Nós não trocamos nenhuma palavra e ele não me olhou nem uma única vez. Era como se ele estivesse imerso em seu próprio mundo de amargura, sem notar minha presença.

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