∆Prólogo

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"Não pode tirar a criança da briga

Tire a briga da criança

Sente-se, relaxe"

(Camisado - Panic! At The Disco)



Eu estava farto, cansado da maldita rotina que eu vivia. Saia de casa cedo em busca de auto sustento, deixava meu irmãozinho na creche, se por sorte nossos pais estivessem dormindo, o que era comum, já que a bebedeira ia sempre até o meio da madrugada - as brigas também - conseguíamos tomar café da manhã em casa, caso contrário (e esses eram os piores dias, pois nosso amargo desjejum era uma briga de casal), fazíamos uma refeição rápida na rua. Após um dia cansativo, a van da creche deixava meu irmãozinho em casa e eu tentava correr para voltar cedo e o proteger de toda a merda que assolava nossa família. Meu irmão, Yan, me perguntava o motivo, a razão, o maldito porque daquilo não parar nunca. Eu não sei, Pequeno, eu não sei!

Em alguns momentos, a discussão era tão intensa, que todos os limites morais - não que eles lembrassem do sentido da palavra - eram ultrapassados e eles se agrediam. Ainda lembro-me da primeira vez que eu tentara apartar a briga. Defender os últimos resquícios de honra de minha mãe e de nossa família. Ainda carrego a cicatriz em meu peito até hoje, e no sentido mais literal da palavra.

A última briga ultrapassara qualquer limite - era o que eu achava, fora a mais assustadora de todas, os ruídos de vidro se quebrando simbolizavam a nossa destruição que viria a acontecer dias depois, no meu mais fatídico aniversário. Como de costume, eu segurava meu irmãozinho no colo e o enrolava num cobertor, como se pudesse o por num casulo e só tira-lo de lá quando as coisas melhorassem. Era injusto que ele passasse por isso, tinha apenas 5 anos, era um bebê. Mesmo eu, quando tinha 5 anos, não passei por isso, ainda tinha uma família de verdade na idade do pequeno. E toda vez que penso que sou a única pessoa que ele tem, a dor me invade e eu penso que eu não chego nem perto de ser alguém que ele merece. Abraço ele por cima dos lençóis e afundo o rosto em seus cabelos, sentindo o seu cheirinho de criança. Não podia chorar, não agora. Então deixei que ele o fizesse até dormir. A única coisa que podia fazer por ele era cantar, e cantei, cantei até a minha própria exaustão. Cantei até que ele estivesse vencido pelo sono, cantei compulsivamente até que eu estivesse vencido pelo sono. Como eu gostaria de apagar essas marcas de Yan, mas eu sabia que não seria possível, as marcas estavam em mim e nele e ficariam para sempre.









Quando as Coisas São do Jeito que São [Revisão]Onde histórias criam vida. Descubra agora