Capítulo dezenove - O desespero continua

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Batidas fortes e rápidas na minha porta.

— Vá embora. – Gritei, minha cabeça ainda doía da noite anterior.

Depois de ver o corpo de Patricia as coisas começaram a ficar automáticas, fiz o que sempre fazia. Esconder provas, me livrar de roupas, limpar e guardar as ferramentas.

Levantei-me e me dirigi calmamente até o banheiro, não estou me sentindo muito bem hoje, mas eu tenho que sentir o desespero de todos quando a morte chega tão próxima.

Coloquei uma roupa normal, simples e sai.

O céu estava levemente nublado, as nuvens cinza pareciam que iam se transformar em monstros a qualquer momento. Mas que bobagem, os únicos monstros que são reais são as pessoas.

Chegando à sala as coisas pareciam meio tensas, havia garotas chorando histéricas como se o ídolo fútil de uma bandinha fútil tivesse anunciado que iria deixar essa carreira, fui ao meu lugar me sentindo enojada. Não avistei Bryan, o que será que ele deve estar fazendo agora? Sofrendo? Me sentia tonta só de pensar que ele estivesse sofrendo por alguém como Patricia, eu dei a ela a liberdade... Também é o que desejo para mim.

Um homem alto e grisalho entrou na sala, e todos foram aos seus respectivos lugares, pareciam cachorrinhos com medo de seu dono.

— Eu acho que a maioria de vocês já sabe o acontecimento terrível que ocorreu aqui! – Sua voz saia devagar demais. — Nossa amada aluna, Patricia, fora assassinada nas dependências desse lugar.

Amada?

Gritos histéricos ecoaram pelo lugar, o desespero tomou conta da atmosfera. Lindo desespero, o cheiro dele é tão bom, a companhia do desespero que assombra minha alma é a melhor, é verdadeira.

— É por isso que comunicamos que vamos encerrar nossas atividades por enquanto. – Senti o nervoso tomar conta de sua voz. — Não sabemos quando voltaremos. Sinto muito!

Ele saiu do recinto deixando meia dúzia de alunos inconsoláveis para trás, parecia que seu corpo não poderia ficar ali.

E como se um sinal tivesse tocado na cabeça de cada um, todos levantaram. Seria lindo se não fosse ridículo.

Meus pés se movimentaram me sentindo leve como o vento, de um jeito devastador.

E foi só isso...

Meu corpo não aguentou, comecei a cair, pude enxergar os olhos arregalados de todos enquanto caia em câmera lenta. Alguns penetravam em mim e outros apenas observavam o desenrolar desse pequeno acontecimento.

Senti algo forte me puxar, e então fechei os olhos.

Apenas eu e minha escuridão.

Sussurros. Quem é você? Gritavam na minha cabeça, "quem é você? Quem é você?" se intensificavam, maldição!

Minhas pálpebras não queriam ser abertas, mas mesmo me forcei a abri-las, enxergar como o mundo é horrível sempre é necessário.

— Oh, como está se sentindo? – Uma voz doce surgiu de algum lugar que eu não conseguia ver, parecia tão distante. Nem mesmo poderia tocá-la.

Olhei em volta com dificuldade e não via ninguém. Forcei-me a virar a cabeça para o lado e vi minha blusa em uma cadeira branca que me deixava com dor de cabeça.

Olhei para o meu braço com suas cicatrizes expostas, uma agulha estava injetada nele, voltei minha visão para cima e vi soro, aquilo que estava injetado era soro.

— Alexia? – a voz ficou mais forte.

Me sentei e dei graças por estar com minha roupa. Forcei minha visão a focar em uma silhueta, e era...

— Bryan? – O encarei.

— A quanto tempo você não come? – Sua voz estava trêmula.

Ignorei sua pergunta arrancando aquela maldita agulha de meu braço, não ouvi Bryan dizer nada.

— É difícil né? – Ele tocou meu braço com sua mão fria, que fez minha pele se arrepiar.

— Se você está falando da morte de Patricia, eu não me importo. - Sentei, deixando meus pés a centímetros do piso frio. – O que está fazendo aqui?

— Daniel te trouxe para cá. Ele estava lá. – Ele fechou os olhos. — Eu não fiz nada. Eu... Eu... Eu nunca estou lá.

A porta se abriu em um rangido agudo e ensurdecedor. Uma mulher de aparência cansada, olhos focados em uma prancheta, entrou sem um prévio aviso.

— Então, senhorita Alexia, você está com anemia. Deixarei aqui algumas providências que deverá tomar. – Diz curta e grossa. — Aqui não é um hospital. – deixa um papel em cima de uma mesa branca com flores vermelhas murchas.

Tão rápido quanto entrou, ela saiu.

—Tchau, Bryan! – Coloco meus pés no piso e sinto meu corpo fraquejar, me seguro na cama e respiro fundo.

— Quer ir viajar comigo, agora? – Ele fala rápido antes que eu tenha oportunidade de encontrar meus sapatos.

— Não!

Vejo seus olhos ficarem profundos, ele está diferente. É impressão minha ou ele não sente nada por Patricia? Pela morte dela?

Saio pela porta sem nem mesmo lhe dar tempo de me proferir qualquer palavra

Sapatos nos pés, blusa na mão, bolsa e até peguei aquele papel que a mulher deixou.

Comecei a olhar enquanto ia em direção a escada.

— Blablabla, anemia, blablabla. – Leio fragmentos em voz alta sem nenhum interesse.

Depois de incríveis muitos lances de escada e corredores vazios, finalmente posso avistar o portão. Contínuo de olho no papel.

Aí.

— Olha por onde anda, moça! – Uma voz meio rouca vem da minha frente.

Contínuo de olho no papel. — Ah, por favor – olho para cima. — Cale a bo... Christian?

Fico perplexa, meus músculos paralisam. É mesmo ele? Cabelos dourados, olhos claros... Ah, ele continua magro, porém parece muito mais forte, é mesmo ele. Meu irmão!

Está vestindo um sobretudo preto, parece tão importante. Meu irmão?

Saio correndo em direção as escadas do colégio, por que estou voltando aqui pra dentro? Sim, isso dói, minhas pernas tiram forças da dor para continuar. Avisto Bryan vindo e corro em sua direção.

— Certo, eu vou com você. Me pega que horas? Seis e meia pode ser? Ótimo. –Começo a correr para fora novamente.

Passo por ele e nem o olho nos olhos. Saio do colégio, e contínuo correndo.

O vento está particularmente gelado e assustador.

Apaixonada Pela TorturaOnde histórias criam vida. Descubra agora