- Não me interessa, eu a levarei comigo.
- Há. Só por cima do meu cadáver.
O mostrador florescente do relógio mostrava que eram duas da manhã, mas ao contrário do que sempre acontecia naqueles horários, eu não fora acordada com desejos malucos que me levavam a comer metade da geladeira ou misturar os ingredientes mais loucos que eu pudesse encontrar.
Todas as noites, desde que eu e Liam havíamos voltado para nosso apartamento, eu acordava, andando pelos corredores de madrugada, insone e faminta. O que me levava sempre de volta à cozinha, tomando todo o cuidado possível para que Liam não me ouvisse e tivesse de se levantar, preocupado.
Ele estava sendo um companheiro excelente. Toda a atenção que, um dia, eu reclamei não receber, estava me sendo dada e em dobro. Em doses cavalares. Liam me ligava de hora em hora, quando estava nos ensaios, buscando saber se eu estava bem ou se eu precisava de alguma coisa. Fazia o meu café da manhã e quando voltava para casa, sempre me trazia algo para comer. Rosquinhas, chá gelado ou o que qualquer gourmet, perto de onde ele estivesse, vendesse.
Além de passar todos os seus momentos livres comigo. Eu conseguira o que eu sempre buscara: o amor incondicional de Liam.
Mas a que preço?
E por que eu me sentia uma vadia egoísta ao saber que agora que eu conseguira o que eu tanto queria, eu não me sentia completamente confortável com isso. Era fácil responder essa pergunta. Apenas um nome a respondia: Zayn.
Eu me arrependia amargamente de ter ligado para ele e confessado que eu de fato o amava. Mas era aí que estava o problema, eu amava e sentia muito por tê-lo deixado, mas ao mesmo tempo, eu amava Liam e estava feliz que as coisas estivessem dando certo entre nós, como sempre fora antes de toda aquela confusão.
- Ela é tudo para mim, eu te agradeço por me mostrar que eu estive errado, que eu não soube antes o que eu tinha nas mãos, mas agora eu sei, e pretendo cuidar para que ela saiba disso com a minha própria vida, se for preciso,
- Você está errado.
As vozes eram tão familiares que eu não precisei esforçar a minha mente sonolenta a reconhecê-las. O meu próprio corpo já sabia que eles estavam próximos, na cozinha, discutindo sobre mim.
Levantei-me com pressa, parando no pórtico da entrada da cozinha, ouvindo os gritos sussurrados numa tentativa falha de não me acordar. Suas vozes reverberavam pelo amplo apartamento e como sempre acontecia quando eles estavam em suas guerrinhas particulares, eles nem sequer notaram a minha presença ali, mais focados em sua pequena guerra particular.
E o que eu era naquele meio? O prêmio? A bandeira branca?
Saber que eu mesma havia criado aquela situação me fazia ainda mais decepcionada comigo mesma. Que tipo de mulher eu era?
Eu havia me escondido naquele apartamento por medo. Eu sabia que havia feito a escolha mais sábia. Eu amava Zayn, eu aprendera a amá-lo ao ver o quanto ele me amava, o quanto me apreciava e como demonstrava que estaria comigo independente do que fosse. E por ter aprendido que esse sentimento era forte e por muitas vezes irracional, eu estava fazendo o correto e o deixando longe de mim. Longe da possibilidade de que ele virasse as costas para tudo o que ele conhecia de bom e concreto para ficar com uma vadia traidora, como Liam já havia apontado que eu era uma vez.
Zayn jamais entraria naquele apartamento, era o que eu pensava, completamente furioso com Liam, ele jamais "pisaria em território inimigo". E essa era a minha salvação. Zayn Malik era inteligente demais, eu sabia que ele me cercaria no café. Por isso eu ligara para os meus empregadores e explicara que, por mais que eu adorasse o emprego, eu estava passando por algumas dificuldades e precisaria ficar em casa por algum tempo. Pelo menos até a poeira abaixar e Zayn desistir e esquecer de toda aquela bagunça onde eu o metera.
- Eu nunca amei nada em minha vida como eu amo a Mandy.
- E nunca a amará como eu a amo. - Zayn disparou de volta, irritado, como se o que Liam falara fosse uma ninharia perto do que ele sentia.
Intenso, Zayn sempre fora mais intenso.
- De que adianta tudo isso Malik? Ela nunca será sua. - a raiva fez Zayn fechar os punhos e se afastar do balcão, indo até a geladeira e encarando o seu painel digital, pensando bem em seus atos, não tentando fazer nada do que pudesse se arrepender depois. - Ela é minha.
O soco que deveria ser dado no rosto de Liam atingiu a minha querida geladeira com toda a força, fazendo o eletrodoméstico sacudir com força. Por todos os Deuses, eu nunca havia visto Zayn tão bravo em toda a minha vida, talvez nem Liam que um dia fora o seu melhor amigo chegara a conhecer esse lado agressivo de Zayn.
Mas ele não parecia se intimidar. Era o novo Liam que estava ali, Não o meu doce companheiro que cuidava de mim com todo o zelo, mas o homem que havia transado comigo na escadaria de um prédio, o homem que não pensara duas vezes antes de me ofender e humilhar, deixando bem claro que eu merecia todo o seu desprezo e me condenar a mendigar o seu amor.
O novo Liam continuava de braços cruzados, inabalável, como se apenas estivesse discutindo o tempo. Ele estava com o seu pijama azul, mas isso não o deixava menos sarcástico ou provocador. Ele estava levando Zayn ao seu limite, deixando que o outro perdesse a razão. Ele não precisava brigar, ele me tinha. Qual era o propósito de brigar por algo que você já possui senão ver o seu oponente chorar de desejo de ser você e ter o que você tem?
- Você está errado, Payne.
Também não era o vaidoso e misterioso Zayn Malik à minha frente. Era uma cópia sua, desleixada, colérica e determinada. No limite de seu controle.
