VINTE E UM

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Zayn Malik

Deixei que a minha voz ecoasse pela cozinha bagunçada e com os móveis todos fora do lugar enquanto Usher me acompanhava com o seu timbre mais agudo que o meu, cantando sobre alcançar o clímax.

Era quase automático que Mandy viesse à minha mente no mesmo instante. Que a voz dela me embalasse, que as imagens mentais fossem feitas. E eu me odiava por isso. Me odiava por saber que ao invés de esquecer e seguir em frente, eu estava fazendo tudo do jeito errado.
Eu comprara o apartamento dela. O lugar onde eu aprendera mais sobre mim mesmo em poucos meses do que em minha vida inteira. O local onde eu entendera que o amor é bem maior do que apenas o desejo pela carne. Eu a amava, amava à Liam e também já sentia o meu coração repleto de amor pela pequena Marjorie Widad que nem sequer havia nascido.
Por causa desse amor eu havia pintado todos os cômodos da sala, decorando-os como eu imaginava que eles fossem querer que estivesse decorado.
A sala pintada em de branco com apenas uma parede em um vermelho intenso, a minha cor favorita, contava com um quadro enorme de Mandy, em preto e branco na parede vermelha, com a estante de livros que ela sempre sonhara e um sofá macio que Liam certamente aprovaria.
O quarto tinha, agora, uma cama gigantesca que Liam e Mandy, como as duas crianças que eram, pulariam assim que a vissem, pintado de creme, o armário estava embutido para fazer aquele local minúsculo parecer maior e, todas as noites quando eu me deitava naquele lugar, eu me lembrava de como ele era com a presença dos meus dois amados e me sentia mal. Me sentia só.
O quarto de Marjorie Widad, no entanto, era o meu local favorito. Eu não colocara nenhum móvel ali. Apenas o móbile feito por Liam no teto e uma pequena placa com o nome dela em letras cursivas pendurada na porta.
Louis era, no momento, o único que sabia que eu estava morando naquele lugar e, inclusive, estava me ajudando com algumas coisas. Como terminar a decoração da cozinha e entender os meus próprios sentimentos.
Eu amava Mandy. Isso era óbvio, certo, irrevogável, aliás. Mas eu entendera que toda aquela briga com Liam não era apenas porque eu acreditava amar Mandy mais do que ele, mas porque me machucava a idéia de que ele poderia amar Mandy mais do que me amava.
Eu não era gay. Não de todo, eu acreditava. Se eu fosse, eu não teria tanto desejo por Mandy.
Mas não podia negar que o sentimento que eu nutria por Liam ia além de uma amizade. E por muito tempo eu pensara que esse tipo de sentimento não era saudável. Não era correto.
E quando eu entendera que era aquilo que eu sentia, que eu amava os dois igualmente, que eu queria que os dois fizessem parte da minha família, eu fiz questão de terminar tudo. De me colocar de fora daquilo.
Não era certo. Não era normal.
Uma família não era assim. Um casal era um homem e uma mulher. Por que, então, dentro de mim havia algo que refutava essa afirmação com toda a sua força. Nem tudo era normal.
As melhores coisas da vida nasceram de momentos arriscados.
Mas eu não deveria me sentir arrependido. Eu estava dando à Liam a chance que ele tanto queria, ele estava podendo ter o seu filho e ser, finalmente, o Daddy Directioner. Mandy tinha o pai perfeito para a sua filha, tinha um marido atencioso, e eu sabia que eles não cometeriam os mesmos erros. Eles haviam aprendido.
Só eu que não havia aprendido.
Eu continuava querendo ter os dois comigo e ir contra tudo o que eu havia aprendido. Ir contra tudo e contra todos.
- Se você os quer, você tem que lutar por eles. Não vai ser fácil. Mas quem disse que a vida é fácil? – Louis dissera, horas antes, enquanto estudava uma paleta de cores, me ajudando a pensar na melhor cor para pintar a cozinha.
- Mas Marjorie...
- Marjorie Widad ficará imensamente feliz em ter os dois pais mais desejados de todo o mundo.
Ela será uma Payne-Malik e terá Mandy como mãe. O que poderia ser melhor que isso, a não ser ter Louis Tomlinson como seu amado padrinho?
Eu dei uma risada sem humor e continuei passando a massa corrida, como ensinava no livro de "faça você mesmo" que eu havia comprado para me ajudar naquela reforma.
- Não posso fazer isso.
- Foi o que você disse quando teve de dançar no Bootcamp e veja só onde você está. – ele lembrou enquanto colocava uma mão no meu ombro. – Nunca vi você como um homem medroso, Zayn. E é justamente por isso que eu o admiro. Você foi o primeiro de nós a se sentar naquela cadeira de tattoo e dizer o que queria tatuar, como se não tivesse medo de nada. Você desenhou algo que jamais poderá apagar em sua pele e não teve medo disso. Não acha que está na hora de usar essa mesma coragem e fazer mais uma tatuagem. Tatuar aqueles dois dentro de você?
- Eles não entenderiam.
- E se eles sentissem o mesmo? E se eles soubessem que isso só funciona quando vocês são um triângulo? Que não é só Zayn e Mandy ou Liam e Mandy, mas Zayn, Mandy e Liam?
- Então seriamos nós. O nós que eu sempre quis.
Eu assenti, sentindo um pingo da coragem que Louis estava lutando para me convencer que eu tinha e me senti bem ao admitir que eu não queria apenas um nós dois, mas um nós. Não nós três, não era necessário dar um número para aquilo, um gênero, uma cor.
Éramos apenas nós.
Ainda agora eu me lembrava das palavras de Louis e me sentia bem. Mesmo que eu não fosse fazer nada para seguir o seu conselho. Eu estava bem do lado de fora da vida deles. Sem traumatizar nenhuma criança no futuro, sem causar mais brigas, sem ver os olhos de Mandy confusos por não saber a quem de nós dois ela amava mais.
Apesar de eu já ter visto que ela nunca escolheria. Ela sempre quis a nós dois. Ela aprendeu a nos querer da mesma forma. Eu sabia disso porque eu me sentia da mesma maneira.
- Não gosto dessa cor. Ela é muito...
- Normal. – a voz de Mandy, completando a frase de Liam, me fez dar um passo para trás, assustado, incapaz de acreditar que ela pudesse realmente estar ali.
Mas ela estava. E sorridente. Ao lado de um também sorridente Liam, com os olhos tão brilhantes do que eu jamais havia visto.
Algo se revirou dentro de mim. Como borboletas voando alvoroçadas dentro do meu peito, me fazendo sentir um aperto estranho.
- Você gosta de coisas normais, Zayn? – ela perguntou, ainda com aquele sorriso.
Eu era o único que percebia que, desde que ela engravidara, ela adquirira um brilho luminoso que parecia acompanhá-la a todo instante. Era como se Mandy brilhasse apenas por carregar em seu ventre a minha pequena Marjorie Widad. A nosssa Marjorie.
- Não. Não gosto.
- Nós também não. – Liam disse e retirou a sua mão do ventre de Mandy, onde ela estivera durante todo aquele tempo e caminhou na minha direção.
Liam Payne abriu seus enormes braços diante de mim e exibiu o seu melhor sorriso. A sua oferta era clara, mas talvez os meus sentimentos estivessem me nublando, me forçando a entender tudo da maneira errada. O encarei com uma desconfiança nítida e vi Mandy sorrir ainda mais largamente. Como se as coisas não estivessem confusas desde aquela tarde em meu apartamento.
Como se eu não tivesse me apaixonado terrivelmente por ela apenas para perceber que o amor pode ser bem mais do que aquele sentimento comum.
Aquele sentimento normal.
- Você fez a sua escolha, Zayn Malik. E agora eu fiz a minha. – ela encarou Liam que continuou com os braços abertos, mas um de seus fortes braços rodeou o pescoço de Mandy, o outro ainda estendido na minha direção, esperando que eu entrasse no seu abraço. – Nós fizemos a nossa.
- Somos um triângulo, Zayn. E estamos aqui para te dizer isso. Pra te dizer que não há uma forma melhor de fazer isso senão juntos. Somos incompletos separados. Não há Mandy sem você ou eu. E não há um Liam sem você ou Mandy. Não é apenas um eu e você, somos nós.
Aquilo era real?
Estava realmente acontecendo? O que eu tanto queria estava acontecendo mesmo? Liam e Mandy estavam ali para desafiar o mundo ao meu lado, para fazer tudo do nosso jeito?
- Eu nunca fui capaz de escolher um de vocês e agora eu sou realmente capaz de fazer uma escolha, Zayn. Eu escolho a vocês dois.
Meu coração bateu mais forte. Ela havia nos escolhido. A nós dois.
- E se você pode escolher, Zayn, então eu também posso. E eu escolho a vocês dois.
Fechei os olhos, sentindo uma alegria imensa tomar conta de mim. A coragem que Louis dissera que eu tinha finalmente saíra de trás de uma cortina de insegurança e solidão, de medo do que as pessoas poderiam pensar, medo da rejeição, e estava se mostrando inteiramente agora. Eu sentia a coragem, a alegria. Eu era capaz de lutar contra tudo e contra todos naquele momento. Contanto que eu pudesse ficar com aquelas duas magníficas pessoas à minha frente, eu seria capaz de fazer qualquer coisa.
- Queremos, então, saber se você quer mudar de ideia. – Mandy disse, com um sorriso tímido dessa vez, que mostrava que ela não estava inteiramente certa de que eu aceitaria a sua ideia maluca. – Sabe... tentar fazer uma nova escolha.
Os seus dedos lindamente inchados entraram por dentro da camisa de gestante que ela usava e retirou um cordão de prata com um pingente. Aproximando o cordão dos meus olhos, Mandy revelou que o pingente não era o que eu pensava e sim uma aliança.
Liam fez o mesmo, enfiando a mão por dentro da camiseta branca e justa e retirando o mesmo cordão que pendia do pescoço de Mandy.
- Quer tentar desafiar os padrões do normal ou correto e fazer isso de uma maneira nova, Zayn Malik?
Um objeto foi erguido por Liam e se revelou ser o mesmo pingente que estavam com eles.
Havia um lugar para mim ali. Eu pertencia a algum lugar, finalmente.
Eu me sentia eu mesmo e me sentia bem com isso.
- Quer tentar não ser uma parte desse triângulo? Quer fazer desse nó?
O sentimento me inundou de vez e eu me atirei para frente, agarrando os dois num abraço tão forte que por alguns momentos, temi sufocá-los, mas não. Eu fui abraçado com a mesma força.
Eu me senti inteiro. As duas partes de mim estavam comigo novamente e estávamos tão juntos como poderíamos estar.
Havíamos feito as nossas escolhas e elas nos levaram ao melhor final possível.
Não poderiam nos chamar de casal, ou de triângulo amoroso.
Talvez um pronome ajudasse.
Um pronome bom o suficiente para nos descrever.
Eles? Não, melhor.
Nós.



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