Capítulo 2

4.4K 334 53
                                    

Música sugerida para leitura: Maroon 5 - Come Away to the Water

Enquanto terminava de comer meu penne a carbonara nem passava pela minha cabeça que seria a minha última refeição em um restaurante. Caio estava procurando informações no celular e eu resolvi ligar para o meu pai para falar de uma maneira fofa sobre o possível apocalipse zumbi. Depois de duas tentativas ele me atendeu.

– Estou prestes a entrar em reunião. Seja breve, Lara.

– Também estou com saudade, papai. Te liguei pra saber se você está sabendo da invasão de zumbis. Você tem algum lugar para se esconder ou algum estoque de comida? – disse de forma séria mas eu mesma escutava isso com vontade de rir.

– Não seja infantil. Estou realmente ocupado. O que você quer?

– Pai. É sério. O pai do Caio está em uma cidade que foi vítima de uma empresa, eles despejaram alguma coisa na água dessas pessoas e elas começaram a comer as outras. O pai do Caio enviou uns vídeos assustadores com alguns moradores da cidade devorando outras pessoas. Não estou brincando.

– Quem é Caio? Aquele maconheiro que passou os últimos cinco anos trancado no seu quarto usando drogas?

– Foi apenas uma vez! A gente resolveu experimentar e você apareceu para estragar tudo. Pai, por favor, me escuta. Você tem algum lugar seguro para ficar? Eu vou para casa do Caio, ele tem algumas armas, comida e água. Se a coisa ficar feia não vou conseguir estar perto de você.

– Lara, eu realmente espero que você amadureça e pare de acreditar nessas maluquices que um maconheiro fala. Mais tarde eu te ligo. Tchau.

Desliguei o telefone com a costumeira sensação de fracasso. Minha relação com meu pai sempre fora complicada. Minha mãe morreu no meu parto e ele resolveu se jogar de cabeça no trabalho enquanto eu crescia com babás ao meu redor. Ele era um gênio da tecnologia, trabalhava como CEO em uma grande empresa de nanotecnologia e sempre fora rabugento. Durante muito tempo achei que ele não gostava de mim mas conforme fui crescendo percebi que era muito difícil pra ele lidar com uma versão mais nova da minha mãe. Éramos muito parecidas fisicamente, mas minha personalidade era totalmente herdada do meu pai. Mesmo sendo um rabugento eu o amava e faria qualquer coisa para mantê-lo seguro.

– Meu pai acabou de me ligar. Vamos para casa – disse Caio levantando abruptamente da mesa enquanto carregava sua mochila e minha bolsa.

– O que ele disse? A situação foi controlada? – perguntei torcendo para que meu pai tivesse certo e tudo fosse uma grande bobagem.

– A equipe do exército do meu pai foi orientada a seguir para os centros urbanos. Já começaram a surgir vídeos na internet de ataques, as pessoas estão se alimentando de outras e, em menos de dois minutos, a pessoa mordida volta a vida e começa a procurar sua vítima.

– Certo. Então vamos para sua casa. Não precisamos passar no mercado e pegar mais água e comida? O seu pai não pode receber a gente em algum tipo de abrigo militar?

– Não. Ele disse que estamos sozinhos nessa. Vamos para o mercado e depois pra casa.

Engoli em seco e segui praticamente correndo atrás do Caio. Então eu vi a televisão do restaurante. Estava em um canal de notícias em exibia imagens realmente assustadoras para aquele horário. Parecia de fato um filme de zumbi. O cinegrafista aparentemente estava no segundo andar de algum prédio e filmava o ataque ocorrendo na esquina. Uma mulher loira com um vestido justo estava descalça e com uma mordida grotesca no braço esquerdo. Ela estava caminhando de forma lenta até um jovem de terno cruzar seu caminho, o homem se aproximou, provavelmente para oferecer ajuda, mas assim que ele se curvou para ver o ferimento no braço dela a loira deu uma mordida no pescoço dele. A primeira coisa que pensei foi "por que diabos a TV não corta essa cena? Estamos no horário do almoço! Devem ter crianças assistindo isso". Estava prestes a falar isso com o Caio quando ouvimos um estrondo absurdo. Um carro tinha acabado de literalmente invadir o restaurante. Caio me puxou com um reflexo e seguimos correndo em direção ao estacionamento.

– O que você está fazendo? Você não deveria oferecer ajuda? – questionei sem perder velocidade.

– Não tinha ninguém no volante daquele carro. Ou alguém pulou com o carro andando ou alguém vai sair dali de dentro a qualquer momento. Vamos sair daqui.

Fechei minha boca e segui ainda mais rápido. Assim que o Caio abriu o carro já estávamos em movimento. A rua estava estranhamente vazia para o período da tarde, encaramos isso como um sinal de sorte até que finalmente avistamos o supermercado. Eu nunca imaginei que presenciaria alguma coisa parecida com aquilo. Meu cérebro ainda não tinha se acostumado a nova realidade que estávamos prestes a conhecer então eu simplesmente travei quando o Caio pegou uma arma do porta-luvas e mandou eu sair do carro.

– O que você vai fazer? Olha para esse lugar, não vamos entrar!

– Vamos logo, Lara. Quanto mais rápido entrarmos mais rápidos vamos sair. Fica do meu lado.

Demos apenas alguns passos antes de ouvirmos o primeiro disparo dentro do mercado. Todas as janelas estavam quebradas e porta de vidro estava estilhaçada. Muitas pessoas saíam com muitos produtos na mão então quando encontrei uma sacola plástica grande no chão me abaixei pra pegar. Caio estava atento e mantinha a velocidade constante. Assim que chegamos a porta conseguimos ter um vislumbre do inferno que estava lá dentro. Mulheres desesperadas tentava pegar mercadorias jogadas no chão enquanto seguravam crianças no colo. Homens armados pegavam os produtos mais caros realmente aproveitando da situação para se dar bem. Por sorte percebi que a porta que dava para o depósito estava fechada então fui guiando Caio nessa direção. Quando estávamos saindo do corredor de carnes e entrando na seção de massas encontrei o primeiro cadáver. Por incrível que parece ele não tinha sido atacado por um zumbi. E isso embora tenha me surpreendido me assunto mais do que eu gostaria admitir. A marca da bala estava no meio da testa da jovem mulher de vestido azul estirada no chão. Mil perguntas passaram pela minha cabeça mas preferi simplesmente pular o cadáver, buscar o que precisávamos e voltar para o carro o mais rápido possível.

A porta obviamente estava trancada e somente após algumas tentativas Caio conseguiu arrombá-la. Quando entramos focamos logo no que importava: água, fósforo e algumas alimentos enlatados. Caio decidiu ficar de guarda enquanto eu caçava os itens. 15 minutos após o início da busca a primeira pessoa tentou abrir a porta. Caio fez esforço e impediu a entrada o máximo que conseguiu até que se afastou pensando que a pessoa finalmente tinha desistido. Para nossa surpresa um estrondo seguido de um clarão nos fez perceber o quanto estávamos enganados. A pessoa do lado de fora deu um tiro na fechadura na tentativa de arrombar a porta. A bala não atingiu Caio por alguns milímetros de distância. Chega a ser engraçado como nosso cérebro consegue se adaptar a mudanças em uma velocidade tão incrível. Na manhã desse mesmo dia se alguém tivesse me falado que o Caio quase seria baleado enquanto saqueávamos comida de um depósito eu rolaria no chão de tanto rir. Nesse momento eu só queria sair dali sem que nenhuma tragédia acontecesse. Com a sacola cheia de coisas finalmente decidimos fazer o caminho de volta para o carro, só não contávamos com alguns imprevistos.

Assim que o Caio abriu a porta conseguimos ouvir os gritos de pânico de uma forma mais clara. Dentro do depósito os gritos eram apenas um ruído incômodo, nada tão desesperador ou que me fizesse ter vontade de correr sem olhar para trás. Quando finalmente alcançamos o meio do mercado entendemos o motivo do barulho. Perto de um freezer cheio de sorvetes um policial devorava o pescoço de uma adolescente de aproximadamente 15 anos. A garota berrava e se debatia, mas o homem era muito mais forte e a mantinha totalmente presa. Percebi que Caio pensou a mesma coisa que eu quando ele empunhou a arma e mirou na testa do policial. Isso despertou a atenção do zumbi, quando ele nos encarou entendi que atirar nele não resolveria o problema. Aquela garota já estava condenada ao mesmo destino. Voltei a caminhar em direção a saída quando dois disparos me fizeram dar um pulo.

– Por que você atirou neles? – questionei realmente sem entender a razão do Caio.

– Quanto menos zumbis maior a probabilidade deles devorarem quem a gente ama. Esse cara poderia devorar seu pai e essa garota poderia devorar o meu. São menos dois. Já estamos no lucro.


Sexo, armas e zumbisOnde histórias criam vida. Descubra agora