CAPÍTULO 3 - CATORZE ANOS MEDÍOCRES

231 24 2
                                    

Os próximos catorze verões foram agonizantes. Aquele final de tarde lembrava como a vida passara devagar. Um garoto com uma aparência desbotada se esticava sobre a grama alta, usando calças jeans e uma blusa azul-marinho. Seus olhos amendoados fitavam o céu alaranjado enquanto seus cabelos desgrenhados estavam caídos sobre as sobrancelhas. Tinha olheiras, parecia passar por insônia, e um nariz vermelho com cravos. Uma voz vinda do interior da casa o chamou:

Thomas, venha se servir! – o garoto levantou sem nenhuma empolgação, com os olhos despreparados para largar as estrelas que vagamente apareciam no infinito.

Seu pai, sentado num sofá vinho, o aguardava na sala. O jornal um pouco amassado escondia seu rosto.

– Filho, garanto que a comida está melhor hoje – falou com ímpeto – Alguma coisa deve ter saído com auxílio desse livro que o seu amigo me emprestou.

Eu não entendo – disse o garoto ao se sentar na mesa. Algo como um guisado verde cercado de caldo o aguardava no prato, pronto para ser comido – Como um dedo quebrado fez com que sua comida piorasse desse jeito, pai? Por que não pede ajuda?

– Não se preocupe, um jantar eu consigo fazer, mas eu vou ter que lhe pedir para dar uns tapinhas nessa televisão, já que o gesso me atrapalha.

Thomas apressou-se para ajudá-lo, ficar longe do cheiro do guisado era uma glória. Ele tentava, ao máximo, agradar ao pai mesmo não sabendo o quão recompensado ele era. Robert fazia de tudo ao alcance para dar ao filho tudo o que ele queria, todavia o dinheiro lhes dava adeus.

Logo que o chuvisco na televisão sumiu, o garoto mostrou uma feição preocupada e sentou-se ao lado do pai.

– Sobre essa casa...

– Eu já pedi para não insistir mais neste assunto! – o homem abaixou o jornal, mostrava-se mais maduro; barba e bigode mal feitos, o cabelo era oleoso e curto, jogado para trás. Tinha sobrancelhas espessas e ralas, nariz grosso e um olhar triste.

– Não podemos fugir disso! Parece que eu sou o pai e você o filho! – falou Thomas. Eles se olharam com discórdia.

– O que você quer que eu faça?

– Peça mais dinheiro emprestado para os meus padrinhos.

– Thomas, eu nunca escondi nada de você, sempre falei a verdade. Eu nunca tive dinheiro e, desde quando você nasceu, minha conta com a Simone e com o Roger só cresce...

– Você quer mesmo que sejamos despejados? – falou o garoto ao competir com a voz grossa do pai. Parecia que Robert se alterava com facilidade e, embora enxergasse a realidade, o orgulho às vezes o cegava. Esse foi um dos motivos pelo qual Thomas desenvolveu cada vez mais uma certa ingratidão com pessoas orgulhosas como seu pai.

– Se já comeu sua comida, escove os dentes e vá dormir.

Aquala e o Castelo da Província (vol. I)Onde histórias criam vida. Descubra agora