Por Peeta
Ainda estou em frente ao armário onde guardamos os remédios, com as portas abertas, mas sem realmente prestar atenção ao que está guardado em seu interior.
Meu pensamento viaja e perpassa diversas imagens, das mais lindas às mais sombrias: o sorriso de Katniss para Prim na vitrine da padaria, a colheita dos tributos mortos nos últimos anos, a escolta do Distrito 12, Effie Trinket, sorteando o meu nome na próxima quarta-feira...
Não estava pensando nisso enquanto conversava com o Michael, mas agora tenho o pressentimento de que essa Colheita, de alguma maneira, será um divisor de águas para mim.
Isso nunca aconteceu em nenhuma das quatro cerimônias das quais já participei. Sinto uma urgência em meu peito, como se esses fossem meus últimos dias e eu não tivesse outra chance de realizar meus desejos mais profundos.
Tudo o que sonho dar e receber de Katniss. Um sorriso, uma palavra, um toque, um beijo.
Meu coração acelera só de pensar que eu preciso sair dessa inércia, pois não terei mais tempo e só me restará arrependimento.
Meu pai se aproxima de onde estou e eu desperto dos meus devaneios.
— O que está procurando nesse armário, Peeta?
— A pomada para queimaduras.
— Estamos sem ela realmente. Já encomendei ao boticário há alguns dias, mas parece que não ficou pronta ainda.
— A dor já está diminuindo, de qualquer forma – exagero, para não deixá-lo preocupado.
— Veja o lado positivo. Não é sempre que nós temos a pomada e as cicatrizes que ficam viram o nosso diferencial com as garotas – graceja meu pai, exibindo as marcas em suas mãos. — Mas, falando sério, o que aconteceu? Michael disse que você está preocupado com a Colheita e, por distração, acabou se queimando.
— De certa forma, sim – confirmo, sem revelar que Michael omitiu a parte do susto que ele me deu. — Estou com um pressentimento diferente dessa vez.
Meu pai me fita com o olhar pesaroso.
— Sinto muito, filho. Não posso livrar você ou o Brad da Colheita. O máximo que pude fazer foi garantir que não precisassem das Tésseras.
— O senhor tem razão – comento com tristeza. — Só posso ser grato a vocês por nunca ter faltado alimento em nossa mesa e não ter sido necessário me inscrever para as Tésseras.
Em vários Distritos, qualquer criança entre 12 e 18 anos pode se inscrever para receber a Téssera, um pequeno suprimento anual de grãos e óleo.
No entanto, isso não é nenhuma liberalidade da Capital. Em troca, a criança terá seu nome colocado mais uma vez no sorteio da Colheita. A inscrição pode ser feita para receber as Tésseras para cada membro da família e isso significa mais chances de ser um tributo nos Jogos Vorazes. Além disso, o número de entradas no sorteio é cumulativo.
Imagino que Katniss tenha recebido Tésseras para ela própria, sua irmã e sua mãe desde os seus 12 anos, o que faz com que seu nome esteja em 20 fichas na próxima Colheita, enquanto o meu estará em apenas cinco, uma para cada ano de participação no sorteio.
As Tésseras são uma grande injustiça com as pessoas menos favorecidas, especialmente nos Distritos mais pobres. São também um grande exemplo de como a Capital trabalha para manter o ressentimento entre as diferentes classes.
No Distrito 12, por exemplo, praticamente todas as crianças da Costura se inscrevem para as Tésseras, enquanto que nós, os filhos dos comerciantes, somos poupados dessa infelicidade, por não passarmos fome.
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O presente de Peeta para Prim
RandomOs acontecimentos dessa fanfic são anteriores aos do livro "Jogos Vorazes": Alguns dias antes da colheita da 74ª edição dos Jogos Vorazes, o filho mais novo do padeiro do Distrito 12, Peeta Mellark, vislumbra uma maneira de se aproximar de Katniss...