Estava prestes a entrar na faculdade quando conheci Scott Burrows no cursinho preparatório. Um cara quase legal, daquele tipo que usa camisa xadrez sobre qualquer peça de roupa em qualquer ocasião, acha que entende tudo sobre o mundo e que é o cara mais desejado do grupo de pseudo intelectuais da turma. Ele me achava bonita e adorava se gabar para os amigos de que a namorada conseguia ler mais livros do que ele — única informação que ele tinha sobre mim, já que nunca conversávamos.
Era uma coisa de química. Ponto.
Detalhe: nós saímos apenas duas vezes. A primeira delas se resumiu em um lanche no intervalo das aulas e um beijo perto do corredor. A segunda foi uma desastrosa noite depois de uma festa com alguma bebida engraçada que resolvi experimentar. Nunca mais fiquei bêbada depois daquilo, nem saí com Scott Burrows. Mas ele achava que éramos um casal e fazia questão de espalhar a história da festa como fogo pela classe toda, diminuindo gradativamente minhas chances de conseguir com que qualquer outra pessoa realmente interessante e vivendo no mundo real, me notasse antes da faculdade.
Naquele momento dentro do porão da Sra. Fighbright, encarando Kennedy James Dalton e seu cabelo loiro grisalho cheio de gotinhas de chuva; me fazia sentir tão vazia quanto como me sentia ao pensar em Scott. Eu amava meu pai e mesmo que quisesse dar um abraço nele, rir do quanto ele estava molhado e lhe dar uma toalha seca para livra-lo do frio daquela noite; no fundo eu esperava que ele pegasse o maior resfriado da face da terra para pagar pelo que tinha feito comigo.
É, eu estava magoada mesmo com ele. E embora tenha sido um babaca, Scott Burrows nunca mereceu meus desejos negros de que ele morresse de gripe cavalar (mas espalhei discretamente pela sala que ele tinha dotes... pequenos, por assim dizer).
Quando fechei a porta de casa e recebi alguns miados de Tabby de boas vindas, me senti um pouco mais forte. Aquele era o meu território, minhas regras e nenhum homem — fosse rico, inteligente, poderoso ou o que fosse — poderia mandar na minha fúria. Mas meu pai roubou a minha primeira fala.
— Fiquei tão aliviado que você está bem, Ratinha. Eu só imaginava o pior, essa cidade é imensa, todos as manchetes de jornal e notícias que escutamos por aí, seu celular que não atendia, eu...
— Estou bem, pai — apanhei Tabby no colo antes que Kennedy resolvesse me abraçar. Seus olhos já estavam lacrimejados, os lábios apertados pra conter sua sensibilidade de pai bobão.
— O que aconteceu, Kate? — ele olhou ao redor para encontrar onde sentar e puxou a banqueta para perto da cama, onde me encarapitei com Tabby.
— Eu que deveria fazer essa pergunta para o senhor. O que aconteceu com o nosso jantar "de pai e filha"? Uma mudança de planos?
— Mudança de planos? — ele pareceu surpreso.
— Eu estava do outro lado da rua quando Bruce chegou, pai. Vi todo o cumprimento entre vocês, quando ele se sentou na mesa que o senhor disse ter escolhido pra nós. De todas as pessoas nesse mundo, o senhor tinha de convidar Bruce Campbell para jantar com a gente? Eu disse que não queria mais nada com essa loucura de casamento arranjado!
— Mas, Kate...
— O senhor vai dizer que foi tudo uma coincidência?
— Sim! — ele começou a rir como se fosse muito óbvio e arrastou a banqueta para ficar mais perto de mim. Tentou pegar a minha mão, mas desviei, afagando Tabby.
Kennedy suspirou profundamente e tirou seu casaco molhado, dobrando-o sobre os joelhos. Então espantou as gotas do cabelo curto, clássico e bem cortado, procurando meus olhos antes de recomeçar.
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Orleans
Fiction généraleKaterina Dalton nasceu com algumas maldições: os genes azarados de sua família, um casamento arranjado e aniversários fracassados. Decidida a resolver pelo menos um de seus problemas, ela foge da ultrapassada tradição familiar para reiniciar na gran...