Corra, Caio, corra!

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— QUE PORRA É ESSA? – falou Caio enquanto saia do sedan preto alugado de Alberto. "Ele sabia!" - era a única coisa que vinha em sua mente. De alguma maneira o velho urso descobriu que Caio tinha voltado no tempo e desfeito o namoro entre eles. Será que ele sabia sobre Eros? Que o namoro entre eles foi um engano do Cupido? Precisava pensar. Precisava fugir.

— Caio, espera! Deixa eu te explicar... – Disse Alberto, saindo do carro e indo atrás do rapaz. – Não é o que você está pensando.

— Ah, não? – virou-se o jovem – Eu aceito uma carona sua e do nada você vem e me beija?! O que é para pensar?

— Deixa eu te explicar. – insistiu Alberto.

— ALÉM DE SER MEU CHEFE, VOCÊ É CASADO!

Aquelas palavras ecoaram por todo o estacionamento. Os dois se encararam, parados por alguns instantes. Caio seguiu em direção ao elevador, apressadamente. A pouco passos do seu objetivo, Alberto gritou:

— EU ESTOU APAIXONADO POR VOCÊ!

As palavras ecoaram pelo estacionamento e pela mente de Caio. Paralisado, ele tenta compreender a situação. Ele se vira, e volta em direção ao sedan.

— Como assim?

— Aqui não é o lugar para conversarmos sobre isso. Entra no carro, que eu te explico tudo. – falou Alberto, se aproximando do jovem.

— Ah, claro. "Entre no carro", disse a aranha para a borboleta. Que garantia que eu tenho que você vai não tentar algo?

— Por favor. Eu prometo não fazer nada, só quero conversar.

Caio sabia que não devia entrar no carro. E se sentia o cara mais burro do mundo enquanto ajustava o cinto de segurança e fechava a porta.

- - -

Os dois seguiram a viagem em silêncio, embora Alberto tivesse tentado puxar assunto várias vezes. O velho urso dirigiu até um restaurante em Copacabana. Alberto pediu um chope. Caio, uma água tônica com limão. Foi o jovem que quebrou a tensão.

— Bom, estamos aqui. Pode começar a falar.

Alberto estava cabisbaixo, respirou fundo e encarou o rapaz.

— Você já foi casado?

— Tive alguns relacionamentos. Nada sério.

— Sabe, eu amo o Leonardo. Acho que me apaixonei desde a primeira vez que o vi.

— E como foi isso? – indagou Caio, curioso.

— Estávamos procurando estagiários lá no escritório em Poá. Ele foi acompanhar um dos candidatos, que era do terceiro período e ele ainda estava no início do primeiro. Eu fiquei fascinado. O jeito dele, o olhar.

— O cupido te flechou em cheio, entendi. – interrompeu o jovem, ao mesmo tempo que o garçom trazia as bebidas. – Prossiga.

— Eu o convidei para visitar o escritório sempre que quisesse. Então um dia ele apareceu. E outro. E outro. Convidei ele para jantar. E então, quando estávamos saindo do restaurante, ele segurou na minha mão. Eu me sentia um adolescente. E demos o nosso primeiro beijo.

Havia paixão nas palavras de Alberto e Caio mal conseguia disfarçar o seu incômodo. Pensava se na Terra Prime as coisas haviam acontecido dessa maneira. Tentava processar tudo aquilo o melhor que pôde, mas não estava sendo fácil.

— E então?

— Nós começamos a namorar e em um ano estávamos casados. – disse, mostrando a aliança presa na corrente em torno do pescoço.

— Se tudo parece tão bem, o que eu tenho a ver com isso?

— Ah, rapaz. Nem tudo é um mar de rosas. O pior é a diferença de idade. Tem noção que ele não desgruda daquela porra de Nintendo 3DS? Fora que ele só tem olhos para a faculdade e sequer tem interesse em ver como as coisas funcionam lá na agência.

— Vai ver porque ele não se sente pronto para trabalhar com você. Ou não quer misturar a vida profissional com a conjugal.

— Mas não custaria nada ele mostrar um pouco de interesse.

— Já parou para pensar que caso ele trabalhe para você, você vai estar numa posição superior à dele? E que vai ser muito complicado separar as coisas?

— Eu só quero o bem dele.

— Eu acredito. Mas o que diabos eu tenho a ver com isso? Achou que eu seria um lanchinho enquanto seu marido está longe?

Alberto encarou Caio, envergonhado.

— Não. Eu já tinha desejo por você desde que te vi no Bea.rs.

— Oi? Eu não tenho perfil lá há anos. — Disse o jovem, disfarçando certo espanto, pois já imaginava o que tinha acontecido.

— Eu vi o seu perfil, tem uns quatro anos. – continuou Alberto. – Até te mandei um "Oi", mas quando enviei a mensagem seu perfil havia sido deletado.

"Droga!" - pensou Caio. Não havia sido rápido o bastante. A sua intenção inicial era nunca ter tido contato com Alberto até o casamento dos Três Marias.

— Eu cheguei a visitar o site durante algum tempo, a sua procura. – continuou Alberto. – Mas depois de alguns meses, desisti. Então conheci o Leonardo e o resto você já sabe. Mas aí eu te vi discursando no casamento. Nossa, aquelas palavras... E te reconheci. Tentei até me aproximar de você, mas eu não sabia como lhe abordar.

— Realmente, ia ser muito creepy um estranho chegar e dizer: "Oi, você não era o fulano do Bea.rs?".

— Eu até tentei saber um pouco mais de você pelos Três Marias, com o pretexto do discurso. Mas não soube muito.

"Ainda Bem. Mesmo assim, eu devia dar uma voadora tripla em cada um daqueles três" – pensava o rapaz.

— Eu não sabia que você trabalhava na Venture. Fiquei surpreso – e confesso, muito feliz, em te ver lá, naquela reunião. E, à medida que íamos trabalhando juntos, meu sentimento por você só aumentava. Até que não consegui me controlar e te beijei lá no carro.

Caio ficou pensando se na Terra Prime Alberto teve o mesmo tipo de conversa com Leonardo. Imaginou ele reclamando dos seus defeitos, da recusa em trabalhar junto com ele, do fascínio que o rapaz deve ter exercido para ele. Indagou-se se realmente conhecia aquela pessoa que há alguns anos atrás era o seu grande amor.

— Eu acho que, antes de mais nada, você precisa resolver as pendências com o seu companheiro. Todo casal passa por problemas e às vezes nos confundimos com os sentimentos. Te respeito como chefe, mas você é um estranho para mim. Você se apaixonou por uma foto, por um discurso, pelo meu eu profissional. Não posso retribuir esse sentimento.

Alberto ouvia aquelas palavras em silêncio. Caio levanta-se da mesa, pega a sua bolsa e prepara-se para sair.

— Eu te dou uma carona. – insistiu Alberto.

— Não. Melhor não. Eu pego um taxi e amanhã lhe entrego o recibo.

Partiu em silêncio e pegou o primeiro taxi que viu na rua. No trajeto, pegou seu iPod, pôs os fones de ouvido e acessou a sua playlist do Roxette. Quando começou a tocar Fading Like a Flower, não pôde disfarçar as lágrimas que caiam silenciosamente.

Caio não acredita no amorOnde histórias criam vida. Descubra agora