"Havia uma época em que eu me negava a acreditar que isso ocorreu, talvez por uns dois ou três anos seguidos.
Para algumas pessoas, isso era tempo mais que o suficiente para esquecer alguém, para mim, os anos pareciam uma daquelas semanas vazias que parecem ser dias sem fim e noites longas demais.
Toda noite eu acordava suando, achando que estava preso a um pesadelo ao qual não conseguiria sair, mas o real pesadelo era a realidade.
Todas as noites eu me ajoelhava ao pé da cama e pedia a Deus para não ver seus escassos sorrisos em meus sonhos, já não sabia mais se era capaz de os aguentar mais uma madrugada.
Mas eu fui.
Descobri isso quando consegui entrar na faculdade e, depois de anos, consegui me formar. E eu ainda pensava nele, ainda sonhava com seu corpo que mal havia tido tempo de tocar com o amor que deveria, ainda chorava todos os dias.
Eu tinha vinte e dois e continuava a chorar pelo mesmo cara desde meus dezoito.
Eu o amava tanto que nem mesmo conseguia pronunciar mais seu nome sem chorar. Então eu me lembrava que um dia, em meio aos seus desvaneios, ele sussurrou para mim: "E mesmo que se passe anos, nosso amor continuará sendo impossível para ambos".
Eu não sabia se ele estava falando sério, o menino nem mesmo me amava. Não havia tido tempo. Mas eu lembro que o respondi também num sussurro, dizendo que enquanto um de nós continuasse vivo, nossa essência jamais seria esquecida. Eu o abracei e pedi a Deus para ser apenas um dos pesadelos ruins e sem sentidos que estava começando a ter. Não era.
Isso foi uma droga, pois ainda me sinto morto e ele se foi, e nem mesmo a memória poderá ser prova de que um dia existiu amor entre nós.
Eu andei tão preocupado em o salvar, que esqueci de continuar vivo.
E então, um dia eu acordei feliz e simplesmente respirei fundo, dizendo-me que as coisas iriam mudar, já que estava saindo com uma garota a uns bons meses, na esperança dela ter pelo menos o mau humor que o cara que amei tinha, exatamente do mesmo modo.
O procurei em tantos lugares, tantas pessoas, que nem mesmo me toquei disso até o momento em que seu irmão, Nicholas, havia dito em meu casamento.
Um moleque de dezesseis anos havia me dito para acordar e viver a vida do modo que seu irmão não havia vivido, do jeito que não soube e não pode. Lembro-me que olhei-o nos olhos antes dele desviar o olhar até o vidro do pára-brisas de seu carro.
Sua mãe havia morrido e agora ele estava por sua própria conta, tentando viver na casa de amigos mais tempo que na casa de sua tia, já que ela não o suportava.
Tentei o ter em minha casa, mas o garoto me disse que não vivia de lamentações e não queria viver com alguém que não sabia superar o passado.
Superar o passado queria dizer superar ele, e isso eu me recusei a fazer.
Várias e várias vezes.
Mesmo que tenha visto outra pessoa em vestes de casamento em um altar e dito um "sim" um ano antes de uma linda criança minha nascer, ainda chorava.
Minha mulher não se importava, ela dizia que me entendia de algum modo. Sei que ela entendia a dor da perda, mas não entendia o vazio nem o peso da culpa.
Sim, eu me culpava. Me culpo até hoje, para dizer a verdade. Se eu apenas pudesse ter tentado antes, talvez ainda houvesse esperança. Talvez fosse ele a pessoa a meu lado e eu não precisasse colocar o nome dele em meu filho, como uma lembrança permanente de que uns morrem para outros nascerem e alcançarem o que não haviam conseguido primeiro.
E ainda me lembro da primeira vez que o vi.
Eu estava na diretoria, mesmo sendo apenas o segundo dia de aula, por ter assumido a culpa no lugar do Liam e ter dito em seu lugar que briguei com alguns caras que nem mesmo sabia o nome. Ele entrou lá, tentou se explicar da melhor maneira o possível que havia se atrasado porque o carro de seu pai quebrou e não passava ônibus algum a essa hora e sequer me notou sentado próximo a ele, rolando uma bola de basquete nas mãos enquanto o observava com curiosidade.
Lembro que sorri quando o garoto levou uma bronca e respondeu de maneira irritada antes de sair da sala sem querer saber mais de nada, indo embora.
Mas eu também me lembro que meu mundo caiu quando meu melhor amigo veio me destruir com a verdade.
"Desista, ele é só mais uma dessas pessoas viciadas que vive em festas. Provavelmente irá morrer de overdose a qualquer segundo." Liam uma vez me disse, na segunda semana depois da que eu havia o visto e não parava de o observar.
"Não, não é" Era tudo o que eu dizia, porém ele estava certo, principalmente sobre a morte. Se eu houvesse o escutado, teria poupado essa dor.
Porém eu também não estava totalmente errado.
Lembro que, depois disso, eu comecei a fazer como as outras pessoas, dizendo coisas horríveis sobre um garoto que mal sabia quem eu era quando sabia que ele estava ao meu lado, para quando o menino virar-me as costas, eu desmentir tudo o que disse e pedir a Deus para eu parar de ser tão covarde e admitir logo que eu estava começando a interessar pelo garoto que meus amigos mais desprezavam.
Eu pedia a Deus para ter um amor clichê, quando sabia que estávamos longe disso.
Você sabe o que é ter que fingir estar bem com alguém, quando você sabe que quem você precisa não é essa pessoa?
Você sabe o quanto dói ser um idiota e não conseguir enfrentar seus medos?
Se eu os tivesse enfrentado, não precisaria me lamentar tanto assim. Pois hoje posso lhe dizer que não há nada pior do que sentir quem você mais ama escorrer por entre seus dedos, como uma pequena bomba em forma de um relógio de areia.
E aqui, dez anos depois dele, escrevendo um artigo para meu trabalho nessa cidade onde vi tudo morrer e renascer como uma fênix, eu sinto que falta um pedaço, um pedaço que não é mais meu, que se foi com ele.
E mesmo depois de tanto tempo, toda noite antes de dormir visualizo seus olhos, e assim eu sei que nunca estarei sozinho. Pois a história poderia ser ao contrário, poderia ser eu no lugar dele, e eu sei que o menino daria o melhor de si para viver tudo o que eu não iria ter a oportunidade. E foi com esse pensamento que eu decidi que seguir em frente não significava precisar esquecê-lo, pois agora eu não vivo só por mim, vivo por ele.
Pois mesmo habitando numa dimensão totalmente diferente e separada um do outro, ainda somos um só."
- Harry Styles, New York Times. 06/01/2024
VOCÊ ESTÁ LENDO
On Drugs (L.S.) #Wattys2016
NonfiksiQuando uma história é inspirada em fatos reais, ela se torna tão confusa quanto nossos pensamentos, e faz questão de entrar em nossa cabeça, para depois se despedaçar juntamente com nosso coração. E, mesmo quando faltar palavras entre eles, você a...