Capítulo 19

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  Alexander começou a perder a esperança. À distância, do outro ladodo rio, o limite natural do front, ele podia ver os alemães concentrandosuas tropas e tanques e batalhões de soldados bem armados, agressivos,impecavelmente treinados, que não se deteriam diante de nada, muitomenos diante de centenas de voluntários municiados com pás.Até onde alcançavam os seus olhos, havia somente dois tanquessoviéticos. Do outro lado do rio havia pelo menos trinta Panzers. Aunidade de vinte homens de Alexander estava reduzida a doze, e agoracampos minados se estendiam entre ele e Leningrado. Três de seushomens morreram quando uma mina que plantavam explodiu. Não tinhamexperiência com minas, só com rifles, mas todos seus rifles haviam sidotomados pelo Exército, menos o de Alexander e seus dois sargentos.Desviando os olhos do rio, ele não sabia para onde olhar.Tarde da noite, o novo Coronel chamou Alexander à sua sala decomando. Alexander não gostava dele como gostava de Pyadyshev.– Tenente, quantos homens o senhor ainda tem sob o seucomando?– Só doze, senhor.– Bastante.– Bastante para quê?– Os alemães acabam de bombardear a estação de trem de Luga –disse o Coronel. – Agora os trens de Leningrado carregando mais homense munição não podem chegar ao front. Precisamos que você e seushomens removam os escombros espalhados nos trilhos da ferrovia, paraque os engenheiros possam repará-la e nós possamos reiniciar serviçoamanhã cedo.– Está escurecendo, senhor. 

– Eu sei, Tenente. Eu gostaria de lhe dar luz de dia, mas não posso.As noites brancas ficaram para trás, e isso tem que ser feitoimediatamente.Quando Alexander estava saindo, o Coronel acrescentou:– Oh, me informaram que havia voluntários escondidos na estaçãoquando as bombas destruíram tudo. Você pode querer removê-los.Na Estação de Luga, Alexander e seus homens usaram lâmpadas dequerosene para avaliar os estragos. O antigo prédio de tijolos estava empedaços no terreno, e os trilhos da ferrovia arrebentados ao longo decinquenta metros.Alexander gritou:– Tem alguém aí embaixo? Fale!Ninguém respondeu.Chegando mais perto dos destroços, repetiu:– Tem alguém aí?Ele achou ter ouvido um gemido.– Estão todos mortos, Tenente – disse Kashnikov. – Olhe só isso.– Sim, mas ouça. Tem alguém aí? – Ele mesmo começou a mover osgrandes pedaços de pedra. – Me ajude, por favor?– Devemos primeiro cuidar dos trilhos – Kashnikov sugeriu. – Assim osengenheiros podem restaurar a eletricidade na ferrovia.Alexander endireitou-se e, com um olhar frio em direção ao sargento,disse:– Trilhos de ferrovia antes de pessoas, Sargento?– São ordens do Coronel, Tenente – Kashnikov balbuciou.– Não, sargento! São minhas ordens. Agora, mexa-se. – Alexanderafastou os pedregulhos e pedaços de janela e molduras de porta. Haviapouca luz, era difícil enxergar. Poeira e escombros enchiam suas mãos, eele se cortou num vidro quebrado sem sentir nada. Só percebeu quandoo sangue gotejou de uma mão para a outra.Alexander com toda a certeza ouviu alguma coisa além dos grilos.– Você ouviu isso? – ele disse.Era um suave gemido. 

– Não, senhor – disse Kashnikov, olhando-o com preocupação.– Kashnikov, suas mãos caíram? Mais rápido, estou lhe dizendo.Eles trabalharam mais rápido. Finalmente, debaixo dos tijolos e dasvigas queimadas, encontraram um corpo. Depois dois. Depois três. Depoisuma pilha de corpos, um em cima do outro, numa pirâmide sob osescombros. Alexander achou os corpos muito alinhados. Uma forçaaleatória não podia tê-los empilhado assim. Haviam sido colocados dessaforma. Não poderiam ter-se empilhado sozinhos. Ele fez força para ouvir.De novo aquele gemido. Removeu um homem morto, outra mulhermorta, enfiando, ansioso, a lâmpada de querosene em seus rostos. Outrogemido.No fundo, debaixo do terceiro corpo, Alexander encontrou Tatiana.Ela estava de costas para ele, e na cabeça tinha um capacete militar.Ele não a reconheceu nem pelas roupas nem pelo capacete, mas mesmoantes de remover o capacete, sabia que era ela por causa do formato doseu corpo pequeno e macio, que ele observara atentamente durantevários dias.– Tatia – ele disse numa voz incrédula. Alexander livrou-se do restodos corpos, removeu a última das vigas e tirou o cabelo do rosto deTatiana. Ela estava apenas inconsciente e, sob a fraca luz das lâmpadas,mal parecia viva, mas dela eram os suaves gemidos, que continuavam acada poucos segundos.Suas roupas, seu cabelo, seus sapatos, seu rosto estavam cobertosde poeira e sangue.– Tania, vamos – ele disse, esfregando suas bochechas, ajoelhado-seao lado dela. – Vamos.Seu rosto estava quente. Era um bom sinal.– Esta é a Tania? – perguntou Kashnikov.Alexander não respondeu. Ele pensava como levantá-la direito. Nãopodia saber, coberta de sangue como estava, onde tinha ferimentos.– Acho que ela está morrendo – disse Kashnikov.– Oh! Você agora é um porra de um médico? – Alexander fulminou. –Ela não está morrendo, agora pare de falar. Fique aqui com os homens elimpe a área, eles precisam de sua ajuda. Entrego-lhe o comando,Sargento. 

O Cavaleiro de Bronze Livro IOnde histórias criam vida. Descubra agora