Bônus (3) - por Pietro

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— Hey. - Lia diz quando se senta ao meu lado na sala da coordenadora.

— Como vai, Lia? - Pergunto, parecendo um idiota, porque realmente não tenho ideia do que falar.

Eu queria que as coisas entre nós não estivessem assim tão estranhas, que pudéssemos agir normalmente um com o outro...

— Bem e você? 

— Também.

E então ficamos em silêncio porque realmente não há o que ser dito.

A verdade é que eu estou fugindo da Lia. Eu sei, isso é ridículo e infantil, mas, além de o clima estar péssimo entre nós, desde que eu a vi dando um selinho em um garoto, eu... Sei lá, me sinto estranho. E não é que eu esteja achando que sou o único que pode ter outra pessoa hoje em dia, a Lia pode fazer o que ela bem entender, aliás, mesmo quando estávamos juntos, ela sempre pôde fazer o que quisesse, afinal, esse é o ponto dos relacionamentos, as partes continuam tendo sua liberdade. O fato é que ver a Lia com outra pessoa não está relacionado a ela ter esse direito (é claro que ela tem), está relacionado a mim. É sobre como eu me sinto vendo que a Lia seguiu em frente, porque isso me faz questionar se eu realmente segui e, se não segui, o que é que estou fazendo com outra pessoa?!

— Animada para começar as aulas? - Quebro o silêncio, afastando os pensamentos conflitantes.

  — É... Na verdade, eu nem tava pensando nisso. Mas agora que você falou, até que sim, um pouco, eu acho. - Ela diz, como quem não esperava por uma pergunta da minha parte. — Pietro. - Diz e espera um tempo até que a encare. — Por que você não vai mais fazer faculdade no Rio? 

E aí está a pergunta da qual eu tenho tentado fugir desde que decidi deixar o meu sonho de ir para o Rio de Janeiro. 

— É complicado, Lia. 

É claro que é complicado, meu avô morreu. Meu avô, o cara que sempre esteve presente na minha vida, o cara que foi mais próximo de mim que o meu próprio pai. Não é que eu ainda esteja mal com isso, tem momentos na vida em que percebemos que seguir em frente é única opção, como quando a Lia passou a me ignorar e, em seguida, quando meu avô morreu. A gente supera as coisas ruins que acontecem, mas elas são como feridas, mesmo curadas, ainda deixam a cicatriz, que não te deixa esquecer que um dia as feridas estiveram lá.

— Meu avô morreu há um tempo, enquanto eu ainda estava na Nova Zelândia e eu não pude me despedir. - Despejo a verdade em Lia e, pela sua expressão, ela ainda não sabia do ocorrido.

— Pietro, eu... Eu não fiquei sabendo. - Ela fala e uma dúvida passa pela minha cabeça, eu nem hesito ao perguntar:

— Se você tivesse ficado sabendo... Teria ido falar comigo?

— Eu não sei, honestamente. - Ela diz, mordendo os lábios, ato que me faz instintivamente encará-los.— Então, você não quer ir para longe porque...

— Minha mãe não tá muito bem, depois que meu avô morreu as coisas se complicaram. Ela tá com depressão. Morando em BH, eu posso vir todos os fins de semana, já no Rio, não sei, uma vez por mês? - Respondo.

Minha mãe sempre foi muito forte, ela enfrentou muitas coisas na vida para chegar aonde chegou, mas, de uns tempos pra cá, perdeu aquela energia que costumava ter, ela não é mais aquela mulher que vivia espalhando alegria pela casa. Quando eu voltei da Nova Zelândia, meu avô já havia morrido e minha mãe já não era a mesma, mas ela piorou desde então e não há nada mais doloroso que ver alguém você ama perder a sua vitalidade, sendo assim, eu não hesitei em mudar os planos e ficar aqui no estado mesmo, eu já perdi o meu avô, não preciso perder minha mãe também; e sei que ela precisa de mim e da Rebeca por perto. 

As Duas VersõesOnde histórias criam vida. Descubra agora