Dezenove♥

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Pisquei os olhos algumas vezes e não senti o chão em meus pés. Eu sabia nem qual reação tomar logo naquele momento. Tudo estava tão confuso que não fui eu quem perguntei:
- Que porra é essa?
Era Harry. Sua voz estava baixa, muito baixa. O Olhar de minha mãe estava assustado e papai tentava manter a calma.
- Filho... Precisamos explicar.
- Agora? Vocês precisam explicar SÓ agora?
- Harry, você tem que ouvir o seu pai!
- OUVIR O QUÊ? – Ele se levantou descontrolado. – VAI, FALA!
- Você tem que se acalmar. – Papai falou com uma calma absurda que, por um momento, me deixou revoltada.
- ACALMAR? VOCÊS TÊM... – Ele não conseguia nem falar com a raiva que ele estava. –VOCÊS TÊM A IDEIA DO QUE VOCÊS ESTÃO DIZENDO?
- Harry! Cala a boca! – Pedi sem paciência. – Vamos ouvir o que eles têm a dizer.
Harry ficou em silêncio.
- Quando nos casamos... – mamãe começou a falar. – tentamos ter um filho. Tentamos durante anos e anos. Mas daí nunca veio nada. Nem a esperança. Então eu... – Ela tentava não chorar – procurei um médico e ele disse que eu estava bem.
- Então eu também procurei um médico. – Papai começou a falar. Seu olhar fitava o nosso. Senti meu estômago revirar. – E ele disse que não era possível para nós, pois eu... Eu tinha poucas chances.
- Foi aí que pensamos em... Em adotar. E decidimos que faríamos isso em segredo. O bebê da nossa empregada estava prestes a nascer e... E ela não tinha como cuidar do menininho e...
- POR QUE NÃO ME DISSERAM????? – Harry chorava. – A VIDA INTEIRA EU ME SENTI CULPADO POR NÃO TER DADO AMOR A VOCÊS, POR NÃO TER ESTADO PRESENTE NA VIDA DE VOCÊS!
- VOCÊ ACHA QUE FOI FÁCIL PRA NÓS, SIMON? – Meu pai gritou e depois tentou se acalmar. – Nós te demos tudo, todo amor, compreensão. Só tínhamos medo de você... Agir dessa forma.
- EU TINHA O DIREITO.
Senti que a qualquer momento eu poderia desmaiar. Não queria estar ali.
- Você tem todo o direito do mundo. – Mamãe falou firme, mas havia mágoa em sua voz. – De procurar a mãe que te deu sem nem reclamar!
- Eu tinha o direito mesmo assim! – Ele falou e depois sumiu da sala. Saiu da casa e ficamos só eu e os dois na sala.
- Filha, eu... – minha mãe ia começar a falar, mas um silêncio permaneceu por alguns minutos. Então finalmente tive coragem de perguntar em uma voz que eu mesma mal ouvi.
- E eu? Sou filha de outra empregada?
- Quando Harry chegou, ele alegrou a casa. Todos os dias ele chegava com uma coisa nova e então... Eu engravidei. – Mamãe resolveu ir ao ponto. Ela estava com a cabeça baixa, certamente inconformada com a forma que Harry reagiu.
Balancei a cabeça afirmativamente algumas vezes e me vi na obrigação de sair dali. Não conseguia sequer olhar nos olhos dos meus pais. Eu sabia que aquele segredo devia ter sido revelado bem antes. E eu sinceramente não entendia porque só naquele momento eles haviam revelado. Eu nem sequer entendia muito sobre tudo, mas o fato do meu irmão ser adotado não teria um impacto tão grande em nós se não fosse pelo nosso passado feio e sem pé e nem cabeça. Eu realmente queria que tudo aquilo fosse um sonho, ou um pesadelo. Durante os cinco anos de faculdade que estive fora de casa, pude perceber que eu e Harry fizemos tudo errado, e continuava sendo errado, pois na época nem sabíamos que não éramos irmãos, então fizemos conscientes.
Então saí de casa, deprimida, sem pensar no que poderia acontecer daqui pra frente, então vi Harry sentado na calçada, sentado com a cabeça baixa.
Caminhei até lá e sentei ao seu lado. Ficamos em silêncio por muitos minutos. Peguei o maço de cigarros e acendi um. Traguei e ofereci a ele que aceitou.
- Essa merda mata, mas ultimamente eu tenho fumado pra aguentar a pressão das coisas. – Falei olhando para o cigarro.
- De que adianta sabermos? Isso torna o cigarro mais atraente. – Ele falou indiferente.
- Não vou perguntar como você está, pois a resposta é óbvia. Mas o que você pretende?
- Eu não sei... – Ele falou e percebi que sua voz falhou. – É como se nada do que eu tivesse vivido fosse verdade.
- Não é bem assim. Você não os ouviu.
- Lexi, não é assim tão fácil. Tudo. Todo o peso na consciência que eu tive quando... Você sabe. – Ele então ficou chutando qualquer coisa no chão.
- Harry, dê um crédito a eles. Eles não sabem de nada. E, mesmo assim, ainda me sinto mal por isso.
- E você? É filha de quem?
- Deles... – Falei e ele balançou a cabeça. – Isso não faz diferença. Também me sinto traída.
- Por que será que eles contaram só agora?
- Não sei... – ri um pouco e ele continuou sério. – Anda, você tem que conversar com eles. Entender toda essa história,
- Eu não quero conversar, eu realmente não quero conversar com eles. Eu quero...
- Ir pra casa?
- Também não. – Ele então suspirou. – Eu não ia aguentar ter que responder mil perguntas de Monick.
- Como ela está? – Ele me olhou um pouco sem entender. –Ah, eu voltei agora e... Bem, eu não sinto raiva dela mais. Tudo bem que se ela vir com aqueles abusos eu...
- Ela está bem. – Ele falou rindo um pouco, mas parou logo em seguida. – Eu vou dirigir, andar por aí. Eu não sei.
- Posso ir com você?
Ele me olhou de novo e voltou a olhar para frente.
- Eu não sei, Lexi... Eu acho que quero ficar sozinho um pouco. Eu preciso.
- Tudo bem... – Mexi em minhas mãos. – Então eu vou indo. Preciso colocar minha cabeça no lugar.
Saí de lá deixando-o sozinho. Um nó na garganta me deixava com uma angustia fora do normal. Acendi outro cigarro e andei pela rua, a caminho da casa do meu amigo.

~

- Lexi! Minha linda, o que aconteceu? – Ryan que abriu a porta e sorriu ao me vê, quando viu minha situação ficou assustado.
- Posso entrar?
- Claro, claro.
Entrei em sua casa. Vi que estava tudo embalado nas caixas. Ele e Karen logo se mudariam e aquela casa agora estava a venda.
- Então, aceita alguma casa?
- Você tem algo alcóolico?
- Não, eu lamento. Mas tenho suco de laranja, serve?
- Serve qualquer coisa que me faça engolir o nó na garganta.
Ele foi a cozinha e voltou com um copo cheio de um líquido amarelo.
- Então, o que aconteceu? – Ele sentou bem a minha frente e percebi que senti falta daquele olhar, daquele amigo e ombro. Então desabei a chorar. – Ah, meu Deus... Parece ser sério.
Eu meio que vomitei as palavras, simplesmente vomitei todas para que ele entendesse o meu desespero. Ao terminar, ele então me deu um abraço apertado e nada disse, só deixou que eu chorasse.
Fiquei assim um bom tempo até que me controlei e, finalmente, Ryan falou:
- Eu não sabia que mesmo depois de todos esses anos, a história sua com o Harry ainda estava tão acesa.
- Não está. Eu só não entendo porque meus pais fizeram questão de esconder.
- Lexi, tem algo aí. Sua mãe e seu pai são pessoas maravilhosas. Se eles escondessem isso como um segredo de família tão forte, o fato deles contarem a vocês tem um motivo forte, certamente.
- E que motivo seria esse?
- Eu não sei... – Ele pensou um pouco e depois me olhou nos olhos. – Você está acabada.
Eu rir um pouco. Realmente estava. Eu havia passado a tarde inteira fazendo o exame da ordem, estava cansada. Havia até esquecido o quanto estava com fome quando cheguei em casa. E tudo isso era uma maratona. Já eram por volta de meia noite.
Ryan insistiu para que eu dormisse em sua casa, mas não queria. Queria minha cama, meu cobertor, queria chorar sem ninguém pra me consolar naquele momento. Então ele me deixou em casa e eu estava tão cansada que dormir quase que imediatamente. Tive sonhos estranhos com Harry, meus pais, Joah e Monick. Também sonhei que não havia sido aprovada no exame da Ordem, isso me deixava transtornada. Mas algo me fez despertar repentinamente:
O celular começou a tocar no meio da noite. Passei minha mão pela cômoda e o peguei atendendo sem nem mesmo olhar para a tela.
- Alô... Lexi?
- Oi, quem é?
- Lexi, é o Harry. Desculpa te acordar. Eu sei que está no meio da noite... É que eu queria conversar com você.
- Harry, tudo bem. – Sentei na cama e liguei o abajur. – Você está onde?
- Aqui em frente mesmo, estou dentro do carro. Será que pode descer aqui?
- Eu estou descendo...
Levantei, acendi a luz e coloquei um roupão quentinho. Desci as escadas e saí de casa. Harry estava encostado no carro.
- Oi... – Ele falou um pouco sem graça – Desculpa.
- Tudo bem...
- É que... Eu não sei. Parece que as coisas estão clareando agora.
- Nada muda, Harry. Você é meu irmão. Entenda que isso não pode influenciar tanto.
-Você sabe que isso influencia, querendo ou não.
- Não, não pode e não deve. Você tem sua família, tem sua vida. E eu tenho minhas preocupações.
- Lexi, eu não vou largar minha família por você. – Ele falou de uma forma dura que me fez estremecer. – E eu espero que você entenda isso.
- E o que eu estou dizendo?
- Eu quis ser bem claro.
- Eu percebi. Mas além de claro, você foi incrivelmente grosso. Não estou atrás de você, se é o que está pensando. Estou tentando te ajudar. – Comecei a me sentir mal e irritada, mas sabia me controlar. Porém acho que a chateação não passou despercebida por Harry que mudou o semblante.
- Lexi... Me desculpe, eu...
- Não, Harry. Toda vez é a mesma coisa, a mesma história, as mesmas desculpas. Quando você vai perceber que... – Parei a frase no meio e olhei pra ele. Senti que as lágrimas iam descer. – Quando vamos apagar esse passado? Quando você vai perceber que EU também quero apagar isso?
- Lexi...
- Não. Não quero que fale nada. Desculpa, ok?
Virei as costas para ele e então caminhei em direção a minha casa, chorando. E prometi a mim mesma que seria a última vez que choraria por causa daquela estória feia, ruim, vergonhosa. Harry parecia não ter mudado.

~

- Eu quero ouvir tudo. – Eu havia aparecido para o café da manhã enquanto meus pais tomavam em silêncio.
- Tudo o quê? – Papai perguntou limpando a boca com um guardanapo.
- Por que vocês esconderam isso, por que foram contar agora, por que fizeram tudo isso?
Eles hesitaram um pouco, mas mamãe falou:
- Eu estou com câncer. Descobri há uma semana. O estado é crítico.
Perdi o chão em meus pés. Não sabia o que dizer. Toda a mágoa parecia que tinha sumido.
- O tratamento é muito caro e pode custar nossa casa, carro e empresa. – Papai falou, vi sua feição de preocupação. – E o tratamento é na Alemanha.
- Eu não... Eu não imaginava. – Falei então caminhando até minha mãe e lhe dando um abraço apertado. Senti como se nada fizesse mais sentido. Nem casamento da Karen, nem vida, nem Harry, nem adoção...
- Ah, mamãe... Eu não vivo sem você, vamos fazer o possível!
- Não temos onde ficar em outro país. – Ela falou enquanto ainda me abraçava.
- Ah mãe, daremos um jeito. – Falei, mas em minha mente eu já tinha pensado em uma solução.

Continua...
Já já posto capítulo novo!
VOTEM GATAS!

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