Gritei de susto e dei vários passos para trás indo cair estrondosamente numa pilha de gabinetes quebrados, meu coração batendo tão forte que doía. Apontei a lanterna, trêmula, para todos os cantos até me ver iluminando uma pessoa, um homem.
Um professor. Demorei algum tempo para perceber que aquele homem esfarrapado e que tremia no chão era um dos meus professores. Na verdade não me dava mais aulas, havia dado um ou dois períodos atrás.
- Professor... ?
O homem de meia idade, já meio calvo, tremia no chão, em posição fetal, os braços cobrindo o rosto. Assim como os computadores, ele parecia estar ali há muito tempo, considerando a barba por fazer e as roupas já ficando esfarrapadas.
Ele gemeu e olhou para mim, mas não creio que me enxergasse por causa da luz da lanterna, parecia confuso. Cheguei mais perto e me abaixei.
- Professor... você está bem?
- Você a viu...? – disse ele, numa voz chorosa e trêmula que eu nunca tinha ouvido nele.
- Quem?
- Ela está... Está... É minha culpa...
- Professor... O que aconteceu aqui?
- Eu não tive a intenção... Ela... Ninguém... Eu não... Quem... Quem é você?
- Eu... Não lembra de mim? Eu fui sua aluna em...
Subitamente, sem nenhum tipo de aviso direto ou indireto, o professor se jogou no chão, parecendo ainda mais assustado e agarrou meus tornozelos chorando e soluçando.
- Desculpe...desculpe...desculpe... !!!
- O que..!?!? Me solte...!
- Não vá...!!!
- Eu não estou indo a parte alguma! Professor!!!
- Desculpe, me desculpe, não vá... desculpe...!!!
Com muita dificuldade me livrei do professor que soluçava no chão e não parava de murmurar suas mais sinceras desculpas. Verdade seja dita, aquele professor não era dos meus favoritos. Sarcástico e intimidador, vez ou outra conseguira, com uma frase bem colocada, me fazer sentir pior do que o normal. Mesmo assim...
- Professor... Eu não sei o que está acontecendo, mas devemos sair daqui. Tem algo muito... Muito estranho lá fora... Você sabe o código da tranca não sabe? Sabe?
Ele parou de chorar repentinamente, sentou-se no chão esparramado como uma criança, o rosto molhado pelas lágrimas mostrava medo e ele torcia as mãos compulsivamente.
- Não sei... mas sei onde está...
Onde? Podemos ir buscar agora, acho que o senhor precisa de um médico...
- NÃO!!! Eles estão todos lá, naquela sala, todos eles, todos lá... me desculpem desculpem desculpem...
A partir desse ponto não mais consegui fazer ele parar. Continuava chorando e se desculpando para pessoas que certamente não estavam nem ali. Parecia louco. Percebi que ele tinha um chaveiro pendurado no cinto que continha, além de uma chave de carro quebrada ao meio, uma chave pequena e avermelhada. Com cuidado, peguei o chaveiro. Não parecia que o professor precisaria dele tão cedo.
Sai do laboratório e, procurando ignorar os lamentos da criatura no banheiro, forcei a mente percorrendo o que o professor dissera. Ele mencionara uma sala, qual era? Creio que o número não fora mencionado, mas, afinal, era um prédio pequeno e o segundo andar estava bloqueado... Resolvi que era melhor vasculhar as salas do primeiro andar, isso certamente era melhor que dormir ouvindo os soluços e desculpas do professor.
A primeira sala que tentei foi a minha própria, de onde eu havia saído para começar, e que era de número 102. Não parecia haver muita coisa lá, escombros de carteiras não permitiam que eu vagasse muito. Quando já ia desistir e tentar outra sala um fato me chamou a atenção.
Uma das carteiras, bem no meio da sala, estava de pé e parecia quase nova. As outras carteiras, caídas ou não, pareciam ter aberto espaço para que esta se destacasse. Me aproximei e percebi que haviam inscrições no tampo da mesa, marcadas na madeira por algum objeto pontiagudo e liam:
"Flores negras do tédio e flores vagas
De amores vãos, tantálicos, doentios...
Fundas vermelhidões de velhas chagas
Em sangue abertas, escorrendo em rios"Um pedaço de um poema, e um conhecido .Um dos meus favoritos, pensando bem, escrito por Cruz e Souza e na minha opinião um de seus melhores trabalhos. Mas, não era isso que eu estava procurando.
Saí da sala e tentei abrir sua vizinha, sala 101. No entanto, por mais que eu forçasse, a porta não se movia, parecia bloqueada por algo enorme pelo outro lado. Por fim, ofegante, desisti. Seria muito azar se o código estivesse ali.
Passei a lanterna displicentemente pelas paredes, tentando decidir aonde ir e parei o olhar na porta da sala 103. Aquela sala estava sempre, sempre fechada. Já estava naquela universidade a uns dois anos e nunca soube o que tinha ali afinal, resolvi tentar a sorte.
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Subconsciente: A origem do medo
HorrorA narradora possui uma rotina estressante fazendo-a desejar sumir, até que um acontecimento muda sua vida e faz com que a moça tenha o desejo profundo de voltar ao mundo real.