Kenner e Wilh entraram no templo, desesperados. O interior do lugar estava todo esfumaçado, e eles notaram com um arrepio que podia se ouvir os gritos de uma mulher.
- Err... Quer saber, podemos arranjar um outro lugar... - Disse Wilh.
- Não. - Falou Kenner, decidido. - Se sairmos eles nos matarão. E aqui é um bom lugar, vai deixá-los com medo de entrar.
A mulher gritou de novo, e agora até Kenner perdeu um pouco da confiança, mas ele continuou avançando. Eles não podiam ver muito ao redor por causa da fumaça, mas logo o grito da mulher ficava cada vez mais próximo. Eram gritos de dor pura, a mulher parecia desesperada. Suor escorreu pelo rosto de Kenner, em parte por causa do calor de lá dentro, que lembrava uma sauna, e em parte por causa do nervosismo.
Então, eles caminhavam tensos, o som parecia cada vez mais perto e... o delicado som do choro de um bebê. O respirar aliviado da mulher. Então devia ser apenas um parto, provavelmente. Isso só podia significar que aquele era um templo dedicado a Linvar, a deusa do parto. Isso se confirmou quando de repente uma figura apareceu na frente deles, em meio à fumaça:
- O que fazem no templo da sagrada Linvar, a deusa do parto?
Wilh deu um pulo para trás, e Kenner se assustou. A figura era uma mulher, com um turbante preto na cabeça escondendo todo o rosto (NOTA: COMO O QUE AS MUÇULMANAS USAM), e usando a comprida saia cinza que as sacerdotisas costumavam utilizar.
- Estão procurando ajuda para parir? - Perguntou ela ironicamente a Kenner.
- Não, minha senhora...
- Então saiam! - Exclamou elas. - Homens não são bem vindos aqui, exceto para acompanhar as suas mulheres.
- Senhora, por favor, precisamos de sua ajuda, há guardas atrás de nós! - Insistiu Wilh.
- Calado, peixe! - Ordenou ela percebendo suas guelras. - Também não abrigamos traidores ou bandidos aqui.
Kenner suspirou, decidindo que a sacerdotisa não falaria nada disso a ninguém e que merecia a verdade, ou pelo menos uma fração da verdade
- Senhora, por favor, meu nome é Kenner, meu pai foi morto injustamente e meu outro companheiro acabou de ser morto, agora estamos desesperados e precisamos de um abrigo ou morreremos
A sacerdotisa, então, arregalou os olhos.
- Kenner...
Então olhou para o garoto, que não entendia nada.
- Tire esse capuz.
Kenner achou estranho o pedido, mas obedeceu. A sacerdotisa teve um vislumbre dos olhos vermelhos do garoto, e sua expressão era indecifrável.
- Kenner... - Repetiu de novo. - Kenner, Kenner. Você não está, por acaso, se aventurando com o trono de Tahrl, está, Kenner?
- O que? - Perguntou ele, sem saber como ela sabia dessas coisas. - Não, eu só peço que nos dê roupas como disfarce e nos abrigue por um tempo, senhora.
- Se é o que diz. - Falou ela, e não fez mais perguntas. - Me sigam.
Kenner e Wilh seguiram ela, e ela levou cada um a um quarto diferente, e falou que eles poderiam ficar lá por um tempo, além de ceder roupas a eles. Depois ela foi embora, misteriosa, sem responder ou fazer mais perguntas. Durante as primeiras horas em que Kenner ficou em seu quarto ele finalmente se deu conta, realmente, da morte de seu amigo, seu companheiro, seu "tio", Ranval, pois na agitação da fuga ele nem havia parado para refletir, e Kenner chorou por um bom tempo, como uma criança, extravasando todos os últimos dias tensos que ele não tinha coragem de extravasar na presença de outras pessoas.
Eles passaram quatro dias naquela sauna fumacenta, escutando os gritos das mulheres que iam até lá ter seus filhos ou os pedidos das mulheres que imploravam para terem filhos belos e com uma longa vida às sacerdotisas, e Kenner e Wilh só tinham permissão de ficar dentro dos quartos, mas pelo menos podiam visitar o quarto um do outro, e Kenner não ousou reclamar, pois já era muito a sacerdotisa estar escondendo eles. Eles perguntaram à sacerdotisa qual era o seu nome, e descobriram que ela era chamada simplesmente de Grande Ama, pois ela era a líder de todas as outras sacerdotisas de Linvar.
No segundo dia em que estavam escondidos um guarda, ao lado de um homem de Darlon, bateu à porta do templo e perguntou por nós, mas a Grande Ama mentiu dizendo que não estávamos lá, e, após um grito de uma mulher vindo do templo, os homens preferiram não entrar e acreditaram nela. Kenner percebeu que os homens já estavam desanimados em achá-los, quase como se aquilo fosse uma rotina desnecessária, e decidiu que já poderia partir no próximo dia. Porém a Grande Ama anunciou:
- Eu viajarei para Kharnel, a capital de Tahrl, daqui a dois dias. Seria bom ter dois bravos guerreiros me escoltando, e isso não é um pedido.
- Mas é claro, senhora. - Falou Kenner, mesmo sabendo que ele e Wilh nem de longe eram "grandes" guerreiros, pois Kenner era um garoto de 14 anos simplesmente habilidoso com a espada e Wilh era um simples mensageiro, que agora era o serviçal de Kenner. Mas de qualquer jeito, era para Tahrl que Kenner queria ir, e aquela forma, acompanhando uma sacerdotisa, era perfeita para disfarçá-los e permiti-los chegar à Tahrl sem serem interceptados por Darlon.
- Eu sei que vocês não tem um tostão. - Disse ela. - Por isso vou oferecer 400 jars se me acompanharem.
Kenner arregalou os olhos. Era muito dinheiro, e garantiria a sobrevivência dele e de seu serviçal por um bom tempo
- É uma honra, minha senhora. - Disse ele.
E assim, no dia seguinte, Kenner e Wilh vestiram túnicas de sacerdotes e acompanharam a Grande Ama como guardas, com as cabeças e pescoços cobertos por capuzes.
E Kenner tinha muitas perguntas para a mulher no caminho que ela não quisera responder no templo. Por que de fato ela os havia abrigado? Por que estava sendo tão generosa? Mas o principal: ela parecia ter reconhecido o nome de Kenner, e por isso o havia abrigado, para início de conversa. Mas Kenner não era famoso em Lothien, não até onde sabia. De onde aquela mulher o conhecia? E será que ela podia ser uma aliada útil para conquistar o trono de Tahrl?
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O Mercenário
Macera" - Jure, meu filho... Jure, que você se tornará o rei de Tarhl. " Kenner é um jovem mercenário que vive nas Ilhas de Lothien, um lugar selvagem onde várias raças disputam pelo controle absoluto de todos os reinos. Em meio ao caos e à guerra, Kenner...