Há uns 5 anos, depois dos acontecimentos que desestabilizaram minha família, decidimos que seria bom nos mudarmos. Apesar de nem ter sido para tão longe assim. Mas poder começar do zero, se afastando de todo aquele caos gerado pela morte de um ente querido de uma forma tão repentina, parecia a melhor coisa a se fazer.
Eu poderia protestar, e muito, mas não fiz isso. Simplesmente deixei que meus pais resolvessem as coisas e pudéssemos seguir nossas vidas, mesmo achando aquilo impossível.
Nunca tive amigos de verdade, o máximo que consegui foram conversas superficiais com colegas de classe. Ninguém queria se aproximar da menina que tinha uma irmã estranha e problemática. Muito menos se tornar um amigo ou visitar minha casa, como as outras crianças faziam entre si.
Mas eu entendia. Não era minha culpa, de meus pais e muito menos de Alice. Era a forma como as pessoas viam nossa família que me machucava. Quis gritar com meus pais quando decidiram que seria melhor para o meu desenvolvimento parar de receber aula em casa com Alice e começar a estudar em uma escola. Eu era tímida demais para começar uma conversa com alguém. Quando uma pessoa tinha a atitude de falar comigo, até mesmo para pedir licença, eu só sabia sorrir. Patético, eu sei.
Por mais que não tivesse amigos, sentasse só para lanchar e voltasse sozinha para casa, eu era uma boa aluna. Não causava problemas na escola, obedecia os professores, fazia todas as atividades e tirava as melhores notas. Minha companhia se resumia à personagens de livros. Mergulhei profundamente nesse universo que conseguia criar a cada dia uma nova realidade. Eu poderia ser quem eu quisesse, viajar para os lugares mais desconhecidos e conhecer várias pessoas. Sempre achei isso fantástico.
Quando nos mudamos, trocar de escola, casa ou cidade não foi difícil. A única coisa com que eu não soube lidar foram meus sentimentos. Me fechei, se ainda era possível, cada vez mais para o mundo exterior. Minha mãe ficou triste. Meu pai tentou segurar as pontas. Alugou um espaço e montou uma pequena lojinha. Ele sempre foi bom com negócios. Logo a lojinha cresceu e ele comprou uma franquia de um Supermercado conhecido na cidade. Mamãe se envolveu ao poucos e começou a administrar com ele.
No fim do terceiro ano do ensino médio eu já sabia o que queria cursar. Não exitei em falar para os meus pais que queria cursar letras. Passei no ano seguinte na UECE, prestando vestibular na instituição. Mas não era para dar aulas! Quero trabalhar em editoras, lendo manuscritos, revisando e traduzindo textos. Não sei ao certo. Ainda estou no quarto semestre, muita coisa pode mudar.
Eu estava bastante feliz no primeiro dia de aula, a faculdade era perto de casa e meu pai se voluntariou a me deixar lá. Mas, diferente do que tinha em mente, era enorme! Eu desci do carro e o pânico logo percorreu meu corpo. O local estava atumultuado de calouros e veteranos que andavam de um lado para o outro. Mesmo com o horário das minhas disciplinas e o número das salas, estava completamente perdida. Era introvertida demais para perguntar a alguém, para receber ajuda. Cogitei, inúmeras vezes, dar meio volta e ir pra casa.
Minhas mãos começaram a gelar e eu, simplesmente, não sabia o que fazer. Apenas sentei no primeiro banco que vi, coloquei a mochila em meu colo e suspirei bem fundo. Fechei os olhos por um instante, mas logo percorri todo o térreo com eles. Lançando uma expressão desesperadora em direção a todos os lugares. Quando finalmente alguém tocou em meu ombro direito, pedindo minha atenção.
Mal eu sabia que estava prestes a conhecer a pessoa mais incrível do mundo.
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O que me resta?
Mystery / ThrillerApesar dos avisos, resolvi ir atrás. Estou tão perdida quanto da última vez. Ainda não sei o quê, como ou por quê aconteceu... Quem poderia fazer uma coisa dessas? Simplesmente não posso ficar parada. Afinal, o que me resta?