Capítulo 2

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-É engraçado o que o autor faz nesse livro. Ele nos manipula a acreditar que a esposa realmente o traiu, mas na realidade, nós só temos seu ponto de vista. Nunca saberemos se Capitu foi infiel ou não, você não acha?

-Aham... Podemos falar de outra coisa?- Gabriel implora.

No dia seguinte os garotos estavam sentados no chão do quarto de Guilherme. Gabriel está largado, claramente entediado enquanto o outro está todo animado, especulando e falando do livro da aula dessa semana.

-Hã... Claro. Do que você quer falar?

Gabriel revirou os olhos dramaticamente, agradecendo o fim do monólogo literário.

-Tanto faz, contanto que não seja de livros. Lembra de quando falamos de ir ao cinema? Poderíamos ir hoje ver aquele filme que acabou de lançar. O que você acha?

Guilherme fica feliz por ele não ter se esquecido daquele convite. Apesar de não ter criado muitas expectativas, estava animado para a ocasião. Seca suas mãos suadas na blusa e respira fundo antes de dizer:

-Pode ser.

Demoram pouco tempo para se aprontar e caminham até o pequeno shopping no fim da rua do prédio de Guilherme. O cinema está lotado nessa sexta-feira. Todos os mais jovens da cidade vêm ao shopping passar o tempo. Alguns colegas de classe encaram Guilherme. Nenhum deles havia visto, sequer uma vez, o garoto ali antes.

Chegam ao cinema e compram os ingressos. A sala está lotada e a pedido do tímido garoto, sentam no fundo. Quando o filme começa, Guilherme olha para o lado e vê Gabriel sorrindo e fazendo comentários animados sobre o filme.

É bom ver que o amigo está se divertindo. Olha ao redor da sala e percebe que tem muito mais pessoas ali do que esperava. Ele começa a transpirar e sua respiração fica um pouco ofegante. Guilherme nunca se sentiu confortável no meio de tanta gente.

Na metade do filme, Gabriel olha para o lado e nota o outro claramente passando mal. Ele segura a mão do amigo e pergunta:

-Ei, qual é o problema?

Guilherme se sobressalta com o toque de Gabriel. Por que ele está segurando sua mão? Que sensação estranha, pensou. Por algum motivo, aquele toque lhe acalma um pouco mas a ansiedade persiste.

-Nada... É que... Não estou acostumado a ficar em lugares com tantas pessoas assim.

Gabriel parece compreensivo. Secretamente essa fobia social do amigo lhe parece um tanto exagerada.

-Calma. Não tem por que se preocupar. Respira fundo.

Após inspirar e expirar por alguns segundos, a batida de seu coração vai voltando ao ritmo normal. O ataque de pânico foi diminuindo até sumir quase que completamente.

É difícil viver se preocupando com o julgamento dos outros. Com a auto estima lá embaixo. Se sentindo sozinho e excluído. É amedrontador estar em um lugar cheio de pessoas. Ninguém consegue entender por que você se sente tão desconfortável. Mas não tem como evitar. Apenas quem passa por isso sabe.

As mãos não se separaram até o fim do filme. Um pequeno gesto de amparo e gentileza que significa muito para Guilherme. Apesar de estar menos agitado, um outro tipo de ansiedade continuou arranhando seu estômago até que a mão de Gabriel se soltou da sua.

O Garoto Ao LadoOnde histórias criam vida. Descubra agora